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quinta-feira, 30 de junho de 2011

Igreja e internet: uma relação de amor e ódio

Segundo o jornalista Moisés Sbardelotto, a religião acompanha a evolução da comunicação e “é por ela impelida a algo diferente do que tradicionalmente era”

Por: Patricia Fachin


Embora a Igreja tenha mantido uma relação de amor e ódio com os meios de comunicação e, em especial, com as mídias digitais, é inegável a vivência da fé em ambientes digitais nas últimas décadas. Em uma sociedade em midiatização, explica o jornalista, “o religioso já não pode ser explicado nem entendido sem se levar em conta o papel das mídias” porque elas “não são meros meios de transmissão de informação, nem apenas extensões dos seres humanos, mas sim o ambiente no qual a vida social se move”. Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Sbardelotto enfatiza que a fé praticada nos ambientes digitais “aponta para uma mudança na experiência religiosa do fiel e da manifestação do religioso” e, portanto, que a religião tradicional está mudando. “Junto com o desenvolvimento de um novo meio, como a Internet, vai nascendo também um novo ser humano e, por conseguinte, um novo sagrado e uma nova religião”, constata.

Moisés Sbardelotto abordará o tema desta entrevista no IHU ideias da próxima quinta-feira, 30-06-2011, quando apresentará a dissertação de mestrado intitulada E o Verbo se fez bit: Uma análise de sites católicos brasileiros como ambiente para a experiência religiosa. O evento iniciará às 17h30min, na Sala Ignacio Ellacuría e Companheiros – IHU.

Sbardelotto é mestre em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, na linha de pesquisa Midiatização e Processos Sociais. Atualmente, é coordenador do Escritório da Fundação Ética Mundial no Brasil (Stiftung Weltethos), um programa do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, em São Leopoldo-RS. É bacharel em Comunicação Social – Jornalismo pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Confira a entrevista.

IHU On-Line – Como a Igreja se posicionou diante das novas tecnologias e do uso da internet? 


Moisés Sbardelotto – Pelo que temos visto especialmente nos últimos anos, a Igreja Católica tem mantido uma relação de “amor e ódio” com os meios de comunicação e particularmente com as mídias digitais, tendo estado no centro de inúmeras crises. Nesse processo de reviravolta sociocomunicacional, a Igreja ainda está tateando em busca de um reposicionamento institucional.

Em 2009, em um gesto histórico, o papa enviou uma carta a todos os bispos do mundo, na qual reconheceu que cometera um erro “comunicacional”. Referindo-se ao fato de não ter se informado anteriormente sobre um bispo ultratradicionalista  recém reintegrado à Igreja que havia negado a existência das câmaras de gás durante o Holocausto, Bento XVI afirmou: “Disseram-me que o acompanhar com atenção as notícias ao nosso alcance na internet teria permitido chegar tempestivamente ao conhecimento do problema. Fica-me a lição de que, para o futuro, na Santa Sé, deveremos prestar mais atenção a esta fonte de notícias”. Ou seja, o papa assumiu que bastaria ter dado uma simples “googlada” para saber quem era esse bispo.

Em termos oficiais, no nível da alta esfera, o Vaticano tem publicado documentos que abordam a relação entre a Igreja e as mídias digitais, como, por exemplo, as mensagens por ocasião do Dia Mundial das Comunicações Sociais. A última, do dia 5 de junho de 2011, trata do tema “Verdade, anúncio e autenticidade de vida, na era digital”. Ou seja, essa nova ambiência é uma temática que interroga a Igreja, que se encontra tão enraizada na cultura escrita impressa e nos meios de comunicação de massa, recolhendo ainda os despojos do papado multimidiático de João Paulo II. Nessa mensagem, há um avanço quando se reconhece que “as novas tecnologias estão mudando não só o modo de comunicar, mas também a própria comunicação em si mesma, podendo-se afirmar que estamos perante uma ampla transformação cultural”.

