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domingo, 30 de janeiro de 2011

A penitência nos primórdios de São Damião

Tentando entender as penitências corporais de Clara
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

Continuamos seguindo a  biografia de Chiara Giovanna Cresmaschi  Chiara di Assisi. Un silenzio che grida.  Hoje queremos considerar o estilo de penitência de Clara e  dos primórdios  (p. 55-58). Ficamos sempre impressionados com as duras penitências que as Irmãs Pobres praticavam. Na realidade as manifestações concretas de dureza frente ao corpo e outras modalidades só se explicam pela vida da penitência que o frades e as irmãs abraçaram.  Eles forma os  penitentes da cidade de Assis.

1. As três irmãs (Clara, Catarina/Inês sua irmã de sangue e provavelmente Pacífica de Guelfuccio) bem como os frades que se retiravam para os eremitérios, marcavam o ritmo do dia e da noite com a celebração da liturgia da Igreja, o que certamente consistia no principal alimento de sua contemplação. Vigílias e jejuns  eram práticas comuns numa vida  de contínua conversão. Têm sua justificativa na palavra do Evangelho: “... esta raça de demônios só se expulsa com oração e jejum” (Mt 17,21).  A expressão deve ser entendida como atenta vigilância contra as tentações e oração de intercessão pelos irmãos, de modo especial por sua salvação.

2. Convém chamar atenção para uma modalidade de penitência comum nos penitentes medievais, mais presente na vida das mulheres. Trata-se da penitência corporal. A época é marcada por forte consciência do pecado. Por isso, as pessoas ingressavam na categoria dos penitentes como Francisco e seus irmãos e Clara e suas irmãs. Servem-se eles de todos os expedientes que possam levar à contínua conversão, incluindo os que atingem o corpo.

3. Recorre-se ao jejum e se partilha a comida com quem não tem; abstinência de carne e de outros pratos mais sofisticados; prolongam-se as vigílias de oração e se dorme na terra nua. Podemos  buscar a base da concepção de Francisco em sua Carta aos Fiéis: “Todos os que amam o Senhor de todo o coração, com toda alma e com todo o pensamento, com toda a força e amam ao seu próximo como a si mesmos e odeiam seus corpos com  seus vícios e pecados, recebem o corpo de nosso Senhor Jesus Cristo, e produzem dignos frutos de penitência.  Quão bem-aventurados e benditos são aqueles e aquelas ao fazerem  tais coisas e nelas perseverarem, porque pousará sobre eles o  espírito do Senhor e fará neles habitação e lugar de repouso e são filhos do Pai celestial cujas obras realizam e são esposos e irmãos e mães de nosso Senhor Jesus Cristo...” (Primeira recensão,  1-9).

4. A atitude de contínua conversão se concretiza numa resposta ao amor de Deus, no fato de nada se preferir a ele, amando os irmãos como a si mesmos, desejando o bem do outro, como aquilo que alguém deseja para si.  Por isso é urgente combater o egoísmo, que deseja percorrer diferentes, opostos às vias do Senhor, esse mundo dos vícios e pecados.  Quando Francisco emprega a palavra corpo está indicando à pessoa em sua totalidade, quando deixa de voltar-se para Deus e busca a si mesma.  A dimensão física não é exclusiva. Os que não se deixam guiar pelo Espírito  fazem caminho difícil.  A penitência física tem seu fundamento no deixar-se guiar pelo Espírito.  Não se trata de uma espécie de masoquismo.  O Espírito leva o homem a fazer dignos frutos de penitência.

5. Produzir fruto é o sentido de uma resposta ao apelo cristão, que não é feito de palavras ou de boas intenções, mas se realiza no cotidiano. Francisco chama de beati, felici e benedetti quelli e quelle, isto é, homens e mulheres que fazem, operam ativamente, fazem render o talento recebido, não no entusiasmo de um momento, mas para sempre. Tal felicidade e tal bênção é suposta de se realizar pela vida batismal, que é experiência trinitária: o Espírito, na realidade, habita e mora no íntimo; o ser filho do Pai se manifesta no fazer a sua vontade, realizando obras de caridade, o que faz com que as pessoas se tornem irmãos e mães de Jesus Cristo, como diz o Evangelho, mas também  esposos por esta comunhão de amor que faz da Igreja, e nela de todos os cristãos, a esposa de Cristo.

6. A partir de tais premissas  podemos vislumbrar certas atitudes penitencias de caráter muito diferente da mentalidade hodierna que precisam ser entendidas em seu contexto. É fácil dizer que tais práticas  deixam transparecer um certo desprezo pelo corpo e manifestam uma mentalidade dualista, na qual a dimensão corporal é vista em oposição à alma. Não se pode tão rapidamente provar tudo isso nesses dois grandes penitentes que foram  Francisco e Clara.  Se há uma acentuação desse aspecto na mulher, e toda  a história da espiritualidade o demonstra, em grande parte ela se deve ao relacionamento com o próprio corpo que assume modalidades mais intensas e concretas  na personalidade feminina.  Assim, na dinâmica da mística comunhão com Cristo, vivida em termos nupciais e estreitamente centrada no seu dom de amor sobre a cruz, a sede de Conformidade com Cristo abarca a pessoa inteira, que quer se entregar totalmente a ele. Tal é verdade de modo especial para Clara, que chegando a São Damião, começou a dedicar-se a uma prática penitencial excessiva.  Para ela se tratava de facetas do abraçar o Cristo pobre, no qual vê o seu tornar-se desprezível por nós.  Este abraçar o Cristo envolve a contemplação e as coisas do cotidiano.  Na juventude da filha dos Favarone  o abraçar se dá também na esfera física.

Extraído de http://www.franciscanos.org.br/v3/almir/artigos/clara/09.php acesso em 14 jan. 2011.
Ilustração: Saint Clare / Andrea Vanni. Caremont (CA, EE.UU.A.) : Pomona College Museum of Art, ca. 1360-1370. Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Clare_Andrea_Vanni.jpg acesso em 14 jan. 2011.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

SACRIFÍCIO VIVO DE AMOR













SACRIFÍCIO VIVO DE AMOR

A carne mais desejada...
é a carne que nos salva...
Com efeito, diz o Senhor:
“Quem come a minha carne e bebe o meu sangue...
permanece em mim e eu nele.” (Jo 6,56).

Antes, profanados pelo pecado...
Agora, redimidos por seu Sacrifício de Cruz...
Antes, perdidos para sempre...
Agora, iluminados e salvos...
por sua morte e ressurreição...
Sacrifício de redenção,
Pão de vida eterna...

Ó Santa Comunhão dos humildes...
Ó dádiva dos inocentes...
Onde Deus se faz presente...
Mistério infinito de amor...
Ó Corpo e Sangue do Senhor...
De quem somos tabernáculo...

Maná Puro, Santo e Divino...
Que vem do céu para nos alimentar...
Quem o comunga nunca anda sozinho...
Porque por Ele e com Ele segue a caminho...
Do Reino de Deus...

Quem o comunga...
Dignamente...
Legitimamente...
É isento do inferno...
e livre de todo mal...
Porque nele brilha ...
O brilho de sua Luz divinal...
que jamais se apagará...

