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sexta-feira, 30 de novembro de 2007

A compaixão e a felicidade humana

Deu na Adital:
Jung Mo Sung *
Adital -
Na nossa vida sempre encontramos ou cruzamos com pessoas que estão sofrendo por algum motivo. Nestes momentos todos nós somos, de um modo ou outro, tocados pelo sofrimento alheio. Isto se chama compaixão.
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Eu não quero discutir aqui se a expressão "energias negativas" é a melhor para expressar o ambiente como aquele, mas o que eu posso dizer com certeza é que esta pessoa foi tocada pelo sofrimento daquelas pessoas pobres, algumas com crianças pequenas. O fato de ela sentir esta "energia negativa" até mesmo quando estava no conforto e segurança da sua casa (que devia ser muito boa) mostra que ela costumava ser tocada com certa profundidade e não sabia bem como lidar com isto. Mesmo as pessoas mais insensíveis são tocadas pelos sofrimentos de outras pessoas. Uma comprovação disso é que elas reagem de alguma forma a este tipo de contato, mesmo que seja apenas para virar a cabeça. Este virar a cabeça para não ver o rosto de uma pessoa que sofre mostra que foi tocada. Ninguém é completamente insensível ao sofrimento de outras pessoas.
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A diferença entre as pessoas se dá na reação a esta experiência de compaixão. A dor e o sofrimento da outra pessoa me lembra os meus medos, inseguranças e sofrimentos que eu não quero me lembrar. Com isso, eu posso me fechar para a dor do outro para reprimir a minha dor e esquecer dos meus medos e inseguranças; ou então me permitir sentir a compaixão e assim tomar contato com as minhas dores, os meus sofrimentos e medos. É preciso muita força espiritual e também coragem para enfrentar as minhas dores mais fundas. Permanecer na compaixão não revela fraqueza ou de "pieguice" de uma pessoa, pelo contrário, é sinal da sua força emocional e espiritual.
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É por isso que pessoas como Dalai Lama dizem que a felicidade depende da compaixão, e que para desenvolver o sentimento de compaixão precisamos cultivar qualidades como "amor, paciência, tolerância, capacidade de perdoar, humildade e outras" e também "o hábito de uma disciplina interior".
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Compaixão e amor encarnado em ações concretas - que buscam superar situações de opressão, dominação, marginalização, exploração ou exclusão que geram sofrimentos de tanta gente - são elementos fundamentais tanto para uma vida pessoal quanto para uma sociedade mais humana. Não se pode ser feliz sendo insensível a tanto sofrimento e dor.
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Compaixão, responsabilidade e solidariedade são valores fundamentais para salvarmos o mundo e as nossas vidas do cinismo, da indiferença e da desumanização.
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Elie Wiesel nos oferece uma pérola do pensamento talmúdico sobre isto: "A caridade salva da morte. [...] O que é a caridade? Os vivos devem se preocupar com a tristeza ou doença do próximo. Quem não se preocupa não é realmente sensível; quem não é sensível não está realmente vivo. E este é o significado do apelo do shammash: a caridade nos livra de morrer em vida".

[Autor de, entre outros, "Um caminho espiritual para felicidade"].

* Professor de pós-grad. em Ciências da Religião da Univ. Metodista de S. Paulo e autor de Sementes de esperança: a fé em um mundo em crise
Leia na íntegra em
http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=30816

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

Resgatar a Ecologia de São Francisco

Neste tempo de crise ecológica e de muitas preocupações e dúvidas sobre o futuro da vida no Planeta Terra, precisamos, com urgência, resgatar a Ecologia de Francisco de Assis. Não é por nada que São Francisco é o Padroeiro da Ecologia. Antes que a palavra ecologia fosse dita, Francisco já era um verdadeiro ecologista no seu modo de viver e se relacionar com a natureza. Ele era ecologista nas coisas simples como, por exemplo, recolher do caminho os vermezinhos para que não fossem pisados e alimentar as abelhas com mel e vinho para que elas pudessem sobreviver ao inverno. São atitudes simples, que até podem ser vistas com ironia por alguns, mas só é capaz de cuidar da vida e ajudar a proteger o planeta quem tem a sensibilidade de cuidar das menores e mais “insignificantes” criaturas. O apóstolo da Ecologia, Francisco de Assis, “chamava com o nome de irmão todos os animais”. E o seu carinho pelas criaturas era sempre retribuído. As criaturas eram amáveis com ele, como diz na Biografia Segunda de Celano, onde também encontramos sete capítulos que mostram a relação fraterna de Francisco com a natureza.

Entre tantos elementos nos escritos franciscanos sobre ecologia, o que mais nos chama a atenção é o famoso “Cântico do Irmão Sol”, também conhecido como “Louvores das Criaturas”. A primeira impressão que temos é que Francisco louva o Criador com as criaturas, como se ele convidasse as criaturas, suas irmãs todas, a louvar com ele ao Deus Criador. Parece que ele está em plena comunhão com a natureza e com todas as formas de vida. Mas há uma diferença entre nós cantarmos este Cântico hoje e o que o mesmo significou para Francisco naquele momento de sua vida.

Podemos cantar o Cântico do Irmão Sol olhando o sol, a lua e as estrelas que brilham no céu, sentindo o soprar do vento, o perfume das flores e respirando o ar. Podemos cantar sentindo e olhando a beleza, a profundidade e a pureza da água, o vigor do fogo e a vitalidade da mãe e irmã Terra, que nos sustenta com seus frutos, flores e ervas. Francisco, porém, já não via mais nada, naquele momento estava cego, doente, quase morrendo, suportando uma terrível dor. Mas tudo o que cantou em seu Cântico já estava em seu coração. A imagem da integridade das criaturas expressa no Cântico do Irmão Sol já estava no mais profundo de sua alma. Não era apenas o que ele via, mas o que ele aprendeu a viver ao longo da vida e agora vivia em plenitude.

Ao cantar louvores ao Deus Criador, nessa forma, com seu Cântico, de mãos dadas com todas as criaturas, em plena sintonia com a vida, Francisco era um ser reintegrado ao cosmo. E isso expressa sua prática ecológica, uma caminhada progressiva na relação amorosa com as criaturas de Deus. Este Cântico é a expressão de um caminho espiritual-ecológico desde a sua conversão, que culmina numa atmosfera de fraternidade cósmica. O Cântico do Irmão Sol é a alma de São Francisco, que percorreu um caminho de conversão no relacionamento, não somente físico e biológico, mas também espiritual com as criaturas.
Tomar o Cântico do Irmão Sol pode ser uma forma de apreciar sua poesia, mas é também contemplar a alma de Francisco. Este Cântico é sua alma viva em plena sintonia com todas as formas de vida. Ele já não vê apenas um sentido utilitário, mas vê nas criaturas o valor em si de cada uma. Sua visão evoluiu e ele se sente irmão de todas as criaturas. A mãe Terra é para Francisco a irmã Terra, ou seja, ele se sente responsável em cuidar do planeta que sustenta a vida. E isto deve ser aplicado na nossa ecologia. Precisamos resgatar a Ecologia de Francisco e mudarmos o nosso modo de nos relacionarmos com a vida. É preciso saber cuidar da vida nas pequenas coisas, dialogar e aprender com a natureza, respeitando sua alteridade. Temos um caminho espiritual-ecológico a percorrer, um caminho de constante conversão e de reconciliação com a natureza, com todas as formas de vida.

Frei Pilato Pereira
Capuchinho, de Bagé-RS

pilato@capuchinhosrs.org.br
www.capuchinhosrs.org.br/pilato

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