Por outro lado, na mensagem, Bento XVI afirma que “como qualquer outro fruto do engenho humano”, as novas tecnologias da comunicação, se “usadas sabiamente, podem contribuir para satisfazer o desejo de sentido, verdade e unidade que permanece a aspiração mais profunda do ser humano”. Embora reconhecendo o alcance sociocultural das mídias digitais, a Igreja ainda se centra na questão do seu uso – que poderia ser, nesse entendimento, bom ou ruim (no final, o papa diz: “Convido sobretudo os jovens a fazerem bom uso da sua presença no areópago digital”).

A preocupação, no entanto, deveria ir muito além disso. A internet, embora sendo “fruto do engenho humano”, está ligada também a formas e práticas de vida intrínsecas a ela. Como analisa Gordon Graham, novidades tecnológicas como a internet não são positivas apenas por serem novas, nem negativas apenas por serem tecnológicas. Mas também não são neutras: nas mídias digitais online, por exemplo, põe-se de manifesto um determinado tipo de ser humano. Mesmo um “bom uso” traz consigo lógicas que são intrínsecas à técnica. Para exemplificar, na semana passada, a Basílica de São João de Latrão  começou a emprestar iPods a seus peregrinos com um aplicativo projetado especialmente para guiar o visitante junto às obras de arte, à arquitetura e à história do local. A proposta, segundo o padre responsável, seria reduzir o ruído provocado pela visitação de grandes grupos e seus guias, assim como atrair mais os jovens. Cada visitante pode até ouvir as narrações na “voz” de personagens históricos como o próprio imperador Constantino . Mas, no fundo, o que significa atribuir a função de “guia” a um aparelho digital personalizado? São essas lógicas, anteriores ainda a um bom ou mau uso, que merecem reflexão.

IHU On-Line – De que maneira a manifestação religiosa da Igreja e dos fiéis se transformou a partir da utilização da internet?
 
Moisés Sbardelotto – Em uma sociedade em midiatização, o religioso já não pode ser explicado nem entendido sem se levar em conta o papel das mídias. Na transformação cultural de hoje, as mídias organizam e impregnam o social, e passamos a viver em uma realidade sociocultural de permanente comunicação midiatizada. Por isso, as mídias não são meros meios de transmissão de informação, nem apenas extensões dos seres humanos, mas sim o ambiente no qual a vida social se move. Marshall McLuhan  já afirmava que “toda tecnologia gradualmente cria um ambiente humano totalmente novo”, ambientes que “não são envoltórios passivos, mas processos ativos”.

Hoje, o transcendente se digitalizou. E, como o Moisés bíblico, as pessoas sobem a montanha digital porque veem uma sarça ardente em seu topo e buscam a presença de Deus na Internet. Portanto, se as mídias digitais como a internet hoje “viraram um templo”, com tantas ofertas de sagrado disponíveis, cabe analisar como isso aconteceu, que templo-Igreja é esse e que relação fiel/Deus se manifesta em meio a seus bits e pixels.

Exemplo disso é que a experiência da fé – dentre outras diversas manifestações religiosas – pode ser vivenciada na internet por meio de diversos serviços: versões online da Bíblia e de textos sagrados; orientações online com líderes religiosos; pedidos de oração; as chamadas “velas virtuais”; programas religiosos em áudio e vídeo; dentre muitas outras opções. O fiel, onde quer que esteja, quando quer que seja, por meio da internet, desenvolve um novo vínculo com a Igreja e com o transcendental, em um novo ambiente de culto. Isso possibilita uma nova modalidade de revelação e de manifestação de Deus e do sagrado: agora, porém, midiatizada – uma espécie de midioteofania.

A partir desse desvio do olhar do fiel dos templos tradicionais para os novos templos digitais, ocorrem alterações também na formação da identidade individual e religiosa. Cada tecnologia traz consigo uma nova maneira de ser e de fazer. Com o desenvolvimento das tecnologias digitais, características como a digitalidade (o sagrado moldado em bits e pixels), a ubiquidade (o sagrado acessível em qualquer ponto da rede a qualquer momento), a conectividade (conexões/interações em rede entre o sagrado e o fiel e entre fiéis) e a hiperdiscursividade (novas formas de discurso e narrativas sobre o sagrado), dentre outras, manifestam lógicas e processualidades comunicacionais que modificam o ser, o fazer e o experienciar da religião.