Por isso...
Vem, Senhor Jesus, vem...
Vem nos iluminar...
Faz de nós o teu altar...
Sacrifício vivo de amor...
Onde contigo ó Senhor...
Oferecemos-nos ao Pai...
Agora e por toda a eternidade...
Amém!
...
“Eu sou o pão vivo que desceu do céu. Quem comer deste pão viverá eternamente. E o pão, que eu hei de dar, é a minha carne para a salvação do mundo”. (Jo 6,51).

“Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia.” (Jo 6,54).

“Este é o pão que desceu do céu. Não como o maná que vossos pais comeram e morreram. Quem come deste pão viverá eternamente.” (Jo 6,58).

“Eu vos exorto, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo, santo, agradável a Deus: é este o vosso culto espiritual. Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o que é perfeito.” (Rom 12,1-2).
...

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Clara de Assis e suas irmãs

Uma vida para Deus e para os homens, a serviço da Igreja

Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM

Mês após mês, temos tentado seguir uma biografia de Clara acompanhando o texto de Chiara Giovanna Cremaschi,  sob o título de Chiara di Assisi, Un silenzio che grida.  Neste mês vamos interromper esse labor e  fazer uma tradução-adaptação de um escrito de  Engelbert Grau, OFM,  onde ele traça um belíssimo perfil dessa mulher que  honra o movimento evangélico franciscano. Estamos em agosto, mês em ocorre a festa de Clara. O franciscano alemão escreveu suas linhas  em 1976  para o boletim semanal do bispado de Münster, Alemanha. Temos em mãos uma tradução para o espanhol que apareceu em  Selecciones de Franciscanismo, n. 18, 1977, p. 240-247.  Em setembro continuaremos a biografia escrita por Cremaschi.

1. Costuma-se citar de um mesmo fôlego os nomes de Francisco e Clara por serem uma dupla configuração de uma única e idêntica presença nova e dinâmica que a Providência quis suscitar:  a vida segundo o Evangelho, segundo a alegre mensagem de Cristo, nosso Senhor e irmão, e de Deus, a quem chamamos de Abba Pai. Evangelho que Francisco não somente ouviu, não somente conheceu, mas que viveu e reviveu de  forma a mais cabal, tanto interior quanto exteriormente. Este tal Evangelho encontra em Clara, por assim dizer, sua configuração e irradiação femininas. Destarte,  a figura de Clara se torna exemplar para os cristãos de nossos dias, de modo especial  para as mulheres que decidiram seguir Francisco tanto na Segunda quanto na Terceira Ordem.

2. Clara nasceu numa casa de nobres de Assis.  Desde a infância se mostrou uma pessoa interiorizada. Quando tinha dezoito anos,  seus familiares quiseram que ela se casasse. Neste momento já tinha ela se encontrado algumas vezes com Francisco, doze anos mais velho do que ela. Havia ouvido sua pregação e lhe aberto o coração. São largamente conhecidos os episódios de sua vida entre a saída da casa paterna e sua instalação em São Damião. Não precisamos aqui evocá-los. Anteriormente, já os analisamos per longum et latum em textos anteriores.

3. Separada da cidade, no pequeno conventinho de São Damião, Clara esteve ai fechada toda  a sua vida numa áspera pobreza,  naqueles espaços onde rezava, trabalhava e descansava. Fechada dentro daquelas paredes, ao mesmo tempo era uma claridade que iluminava lugares obscuros. No interior do conventinho, Clara estava longe de ser uma alienada, uma pessoa atrofiada, ou marginalizada. Tem um senso delicado e aguçado da beleza. A alva que confeccionara para Francisco é uma das peças mais preciosas do bordado medieval. Naquele espaço exíguo onde vive, onde livremente escolheu se “desterrar”, Clara é de uma liberalidade assombrosa e de uma surpreendente amplitude de visão. Para si reserva a austeridade, para as irmãs a liberalidade. Clara tem a pureza da compaixão verdadeira, é discreta ao corrigir, moderada nas determinações e ordens, prefere respeitar a ser respeitada. Ao lado disso, risonha e alegre, é mulher de penitência excepcional. Será preciso que Francisco ordene que ela aceite cuidados especiais no tempo da doença.  Não prejudique a saúde.

4. Nas poucas cartas que foram conservadas, Clara manifesta uma profundidade madura e nada comum. Poderíamos designá-la de elevação de espírito claramente aristocrática. Sai vencedora pela amabilidade de sua nobreza interior e assombra pela firmeza com que persegue seus objetivos. “Uma vez, o Papa Gregório proibiu qualquer frade de ir sem sua licença aos mosteiros das senhoras. A piedosa madre, doendo-se porque ia ser mais raro para as Irmãs o manjar da doutrina sagrada, gemeu:”Tire-nos também os outros frades, já que nos privou dos que davam alimento de vida”.  E devolveu ao  ministro  na mesma hora todos os irmãos, pois não queria esmoleres para buscar o pão do corpo, se já não tinha esmoleres para o pão do espírito. Quando soube disso, o Papa Gregório deixou imediatamente a proibição nas mãos do ministro geral”  (Legenda 37). Clara resistiu ao Papa quando este queria persuadi-la a garantir sua subsistência e das irmãs com pequena posse: “Se temes pelo voto, disse o Papa, nós te dispensamos do mesmo”.  Ao que Clara respondeu: “Santíssimo Padre, de maneira alguma quero ser dispensada do seguimento de  Cristo” (Legenda, 14).

5. De maneira semelhante a esta autenticidade inquebrantável como pessoa, se mostrou também Clara em seu  comportamento como mulher. Deixa de ser esposa e mãe. Não o faz por falta de  espírito de sacrifício nem porque seu coração ignorasse o que fosse o amor, mas pela fé, por uma iluminação íntima, pelo fogo do coração de seu Senhor. Sabe ela que esse amor é sem limites.  Em sua feminilidade, elevou-se às alturas da exemplaridade.  Seu primeiro biógrafo, no Prólogo, afirma: “Que as mulheres imitem Clara, vestígio da mãe de Deus e nova guia das mulheres!”

6. Clara é toda mulher em sua sensibilidade para com os homens, para com tudo aquilo que a comove interna ou externamente, enchendo-a de tristeza ou de alegria. Acolhe a todos e cada um com profunda reverência e tudo em suas mãos se resolve miraculosamente. Com esta reverência acolhe todos os homens, sua individualidade particular, sua consciência, suas fragilidades e sua graça. Deixou que lhe chamassem de abadessa, segundo as prescrições eclesiásticas.  Ela mesma se designa de “humilde e indigna serva e servidora”. Assim se designa e assim é.  O que sabe e quer: amar servindo e mandar amando. Sua feminilidade se consuma num amor verdadeiramente  materno e criador. Refugia-se na solidão, retira-se do mundo e é como se esse mundo se sentisse atraído na sua direção. Como a borboleta errante aspira pela luz, assim as pessoas se sentem atraídas por ela. Procuram-na carregadas de dificuldades e cheias de  preocupações. Muitos são curados de enfermidades simplesmente quando Clara traça em suas frontes o sinal da cruz.  As pessoas procuram sua sabedoria, suas orientações e instruções. Parece  verdadeiramente emblemático que quando a cidade é atacada por bárbaros estes venham a ser derrotados, não pelas armas ou muralhas, mas pela fé, pela grandeza de uma mulher indefesa, uma Clara que reza na solidão.  Clara é uma torre de paz, como uma rocha, contra a qual as ondas quebram. (Legenda 21-23).

7. Foi no silêncio da solidão que Francisco colheu toda a força para transformar o ambiente em que vivia, sobretudo um mundo que não tinha mais a harmonia com  Deus. Sempre que estava a caminho para pregar a penitência, para proclamar o Reino de Deus e sua paz  tinha sempre saudade da vocação à solidão. Certa vez, envolto por esta saudade do recolhimento, pediu que Clara “conversasse” com Deus para saber se seu caminho era o da contemplação retirada do trabalho no mundo. Clara fez saber a Francisco que esta não era a vontade de Deus. Francisco deveria anunciar o espírito e a riqueza vital do silêncio; ela com suas irmãs guardariam o silêncio.

8. Clara sabia muito bem, quando ingressou no silêncio tão sombrio e nada romântico de São Damião, que não se tratava de ganhar algo, mas tudo. Penetrou naquele silêncio porque buscava a proximidade com Deus. Deus não está no estrépito, nem no ruído  (cf  1Reis 19,11ss).  Ele ama o silêncio, a calma através dos quais se  pode penetrar num mundo todo diferente.  É o mesmo que acontece com os vitrais e suas cores.  Vistos de fora parecem sem vida e escuros. Visto do interior, se iluminam e revelam um colorido e riqueza insuspeitados.  De maneira semelhante, nesses muros e nessas paredes desnudas e insensíveis de São Damião se descobre todo um “mundo”. O mundo que está fora é também criação de Deus, é verdade:  a beleza da paisagem umbra  com suas linhas suaves que flutuam e suas cores discretas. Clara, como Francisco, guarda um olhar lúcido e embelezador diante de tal cenário.  Mas, dentro, no interior de São Damião, está o mundo de Deus que não se pode comparar com tudo o que oferece a criação.  Ali dentro há outro mundo, o mundo imediato de Deus. Dentro há imutabilidade e imortalidade, há verdade, espírito e vida.  Clara foi muito exigente, como só pode ser um grande coração quando se entregou incondicionalmente a esse mundo interior e silencioso.  No interior de São Damião ocorre algo curioso que não se costuma levar suficientemente em conta e que talvez não se queira compreender:  Sobre este mosteiro das irmãs de São Damião, fechado, aparentemente alheio com relação ao mundo e à vida,  parece que está aberto o céu; sobre esta parcela da terra, o céu de Deus, sua graça, sua fidelidade, sua longanimidade e sua misericórdia.  No silêncio desta casa sopra aquela brisa ligeira (cf. Reis 19,12) que anuncia a proximidade de Deus. Na tranqüilidade de São Damião, Clara cria um espaço de eternidade  com suas irmãs no meio do mundo e para o mundo, um lugar de paz de Deus e de sua salvação.  Num tecido enfermiço que desliza para a corrupção, Clara preserva uma célula que é sadia e atua sanando.

9. Se falamos de uma enfermidade que afeta o mundo, referimo-nos à agitação, estrépito, desassossego  sem motivo, procedimentos ruidosos.  Diante deste mundo está Clara, calada, mas exortando e orientando.  Clara está a dizer que existe um outro mundo, mundo da tranqüilidade silenciosa, de uma quietude cheia de Deus e com Deus, essa possibilidade de calar e de escutar. Quando o homem está envolto em seu ruído, não se dá conta que Deus faz mais ruído para se fazer ouvir. Experimentará que Deus escondido se esconderá mais ainda, que seu silêncio é como distância que não pode ser vencida, que seu próprio desassossego  se coloca diante de um enigma em que Deus e mais e mais se distancia. Quem não é capaz de se calar, vive um aturdimento e está impedido de rezar, porque o núcleo do silêncio é precisamente o que se torna oração possível em nós. Clara esconde toda  sua vida no envolvimento  do silêncio porque o que contava para ela era encontrar na oração aquela manifestação primordial da vida, o impulso originário do amor que leva a Deus. A razão disto é que Clara aspira à intimidade e à união com seu Senhor. Por isso, a oração é coração de seu silêncio.

10. Clara vive mais de quarenta anos no retiro silencioso. Durante um bom momento, depois das Completas, continua orando com suas irmãs. Enquanto estas se retiram para descansas, ela permanece em oração  (Legenda 19).  Freqüentemente, Clara se levantava antes das irmãs  para acender as lamparinas.

11. O trabalho também faz parte da jornada das irmãs. A esse respeito Clara exorta expressamente na Regra: “As irmãs a quem o Senhor deu a graça de trabalhar com fidelidade e devoção, depois da hora de Terça, em um trabalho que seja conveniente à honestidade e ao bem comum, de modo que afastando o ócio, inimigo da alma, não extingam o espírito da santa oração e devoção, ao qual outras coisas temporais devem servir (Cap.VII).  Por isso, Clara quando estava enferma, se fazia recostar em  almofadas, para poder costurar. O trabalho também será como que envolvido pela oração. Não se pode perder o espírito da santa oração e da devoção. Depois que as irmãs iam descansar, Clara ainda permanecia em oração. Celano, citando Jó,  afirma que Clara, permanecendo em oração,  queria perceber furtivamente o sussurro divino (Legenda  19).

12. Uma das características mais significativas de Clara e de suas irmãs é a pobreza estrita:  precisamente neste ponto Clara compreendeu perfeitamente a Francisco. Diante dos olhos de Clara está o Evangelho. E o Evangelho proclama, uma página atrás da outra, a graça e a verdade de Jesus Cristo que repousa no seio do Pai, que se fez homem e viveu entre nós. Por meio do Evangelho, Clara se encontra com o Filho de Deus vivo e ele encontra a ela não na grandeza que oprime nem no esplendor que nos torna insensíveis, mas na pobreza e na humildade.

13. Clara, como Francisco, aprendeu do Senhor esta pobreza e humildade. A maneira rigorosa como Clara  pratica a pobreza não é renúncia pela renúncia: sua pobreza e sua renúncia a toda propriedade são a proclamação e a expressão de uma dependência absoluta de Deus, de uma entrega total e incondicional a ele. Sua pobreza não é outra coisa senão confiança radical em Deus, em sua fidelidade e em seu amor. A pobreza, tal como Clara concebe e como a vive com suas irmãs, é renúncia incondicional a toda garantia natural e humana, uma renuncia mediante a qual, crendo e amando, desafia a onipotência misericordiosa de Deus. Sua “altíssima  pobreza” como ela a designa da mesma forma de Francisco  é a esperança perfeitamente entendida e vivida, é confissão cabal e sem reservas de que o ser humano é criatura e como conseqüência desta confissão, é entrega sem limites ao Criador e Senhor. Uma vida em tal tipo de pobreza se converte na concreta e maravilhosa realização das palavras do Senhor: “Buscai primeiro o Reino de Deus e sua justiça e tudo o mais vos será dado em acréscimo” ( Mt 6, 33).

14. Brotando do ser pobre genuíno de todo homem interior, cresce em Clara aquela atitude de humildade que provém do fato de considerar que o homem é criatura, e como tal, pobre.  Somente assim pode a criatura permanecer ante o seu Senhor.  Este ser pobre foi  a forma e a lei do ser cristão de Clara, servir com toda reverência  e tomar a sério o outro homem, porque Deus o leva a sério.  Amar com a entrega total de si mesma e ser totalamente sincera neste amor.  Ser tão firme neste amor que nada possa causar dor.