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IHU On-Line – Como se dá a interação entre fiel, Igreja e Deus no ambiente digital brasileiro?
Moisés Sbardelotto – São as “ações entre” sistema e fiel que possibilitam a comunicação e a construção de sentido religioso na internet. De outra forma, isso não ocorreria. Na pesquisa, analiso essas interações por meio de três eixos conceituais – interface (as materialidades gráficas dos sítios católicos), discurso (coisa falada e escrita nos sítios católicos) e ritual (operações, atos e práticas do fiel).

Com relação à interface, o sagrado que é acessado pelo fiel passa por diversos níveis de codificação por parte do sistema. Analisamos quatro deles: 1) a tela; 2) periféricos como teclado e mouse; 3) a estrutura organizacional das informações (menus); e 4) a composição gráfica das páginas em que se encontram disponíveis os serviços e rituais católicos. Ou seja, a interação é possibilitada porque o fiel decodifica o sagrado a partir da configuração computacional ofertada pelo sistema. Por meio de instrumentos e aparatos físicos e simbólicos, o fiel “manipula” o sagrado ofertado e organizado pelo sistema e navega pelos seus meandros da forma como preferir. Por meio da interface, o sistema informa ao usuário seus limites e possibilidades, e este comunica ao sistema suas intenções. O sistema indica ao fiel não apenas uma forma de ler o sagrado, mas também uma forma de lidar com o sagrado, que raramente é neutra ou automática: ela carrega consigo sentidos e afeta a mensagem transmitida.

Por outro lado, o contato entre fiel e sagrado passa pelo discurso, pela narração da fé, pela “realidade material de coisa pronunciada ou escrita”, nas palavras de Michel Foucault . Nos sítios brasileiros, esse discurso é construído a partir de três atores: o fiel (o internauta); um “outro” (com quem o fiel dialoga e intercede junto ao sagrado); e um “Outro”, o destinatário último (Deus, Nossa Senhora ou os santos, por exemplo). É por meio do discurso, portanto, que se gera o sentido religioso nos sítios católicos. Nele, é possível perceber virtualmente entidades como o “enunciador” e o “enunciatário” – que estão inscritas e vivem no interior do texto –, assim como as regras para as interações entre eles, já que o discurso não é simplesmente “aquilo que traduz as lutas ou os sistemas de dominação, mas aquilo por que, pelo que se luta, o poder do qual nos queremos apoderar”, como também aponta Foucault.

Por último, o fiel interage com o sagrado por meio de rituais. Até então celebrados no templo físico, eles agora se deslocam para o ambiente online (como, por exemplo, as “velas virtuais”, o “terço virtual”, a “adoração ao Santíssimo”, missas etc.). Por isso, os chamados rituais online são atos e práticas de fé desenvolvidos pelo fiel por meio de ações e operações de construção de sentido em interação com o sistema católico online para a busca de uma experiência religiosa. O ritual online, portanto, esclarece mecanismos e processualidades fundamentais do fenômeno religioso contemporâneo. Tudo isso, analisado mais detalhadamente, estará disponível no Cadernos IHU, n. 35, que sintetiza a pesquisa.

IHU On-Line – Como o religioso pode ser explicado e entendido em uma sociedade em midiatização?
 
Moisés Sbardelotto – O que se constata hoje é um desvio do olhar do fiel dos templos tradicionais para os novos templos digitais, que estimulam, sob novos formatos e protocolos, a experimentação de uma prática religiosa que encontra suas raízes na realidade offline (como o “acender de velas”), mas que agora é ressignificada para o ambiente digital. Existe algo que faz com que o indivíduo prefira praticar a sua fé na internet, em vez de fazer isso na igreja de seu bairro.