15. Por mais dura, pesada e isenta de todo romantismo  que tenha sido  esta vida de Santa Clara e de suas irmãs, nada tinha de sombria. Não se esvai em tristeza e descontentamento. Pelo contrário, fazia nascer  alegria do homem redimido que pode ser “colaborador” de Deus na obra da redenção (Carta III, 2). Também aqui Clara compreendeu cabalmente o pai espiritual, São Francisco, penetrando cada vez mais no segredo da perfeita alegria. Tal alegria alcançou sua expressão mais cabal da morte da santa.  Durante dezessete dias, Clara não pode tomar alimento algum. Encontrava-se, no entanto, tão forte que podia confortar em seu serviço a todos os que chegavam até ela e despedi-los consolados. Nas últimas horas de sua vida, absorta em Deus, se podia ouvir: “Vá segura que você tem uma boa escolta para o caminho. Vá, porque aquele que a criou também a santificou; e guardando sempre como uma mãe guarda o filho, amou-a com terno amor. E bendito sejais vós, Senhor, que me criaste”  (Legenda , 46).

16. Estas são as palavras de Clara moribunda. Diz isso depois de ter levado uma vida distante de toda acomodação ao espírito do mundo. Diz isso depois de ter renunciado a tudo que pudesse massagear seu egoísmo, e a todo humana pretensão, depois de  uma vida de  sofrimento e enfermidades. Ali, em São Damião, onde Clara viveu, podemos ainda vê-la e compreendê-la hoje.  A casa, acanhada e desnuda, o coro onde as irmãs rezavam e sem ornamentação , a sala onde comiam,  com mesas rústicas e piso gasto, a outra sala onde dormiam  debaixo do madeirame do texto  E como se isto não bastasse Clara usa uma saia de penitência confeccionada por ela mesma. Seu alimento era pão e água. Dormia sobre o chão duro e algumas vezes sobre galhos secos. Como apoio para a cabeça  tinha uma pedaço de madeira. E esta Clara, na presença da morte, tendo um semblante sorridente, se encontra com estas palavras nos lábios: “Bendito sejas, Senhor, por haveres criado!”

17. Gostaria de terminar estas reflexões com palavras de André Vauchez, um grande medievalista e profundo conhecedor do movimento franciscano. “Clara não reivindicou para si e suas irmãs o direito de pregar ou ensinar, mas desejava ardentemente continuar vivendo em simbiose com os irmãos menores  e  rejeitava com veemência ver sua comunidade transformada num mosteiro de virgens fechadas e dotadas de rendas. Mesmo tendo aceito o estilo de vida  semelhante à reclusas, conservavam contato com o mundo que as rodeava.  Foi intransigente na questão da pobreza, porque o fato de viver numa precariedade permanente constituía o ponto sobre o qual sua fundação podia, diferenciando-se do monaquismo beneditino, permanecer fiel ao espírito do Pobrezinho e, através dele, às aspirações evangélicas que haviam animado os movimentos  laicos dos séculos  XII e começos do século XII”.

Extraído de http://www.franciscanos.org.br/v3/almir/artigos/clara/08.php acesso em 14 jan. 2011.
Ilustração: Glasfenster im Chrorumgang der Klosterkirche von Königsfelden, Szene: Hl. Klara vor den Mauern von Assisi / Meister von Königsfelden. 1325-1330. Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Meister_von_K%C3%B6nigsfelden_001.jpg acesso em 14 jan. 2011.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

Blog Movimento de Assis é repaginado!

logo 2011

O blog que retrata a fraternidade franciscana São Maximiliano Maria Kolbe, OFS de Porto Feliz, está ganhando uma nova cara. Os principais objetivos eram dar maior leveza visual, com cores suaves, letras maiores e um novo logo, além de uma ampla revisão nos arquivos do Blog, este último estágio ainda não foi concluído!

Fraternidade Em Porto Feliz, começou como Movimento de Assis, um grupo de pessoas que buscavam aprender e viver da espiritualidade franciscana, alguns já eram professos na OFS (Ordem Franciscana Secular) e frequentavam outra fraternidade em Sorocaba. Como o grupo foi crescendo e vocações foram sendo despertadas, começou-se a erigir a fraternidade de São Maximiliano Maria Kolbe na cidade. Incialmente foram 14 pessoas que fizeram o rito de admissão, meses depois mais duas pessoas fizeram o rito de admissão em Sorocaba. Depois de um tempo um irmão faleceu, Ney Pottel, deixando uma grande lacuna e saudades. Atualmente são 15 irmãos em tempo de formação, antes de professarem.


pastoral
Frutos Um dos grandes frutos da fraternidade é a Pastoral da Comunicação, que começou com o Blog Movimento de Assis criado por Camila Leite, que só abordava assuntos e eventos franciscanos, diante do desafio e da necessidade de se registrar e divulgar outros eventos da Igreja na cidade, por um tempo o blog franciscano abrigou atividades “pascom”, e em janeiro de 2010 com apoio e incentivo da Pascom Arquidiocesana, nasceu a Pascom Porto Feliz. Assim, consequentemente separando-se as atividades e endereço eletrônico. 

O blog franciscano continua abordando a vida e realidade da fraternidade. A Pascom segue também seu caminho no mundo digital.

Entre os Franciscanos, há uma forte característica digital: a existência de Blogs. Tendo uma grande preocupação e forte orientação para que as fraternidades registrem suas reuniões gerais, encontros e atividades, como forma de se  divulgar e arquivar toda a vida da fraternidade na comunidade, na vida paroquial. É preciso registrar a história que está sendo traçada.


Acesse o blog da fraternidade:

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

"VONTADE DE DEUS ÉS MEU PARAÍSO..."
















“VONTADE DE DEUS ÉS MEU PARAISO...”

Verdadeiramente Deus nos criou com um propósito eterno, por isso, precisamos compreender qual é a Sua vontade para a nossa vida, isto por que, no mais das vezes, colocamos Deus no centro de nossas discussões sejam elas teológicas ou não e agimos a partir daí, como se o Senhor estivesse presente apenas como mero espectador de nossos discursos e de nosso viver, mas não interagindo conosco numa relação paterna filial íntima pela ação do seu Espírito.

Bem nos testemunhou Jesus, falando de sua intimidade com o Pai aos apóstolos: “Disse-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai e isso nos basta. Respondeu Jesus: Há tanto tempo que estou convosco e não me conheceste, Filipe! Aquele que me viu, viu também o Pai. Como, pois, dizes: Mostra-nos o Pai... Não credes que estou no Pai, e que o Pai está em mim? As palavras que vos digo não as digo de mim mesmo; mas o Pai, que permanece em mim, é que realiza as suas próprias obras.     Crede-me: estou no Pai, e o Pai em mim. Crede-o ao menos por causa destas obras. Eu e o Pai somos um”. (Jo 10,8-11.30).

Ora, o batismo nos liga diretamente ao Senhor, pois, por ele nos tornamos templos do Espírito Santo, filhos de Deus, por isso, todas as ações do cristão são em Cristo e para Cristo, visto que o Senhor é a videira verdadeira e nós somos os seus ramos. Todavia, quando essas ações não são conformes a vontade de Deus, logo sentimos os efeitos negativos do mal praticado, ou seja, nos tornamos galhos improdutivos ou secos que precisam ser podados - pelo arrependimento sincero, o perdão sacramental e a reconciliação - para que produzam bons frutos; ou extirpados, isto é, lançados fora, mas isto só acontecerá no fim de tudo se não houver arrependimento de nossa parte, pois a misericórdia do Senhor é infinita...

Destarte, tenhamos em conta que o que fazemos para a eternidade é que fazemos, tal qual escreveu São Lucas nos Atos dos Apóstolos, relatando o que dissera São Paulo: "É em Deus que vivemos, nos movemos e somos..." (Cf. At 17,28). Porque, de fato, a vontade de Deus para nossa vida, nós a encontramos em Jesus Cristo, modelo perfeito de obediência, como nos ensina a carta aos hebreus: “Nos dias de sua vida mortal, dirigiu preces e súplicas, entre clamores e lágrimas, àquele que o podia salvar da morte, e foi atendido pela sua piedade. Embora fosse Filho de Deus, aprendeu a obediência por meio dos sofrimentos que teve. E uma vez chegado ao seu termo, tornou-se autor da salvação eterna para todos os que lhe obedecem, porque Deus o proclamou sacerdote segundo a ordem de Melquisedec.” (Heb 5,7-10).

Muito se discutiu e se discute ainda em nossos dias sobre o livre arbítrio humano em relação à vontade de Deus, mas isso é fácil de entender, porque a vontade de Deus é livre, soberana, santa e eterna e é a nossa única Fonte de felicidade; a nossa vontade existe em função da Vontade do Senhor. Desse modo, só existe liberdade verdadeira em Deus, porque fora do Altíssimo tudo é escravidão ("Em verdade em verdade vós digo: todo homem que se entrega ao pecado é seu escravo" Jo 8,34), ou seja,"O Senhor é Espírito e onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade". (2Cor 3,17).

Ora, a lei de Deus é como um código genético escrito na alma humana e na criação como um todo, a que chamamos lei natural; temos ainda os santos mandamentos, expressos por revelação nas Sagradas Escrituras à toda humanidade; por essas leis entramos em comunhão com a vontade do Senhor diretamente em nossa vida, como o fez Jesus, o Filho de Deus muito amado; Ele é o ápice de toda a lei. Basta que lhe sejamos fiéis, amando-o com todo o nosso ser, guardando os seus santos mandamentos para que se realize em nossa vida a plenitude de sua vontade, que é a nossa salvação eterna.

Portanto, somos filhos de Deus e precisamos viver como filhos de Deus neste mundo para sua maior glória, para isto é que o Senhor permanece conosco até o fim do mundo, pois, aqui tudo passa, mas aquele que permanece no Senhor, permanece para sempre... Quanto às discussões teóricas, não passam de vãs filosofias e ridículos solfismos, porque “a realidade é Cristo” e é com Ele, Nele e para Ele que devemos viver nossos dias neste mundo até que nos leve consigo para sua glória eterna.

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

O mundo merovíngio e a construção da identidade cristã

Graduado em História pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Edmar Checon de Freitas é especialista em História Social pela mesma instituição. Seu mestrado e o doutorado em História foram cursados na Universidade Federal Fluminense (UFF). Sua dissertação chama-se Martinho de Tours, o apóstolo da Gália: monaquismo e evangelização na Vita Martini de Sulpício Severo, e sua tese, Realeza e santidade na Gália Merovíngia: o caso dos Decem Libri Historiarum de Gregório de Tours (538-594). É autor de vários artigos, capítulos de livros, bem como de resumos e comunicações publicados em anais de congressos e periódicos.

Por: IHU Online

Por e-mail, o professor de História da UFF deu a entrevista que segue, enfatizando que é no mundo merovíngeo que se pode acompanhar “a construção de uma identidade cristã que acolhe elementos tanto do mundo romano-cristão quanto das culturas não-cristãs”. Sobre a influência do crstianismo na sociedade medieval, o historiador disse que “toda a vida social, a cultura e mentalidade medievais passavam pelo cristianismo, embora não fossem exclusivamente cristãs”.


IHU On-Line – Quais seriam os traços mais marcantes do período merovíngio na Gália?


Edmar Checon de Freitas – Destaco essencialmente o processo de interação entre as culturas germânica e romana. No mundo merovíngio , podemos acompanhar a construção de uma identidade cristã que acolhe elementos tanto do mundo romano-cristão quanto das culturas não-cristãs. No plano político, temos a afirmação da realeza franca, também ela portadora de uma dupla herança: a monarquia imperial romana e a realeza germânica, ambas aproximadas pelo modelo da monarquia cristã.


IHU On-Line – Como realeza e santidade se apresentavam na Gália merovíngia?


Edmar Checon de Freitas – Na minha concepção, podemos falar da construção da idéia de monarquia cristã na Gália do século VI. A santidade, exigível de todo cristão, o era de modo especial no caso dos reis, a quem se atribuía o estabelecimento e a conservação da ordem cristã. A santidade, explicitada por virtudes, como bondade, justiça, caridade, temperança e piedade, não era um atributo particular dos reis, mas uma condição para o pleno exercício de seu papel.

IHU On-Line – Em linhas gerais, como pode ser descrito o monacato basiliano em suas relações com a igreja e a sociedade no Oriente do século IV?


Edmar Checon de Freitas – Aqui recuamos um pouco no tempo com relação às questões anteriores. O modelo monástico proposto por São Basílio de Cesaréia (ou Magno, 330-379) foi marcado pela busca da harmonia na comunidade monástica, a rejeição do rigorismo ascético extremado, o apelo à submissão diante das autoridades eclesiásticas e à integração na sociedade. Embora tendo se retirado do mundo, o monge basiliano não deveria se alienar do mundo, e sim contribuir para sua melhora. Concretamente se tratava da prática da virtude da caridade, por meio da assistência aos pobres e doentes.

IHU On-Line – Como se caracterizava a santidade monástica do século IV? Como a vida monástica preparou o terreno para o florescimento da cultura no seio da Igreja?


Edmar Checon de Freitas – No cristiansimo do século IV, os monges eram percebidos como uma extensão da milícia celeste (os anjos), devendo combater cá embaixo as forças demoníacas. Forjavam em seus corpos um espaço sagrado, impenetrável para os demônios. A preparação desse corpo santo dava-se por meio dos jejuns, das mortificações e da oração, por meio dos quais o monge concretizava o ideal de renúncia ao mundo. Bem cedo, a Igreja percebeu a força de tal movimento e a necessidade de uma sólida base intelectual para suportá-lo. Tornaram-se os retiros monásticos repositórios do saber, conservando para os tempos medievais muito da cultura antiga.

IHU On-Line – Quais são as possíveis aproximações entre cristianização e violência no período merovíngeo? Quais foram os impactos dessa cristianização da Europa dos séculos IV a VIII?


Edmar Checon de Freitas – A violência era parte do cotidiano do mundo merovíngio. No que se refere à cristianização da Europa cabem destacar dois aspectos, não circunscritos unicamente à Gália merovíngia: em primeiro lugar, a cristianização implicou um processo de destruição de templos, ídolos e santuários em geral, sobretudo em fins do século IV; além disso, houve em vários momentos episódios de conversão forçada. Não se deve esquecer ainda que a própria imposição de uma nova fé já carrega em si a marca da violência. Quanto aos impactos da cristianização na Europa, insisto na formatação de uma cultura e de uma identidade cristãs, a meu ver a essência da idéia de Cristandade.

IHU On-Line – Como o cristianismo influenciou a sociedade medieval e modificou-a?