Portanto, se a comunicação (suas lógicas, seus dispositivos, suas operações) está em constante evolução, a religião, ao fazer uso dela, também acompanha essa evolução e é por ela impelida a algo diferente do que tradicionalmente era. É essa complexidade da interface entre o fenômeno da comunicação (a partir de suas ocorrências concretas, como o caso da internet) e o fenômeno religioso (a partir da utilização dos dispositivos comunicacionais para a sua ocorrência) que exige maior atenção por parte da Igreja e dos pesquisadores.

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IHU On-Line – Que religião nasce da mídia?


Moisés Sbardelotto – Essa é a pergunta-chave. As respostas são múltiplas, por isso posso dar apenas algumas indicações. O que podemos perceber é que a fé vivenciada, praticada e experienciada nos ambientes digitais aponta para uma mudança na experiência religiosa do fiel e da manifestação do religioso, por meio de novas temporalidades, novas espacialidades, novas materialidades, novas discursividades e novas ritualidades. Assim, a religião como tradicionalmente a conhecemos também está mudando, e a “nova religião” que se descortina diante de nós nesse “odre novo” traz também um “vinho novo”, que caracteriza a midiatização digital (suas formas características de ser, existir, pensar, saber, agir etc. na era digital). Junto com o desenvolvimento de um novo meio, como a internet, vai nascendo também um novo ser humano e, por conseguinte, um novo sagrado e uma nova religião, por meio de algumas microalterações.

Por um lado, temporalmente, os tempos e períodos tradicionais, divididos e organizados pela Igreja liturgicamente e na vida cotidiana, mudam radicalmente na internet. Agora, um ritual religioso (missa, adoração ao Santíssimo, acompanhamento espiritual etc.) pode ser feito a qualquer hora do dia, independentemente dos horários dos demais membros da comunidade religiosa, e em qualquer lugar, em casa, no horário de trabalho, ou mesmo em trânsito, independente da agenda do padre, do religioso ou dos demais fiéis. O sistema se encarrega de mediar essa interação, apesar do tempo offline da vida cotidiana. Os processos lentos, vagarosos e penosos da ascese espiritual (os “séculos dos séculos”, “até que a morte os separe”) vão sendo agora substituídos pela lógica da velocidade absoluta. Passamos, assim, a viver uma fé na expectativa de imediaticidade (tudo deve estar disponível agora, já).

Por outro lado, há um deslocamento espacial da experiência religiosa: a celebração feita do outro lado do país ou do mundo pode ser agora assistida pelo fiel em seu quarto – e é ele quem decide quando a missa vai começar. Um fiel do interior da Amazônia não precisará se deslocar até o Santuário Basílica de Nossa Senhora Aparecida, em São Paulo, para fazer suas orações, prostrar-se diante da imagem e até mesmo acender sua vela, pois, pela Internet, a “capela virtual” acolhe seus pedidos e lhe oferece um vídeo do interior da basílica para venerar a santa pela internet. Assim, instaura-se uma nova forma de presença: uma “telepresença”, como indica Lev Manovich, possibilitada pela produção de presença encarnada nas representações e simulações de sagrado disponíveis no sistema católico online. Mas a essência dessa nova modalidade de presença é a não presença, a “antipresença”. Não é necessário que o fiel esteja lá fisicamente para estar lá digitalmente: o fiel pode agora ver e agir à distância. Essa “bilocação” não se deve à “santidade” do fiel, mas sim à técnica comunicacional, que permite ao fiel esse seu “poder ultraterreno” nessa ambiência digital.