Edmar Checon de Freitas – Toda a vida social, a cultura e mentalidade medievais passavam pelo cristianismo, embora não fossem exclusivamente cristãs. Fico com dois aspectos a meu ver essenciais: a promoção, ainda que embrionária, da idéia de indivíduo, pois o cristianismo supõe, num certo nível, uma relação individual com Deus e o postulado da igualdade entre os homens, embora referido originalmente aos membros da comunidade cristã e pensado no plano espiritual.


IHU On-Line – Quais são as principais características da narrativa hagiográfica do século IV, sobretudo a respeito de Gregório de Tours?


Edmar Checon de Freitas – No século IV, a tradição hagiográfica produziu, sobretudo, vidas de santos. Esse aspecto biográfico, de certo modo já presente nos antigos relatos das paixões dos mártires, contribuiu para a difusão do culto dos santos, especialmente mártires, monges e taumaturgos. Nos tempos de Gregório de Tours (538-594), ao lado das vitae encontramos as coleções de milagres, fortemente associadas à promoção de centros de culto (igrejas que possuíam a tumba e o corpo de um santo ou suas relíquias).

IHU On-Line – Em que aspectos as sociedades antiga e medieval diferem mais?


Edmar Checon de Freitas – Ambas pretendiam refletir uma certa ordem superior, mas enquanto a Antigüidade Clássica voltava-se para a ordem cósmica, imutável, a civilização cristã medieval construiu-se sob a marca do transitório. Na concepção cristã, Deus não é parte da ordem cósmica, e sim sua fonte criadora; assim a articulação espaço-tempo corresponde a um momento de um drama histórico linearmente concebido. Em outras palavras, a sociedade medieval percebia-se como parte da história da salvação, caminhando no sentido do Juízo Final. Essa noção de transitoriedade foi fundamental para o enraizamento da noção de mudança social.

Extraído de: IHU on-line. Revista do Instituto Humanitas. São Leopoldo. Ano 4, n. 198, 02 out. 2006. Disponível em http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=447&secao=198 acesso em 13 jan. 2011.
Foto: Rouelle ou plaque châtelaine, époque mérovingienne, bronze découpé, représentant un homme (orant?) à cheval. Musée de Laon / Vassil, 2008 (foto). Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Rouelle_m%C3%A9rovingienne_Mus%C3%A9e_de_Laon_70908_1.jpg acesso em 13 jan. 2011.

SEXUALIDADE & VONTADE DE DEUS














SEXUALIDADE & VONTADE DE DEUS

Nunca confundir os próprios instintos com a vontade de Deus, pois seria insensatez; o instintivo pelo instintivo não passa de uma porta aberta para os vícios e toda espécie de mal “justificável”; só faz a vontade de Deus na área da sexualidade quem na verdade se deixa conduzir pelo Espírito Santo; exatamente como nos ensina São Paulo: “Vós, irmãos, fostes chamados à liberdade. Não abuseis, porém, da liberdade como pretexto para prazeres carnais. Pelo contrário, fazei-vos servos uns dos outros pela caridade, porque toda a lei se encerra num só preceito: Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Lv 19,18).

“Digo, pois: deixai-vos conduzir pelo Espírito, e não satisfareis os apetites da carne. Porque os desejos da carne se opõem aos do Espírito, e estes aos da carne; pois são contrários uns aos outros. É por isso que não fazeis o que quereríeis. Se, porém, vos deixais guiar pelo Espírito, não estais sob a lei. Ora, as obras da carne são estas: fornicação, impureza, libertinagem, idolatria, superstição, inimizades, brigas, ciúmes, ódio, ambição, discórdias, partidos, invejas, bebedeiras, orgias e outras coisas semelhantes. Dessas coisas vos previno, como já vos preveni: os que as praticarem não herdarão o Reino de Deus!

“Ao contrário, o fruto do Espírito é caridade, alegria, paz, paciência, afabilidade, bondade, fidelidade, brandura, temperança. Contra estas coisas não há lei. Pois os que são de Jesus Cristo crucificaram a carne, com as paixões e concupiscências. Se vivemos pelo Espírito, andemos também de acordo com o Espírito”. (Gal 5,13-25).

Portanto, o sexo é bom, muito bom, porque é dom de Deus, porém, quando vivido como sacramento de salvação para a maior glória de Deus, pois santifica tanto o homem quanto a mulher, porque “o que Deus uniu o homem não separe”. Logo, isto requer, de ambas as partes, amor e fidelidade como expressão da vontade de Deus que os une; fora dessa verdade, a prática sexual torna-se deturpação do dom de Deus.

Paz e Bem!

Frei Fernando


domingo, 23 de janeiro de 2011

PRESENÇA DE MARIA NA PATRÍSTICA

PRESENÇA DE MARIA NA PATRÍSTICA

“E Maria disse: Minha alma glorifica ao Senhor, meu espírito exulta de alegria em Deus, meu Salvador, porque olhou para sua pobre serva. Por isto, desde agora, me proclamarão bem-aventurada todas as gerações, porque realizou em mim maravilhas aquele que é poderoso e cujo nome é Santo”. (Lc 1,46-49).

Desde toda a eternidade, Deus em sua infinita bondade escolhera Maria como Mãe de Jesus, Salvador dos homens, para ser também a mãe da nova criação. Em seu desígnio de amor, o Pai Eterno, quis que a Virgem, pela ação do Espírito Santo, concebesse aquele que nos libertaria do pecado, da morte e de todo o mal, como revelou o Anjo Gabriel na anunciação. (Cf. Lc 1,30-33).

Ora, após a morte do último apostolo, o Espírito Santo deu continuidade à obra salvífica por meio dos primeiros padres da Igreja que sucederam os apóstolos, estes assimilaram e transmitiram com perfeição os ensinamentos recebidos de Jesus e dos apóstolos, conforme a Palavra do Senhor: “Disse-vos estas coisas enquanto estou convosco. Mas o Paráclito, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome, ensinar-vos-á todas as coisas e vos recordará tudo o que vos tenho dito”. (Jo 14,25-26); desse modo, refutaram todas as heresias de então, proclamando as verdades da fé tal qual acreditamos e vivemos hoje; dentre essas verdades, sem dúvida alguma, a devoção a Maria, Mãe de Jesus.

De fato, “a devoção à Santíssima Virgem Maria começou com a própria Igreja e vem se desenvolvendo desde os primeiríssimos tempos do Cristianismo. Foram, com efeito, os Santos Padres que lançaram as pedras fundamentais para a construção do grande edifício da [devoção mariana]. Em seus escritos encontram-se em gérmen os elementos doutrinários que - desenvolvidos ao longo dos séculos pela especulação teológica e pelo sensus fidelium, sob inspiração do Espírito Santo - facilitaram mais tarde a proclamação dos diversos dogmas marianos, como a maternidade divina (Theotokos) no concílio de Éfeso (431), o dogma da Imaculada Conceição (1854), e o da Assunção de Nossa Senhora aos céus (1950)”. Vejamos, a seguir, alguns dos mais importantes textos mariológicos dos primeiros séculos do Cristianismo”. *

Santo Inácio de Antioquia

“Discípulo do Apóstolo João, Inácio foi o terceiro Bispo de Antioquia, sucedendo ao Apóstolo Pedro e a Santo Evódio. Após reger sua diocese durante quase 40 anos, Santo Inácio foi preso, levado para Roma e entregue às feras, no Coliseu, no ano 107. Em suas cartas, sente-se o amor ardente de um santo que faz frequentes alusões à Virgem Maria: "Jesus, nosso Deus, o Ungido, foi levado por Maria em Seu seio, conforme o plano salvador de Deus; era em verdade da linhagem de Davi, engendrado, sem embargo, por obra do Espírito Santo. Ele foi dado à luz e foi batizado a fim de santificar a água com Seus padecimentos".*
Santo Irineu de Lyon

“Irineu nasceu com toda probabilidade em Esmirna (hoje Izmir, na Turquia), entre os anos 135 e 140. Em sua juventude, frequentou a escola do Bispo São Policarpo, o qual por sua vez havia sido discípulo do Apóstolo João. Eis o que escreveu Santo Irineu: "Assim como o gênero humano foi levado à morte por uma virgem, foi libertado por uma Virgem".*

Orígenes de Alexandria

“Uma das maiores inteligências da antiguidade cristã é Orígenes, filho do mártir São Leônidas, catequista. Escritor de grande profundidade cristológica, é, ao mesmo tempo, um dos primeiros a declarar que a Mãe de Jesus foi sempre Virgem: “Jesus Cristo, O que veio ao mundo, nasceu do Pai antes de toda criatura. Depois de ter coadjuvado, como ministro do Pai, na criação do universo - ‘tudo foi feito por Ele, e sem Ele nada foi feito' (Jo 1, 3) -, humilhou- Se nos últimos dias, fez-Se homem, encarnou- Se (cf. Fl 2, 7-8), sem deixar de ser Deus. Assumiu um corpo semelhante ao nosso e foi diferente de nós somente enquanto nascido da Virgem e do Espírito Santo".*

Enfim, como vimos, a presença da virgem Maria na patrística é evidente, pois foi do agrado do Filho amado que sua santa Mãe tivesse um lugar de destaque em sua obra redentora e por inspiração do Espírito Santo assim se fez por meio dos apóstolos e da tradição dos santos padres da Igreja.

Ó Onipotência suplicante, rogai por nós que recorremos a vós, diante Daquele que é que era e que vem, diante do Todo Poderoso de quem recebestes todas as graças e favores, à Ele a glória por toda a eternidade! Amém!

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


sábado, 22 de janeiro de 2011

O surgimento das cidades medievais

Inspirado nas questões enviadas pela redação da IHU On-Line, o medievalista francês Jean-Claude Schmitt escreveu o artigo que segue, enviado por e-mail. Nele, o pesquisador explica a lógica do surgimento das cidades medievais e suas conseqüências.

Por: IHU Online


Uma das concepções que mudou com o surgimento dos centros urbanos no medievo foi aquela a respeito do trabalho. O entedimento do trabalho como pena, “conseqüência do pecado original, cede lugar a uma concepção do trabalho como produtor de bens e de riquezas. É preciso trabalhar, não mais apenas para garantir sua Salvação, mas para ganhar sua vida e alimentar seus filhos. A ociosidade já não é mais apenas um vício, é uma falta social. A pobreza, por longo tempo associada a uma virtude (exemplo do Cristo, seguido pelos – Pauper Christi (Pobre do Cristo) – que fazem voto de renúncia aos bens materiais) torna-se maldição social e risco para a ordem pública”. Os grifos no artigo a seguir são do próprio autor.

Schmitt é professor na École des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS), na França, e membro da Escola dos Annales, junto de Jacques Le Goff, com quem organizou o Dicionário temático do Ocidente medieval. Bauru/São Paulo: EDUSC/Imprensa Oficial do Estado, 2002, traduzido por Hilário Franco. Escreveu também História das superstições. Portugal: Edições Europa-América, 1997 e Os Vivos e os Mortos na Sociedade Medieval. São Paulo: Companhia das Letras, 1999. É considerado um dos historiadores mais importantes da sua geração.

A renovação do fenômeno urbano é um dos maiores aspectos da história da sociedade e da cultura da Europa dos séculos XI – XIII, e ela deixou marca indelével até nossos dias, nas cidades européias. Não se trata propriamente de falar de um “surgimento”, já que muitas cidades antigas, reduzidas a poucas coisas após o desmoronamento do Império Romano, renasciam nos mesmos locais, integrando muitas vezes partes dos monumentos e dos recintos anteriores. A cidade medieval, porém, com efeito, nada mais tem a ver com a cidade antiga, tanto que, nas regiões não romanizadas, ou mesmo em novos lugares do antigo imperium, há aglomerações realmente novas que se erguem e se desenvolvem.

A sociedade é, então, essencialmente rural e é da terra que vêm as riquezas e os excedentes que permitem construir e nutrir esses novos espaços habitados. É, pois, do lado das zonas rurais e da economia agrária que é preciso procurar as primeiras causas do surgimento urbano: melhores rendimentos, devidos, sem dúvida, a transformações climáticas, favoráveis a um aumento dos rendimentos básicos, porém, em primeiro lugar e sobretudo, devidos a transformações sociais, a um enquadramento diferente das pessoas pelo poder senhorial, a novas formas de extrair um valor da terra. De início, portanto, causas ecológicas e materiais, porém igualmente causas sociais, que se resumem pela noção de “feudalismo”: ou seja, um novo modo de produção que repousa sobre o enquadramento de trabalhadores livres (e não mais escravos), adstritos a encargos, pagos mais em dinheiro, pois um dos efeitos destas transformações é a renovação da economia monetária, da cunhagem de moedas (como, por exemplo, a retomada da cunhagem do ouro, interrompida após o século VII). A cidade beneficia-se e torna-se rapidamente o motor dessa circulação monetária, metálica e mais fiduciária (no caso das letras de câmbio pagáveis a termo nas feiras e mercados).

A cidade é um organismo social que participa da sociedade feudal, contrariamente à idéia romântica e liberal de uma burguesia urbana estranha à ordem senhorial. Ao contrário, é preciso pensar sua articulação com as formas senhoriais e feudais (e da realeza) do poder que regem a sociedade. No interior desse mundo, a cidade desenvolve, entretanto, instituições que tendem a contradizer os princípios institucionais tradicionais (que se pense nas cartas de franquia que dão às “comunas” uma grande autonomia). A cidade é o lugar de um poder compartilhado – horizontal e não vertical – mas que permanece oligárquico: é o dos nobres urbanos, detentores do essencial da fortuna mercadológica e territorial, mas, contra os quais os artesãos, organizados em profissões, se rebelam, exigindo compartilhar do poder, o que eles acabam por obter. No século XIV, assiste-se mesmo a revoltas do popolo minuto, (do povo miúdo), que são esmagadas.

A conquista da autonomia perante o senhor laico ou eclesiástico (trata-se, com freqüência, do bispo local) e depois a repartição do poder e dos recursos entre os diferentes grupos hierárquicos da população representam, evidentemente, os principais problemas com os quais são confrontadas as cidades. Em seguida, no decurso do tempo, surgem outros problemas, ligados à revitalização em caso de fome, às variações sazonais dos preços (com os riscos de motins em caso de penúria), aos riscos de epidemia e à peste (a partir de 1348), à extensão espacial da cidade (quando, por exemplo, é preciso reconstruir as muralhas para que elas englobem um território mais extenso) e, de maneira geral, à tributação ligada ao crescimento do poder monárquico e estatal (na França e na Inglaterra, no contexto da Guerra dos Cem Anos, amplamente financiada pelas contribuições das cidades).

Na medida em que a economia urbana repousa sobre o trabalho artesanal ou industrial (nas grandes cidades fabricantes de tecidos da Itália ou de Flandres) e sobre o comércio, a questão do trabalho manual está no centro das preocupações, tanto dos edis que governam e fixam as regras do trabalho das “corporações”, quanto dos clérigos que definem uma ética do trabalho. O trabalho concebido como pena (labor), conseqüência do pecado original, cede lugar a uma concepção do trabalho como produtor de bens e de riquezas. É preciso trabalhar, não mais apenas para garantir sua Salvação, mas para ganhar sua vida e alimentar seus filhos. A ociosidade já não é mais apenas um vício, é uma falta social. A pobreza, por longo tempo associada a uma virtude (exemplo do Cristo, seguido pelos – Pauper Christi (Pobre do Cristo) – que fazem voto de renúncia aos bens materiais) torna-se maldição social e risco para a ordem pública. O “pobre válido” – acusado de mendigo quando é fisicamente apto para trabalhar – é denunciado a partir do século XIII, sendo perseguido e estigmatizado entre os séculos XV e XVII. Ele se torna a figura “anti-urbana” por excelência.

As Ordens Mendicantes  e, mais precisamente os franciscanos, conhecem uma história intimamente ligada a estes problemas ideológicos e sociais. Eles pretendem originariamente viver como “mendicantes”, recusando o dinheiro, a terra, a propriedade. Eles pedem somente que sejam alimentados em troca da Palavra que prodigalizam em seus sermões. Entretanto, a evolução da sociedade em seu conjunto e em seu próprio sucesso, que faz afluir para eles as doações, confronta-os rapidamente com o problema do enriquecimento. De onde a ficção que se imagina, segundo a qual o papado é proprietário de seus bens, enquanto eles são apenas usufrutuários (usu pauper). Uma fração dos franciscanos, os espirituais, contudo, recusam esse compromisso, inspiram-se em teses apocalípticas e milenaristas de Joachim de Fiore  e são repelidos por heresia. Eles são finalmente exterminados pelos poderes eclesiásticos e seculares. No entanto, trata-se apenas de um fenômeno muito limitado e, apesar de tudo, característico sobretudo da Itália e do sul da França. O essencial é a boa integração das Ordens Mendicantes nas cidades (dominicanos, franciscanos, carmelitas, agostinianos) – elas são apenas quatro a partir de 1274 – pois são elas que, ao lado, e por vezes contra, o clero secular, são responsáveis pela pregação, pelas missas e pelos sacramentos, em proveito da população. Numa cidade como Paris, elas ocupam cátedras na universidade, representam o cume da intelligentsia, que se expande deste centro intelectual para toda a cristandade. Eles são tão bem integrados que se pode apreciar a importância das cidades medievais em função do número dos conventos mendicantes que ali se encontram – 4 para uma grande cidade, 3 para uma cidade menos importante etc. Se uma aglomeração não possui um convento mendicante, pode-se hesitar em falar de cidade.

A vida religiosa dos urbanos não é, nem mais, nem menos “supersticiosa” do que a dos rurais. De fato, é preciso evitar de falar de “superstições”, pois a palavra lembra sempre um julgamento de valor segundo critérios que são os nossos (sábios, racionais etc.). Há crenças e práticas rituais “populares”, mas, com freqüência perfeitamente aceitas pelos clérigos e pela Igreja oficial; diversas práticas e crenças desse tipo (notadamente a propósito do culto das imagens) brotaram, aliás, das formas cultuais da Igreja; elas não são denunciadas ou caçadas como radicalmente diferentes ou heterodoxas, mas enquanto ultrapassam as práticas oficiais e, sobretudo, escapam ao controle do clero. Quanto à bruxaria, que existe também na cidade, ela mobiliza as forças do Mal, mas estas forças também fazem parte da religião cristã! Seu erro é principalmente, quando condenado, o de aparecer como prática das pessoas simples e das mulheres, fora do controle do clero.

Extraído de: IHU on-line. Revista do Instituto Humanitas. São Leopoldo. Ano 4, n. 198, 02 out. 2006. Disponível em http://www.ihuonline.unisinos.br/index.php?option=com_content&view=article&id=442&secao=198 acesso em 13 jan. 2011.
Ilustração: Les Très Riches Heures du duc de Berry, Juin. In the background, the royal palace, in the island, of Cité with the Holy Chapel the Musée Condé, Chantilly. Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Les_Tr%C3%A8s_Riches_Heures_du_duc_de_Berry_juin.jpg acesso em 13 jan. 2011.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

O JUSTO, O INOCENTE, VENCE SEMPRE...


















O JUSTO, O INOCENTE, VENCE SEMPRE...

“Quem a Deus tem nada lhe falta”, disso nós temos plena certeza, porque Deus e somente Deus a tudo satisfaz perfeitamente; por isso, podemos afirmar com São Paulo: "Todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus". (Rom 8,28).

Ora, nada neste mundo é por acaso, tudo tem um sentido, uma finalidade; e pelo fato de Deus está no comundo do plano da salvação, mesmo aquilo que agora não entendemos, se transformará em ressurreição, por vivermos neste mundo segundo a sua vontade. Para tanto, nos espelhamos no exemplo de Jesus, o seu Filho amado; em nenhum momento de sua trajetória existencial ele foi desamparado por Deus Pai, mesmo quando enfrentou a cruz, ele nos deixou o exemplo da obediência perfeita: “Pai, se é de teu agrado, afasta de mim este cálice! Não se faça, todavia, a minha vontade, mas sim a tua”. (Lc 22,42).

Logo, qualquer que seja a provação porque passamos neste mundo é um desafio de fé, porque por ela exercitamos nossa filiação divina e nossa obediência ao plano da salvação de nossas almas. É como nos ensinou São Tiago em sua carta: “Considerai que é suma alegria, meus irmãos, quando passais por diversas provações, sabendo que a prova da vossa fé produz a paciência. Mas é preciso que a paciência efetue a sua obra, a fim de serdes perfeitos e íntegros, sem fraqueza alguma”. (Tiag 1,2-4).

De fato, quando um cristão é desafiado em sua fé, tem como resposta um amor incondicional a Deus e ao seu desígnio, capaz de vencer toda mentira e ódio que se levanta contra sua integridade, desse modo, vence todas as batalhas que trava, por viver segundo a vontade de Deus integralmente, por isso, fiquemos firmes e escutemos o que diz o Senhor:

“Meu filho, se entrares para o serviço de Deus, permanece firme na justiça e no temor, e prepara a tua alma para a provação; humilha teu coração, espera com paciência, dá ouvidos e acolhe as palavras de sabedoria; não te perturbes no tempo da infelicidade, sofre as demoras de Deus; dedica-te a Deus, espera com paciência, a fim de que no derradeiro momento tua vida se enriqueça.

Aceita tudo o que te acontecer. Na dor, permanece firme; na humilhação, tem paciência.  Pois é pelo fogo que se experimentam o ouro e a prata, e os homens agradáveis a Deus, pelo cadinho da humilhação. Põe tua confiança em Deus e ele te salvará; orienta bem o teu caminho e espera nele”. (Eclo 2,1-6a).

Portanto, aumentemos a nossa confiança no poder do Altíssimo e no seu amor para conosco, porque o justo, o inocente, vence sempre...

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.



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