A fé digital

Além disso, a fé digital traz consigo uma materialidade totalmente própria: numérica, de dígitos que podem ser alterados, deletados, recombinados de acordo com a vontade do sistema e/ou do fiel, embora com resquícios de uma religiosidade pré-midiática (como o uso de velas, por exemplo). Assim, a complexidade da técnica não pressupõe o abandono de tradições discursivas.
Porém, elas são ressignificadas: na “capela virtual”, o sol sempre brilha, as flores sempre estão abertas, vivas e coloridas, as velas até se acendem sozinhas, e a cerimônia inicia assim que o fiel entra (adeus, preocupação com o atraso!). Claro, algumas velas digitais também se “consomem” e diminuem de tamanho com o passar dos dias, mas não há mais os “incômodos” da cera derretida, dos vapores e fumaças, dos riscos de incêndio. Mas, hoje, acrescentam-se novas camadas intermediatórias entre fiel e Deus, agora tecnocomunicacionais: computador, teclado, mouse, interfaces, fluxos de interação comunicacional etc. Porém, tudo isso, em geral, passa despercebido pelo fiel, reforçando a transparência da técnica: a sensação de sagrado construída pelo sistema promove (ou reforça) a crença de que o fiel está diante de (e apenas de) Deus. Além disso, a fé digital é vivida com uma sensação de carência: exigem-se sempre novas tecnologias, crescendo a necessidade de ser mediado pela tecnologia comunicacional, até na espiritualidade.

Sentido religioso

Discursivamente, o fiel constrói sentido religioso por meio de narrativas fluidas e hipertextuais, marcadas por uma constante transformação, em que novas informações também podem ser adicionadas, deletadas, corrigidas ou relacionadas segundo os protocolos da internet. Isso acaba abrindo o texto original a inúmeras interpretações em uma hermenêutica infindável de novos sentidos. As relações e vínculos nesse ambiente também são fragmentários, já que o fiel seleciona e escolhe a sua alteridade discursiva (terrena ou divina). O fiel-internauta vive uma experiência de fé com uma ausência objetiva (antipresença) do “outro”, seja ele outra pessoa ou Deus, o que, nem por isso, caracteriza uma fé vivida isolada e individualisticamente, pois ele continua recorrendo a uma comunidade de fé, embora ressignificada. O deslocamento, em suma, dá-se em direção à lógica do acesso, em que o pertencimento-participação em uma comunidade não se estrutura por uma localização geográfica, mas sim por uma ambiência fluida em que só faz parte dela quem a ela tem acesso. E são comunidades instauradas comunicacionalmente: ou, vice-versa, é a interação comunicacional que cria novas comunidades ao tornar comum entre os fiéis aquilo que social, política, existencial e religiosamente é incomum ou não pode nem deve, a seu ver, ficar isolado. Assim, no fundo, há uma lógica do compartilhamento e da publicização: antes, o pedido do fiel era privado, restrito à sua intimidade com Deus. Hoje, é público, é compartilhado com todos, e seu conteúdo é de livre acesso.

Por fim, ritualisticamente, os atos e práticas de fé desenvolvidos pelo fiel por meio de ações e operações de construção de sentido em interação com o sistema constroem-se agora na internet. E novos fluxos começam a surgir, como rituais offline reconstruídos midiaticamente e rituais online que são estendidos midiaticamente para o ambiente offline. Manifesta-se, assim, não apenas uma liturgia assistida pela mídia, mas também uma liturgia centrada, vivida, praticada e experienciada pela mídia, em que esta também oferece modelos para as práticas, o espaço e o imaginário litúrgicos. Instaura-se, em suma, uma nova sacramentalidade. O que fica escondido nos templos territorializados, como o ritual de acender velas, passa a ser exposto e oferecido como o principal ritual religioso das “capelas virtuais”.

A partir da midiatização digital do fenômeno religioso, portanto, vai acontecendo uma metamorfose da fé, somada aos diversos outros âmbitos sociais e históricos que evidenciam esse processo. Ou seja, embora mantendo alguns de seus aspectos tradicionais, produzem-se novas qualidades do religioso. Mas não podemos perder de vista que a hierofania nunca se restringe a um único âmbito do humano. Por meio da midiatização, revelam-se algumas faces desse sagrado, que não se limita a essas manifestações. O sagrado escapa ao midiático. Paralelamente aos ambientes online, continua-se vivendo, praticando e experienciando a fé nos tradicionais espaços de culto, em crescentes tensões e desdobramentos.

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IHU On-Line – E o que a religião em uma sociedade midiatizada revela acerca da mídia?
Moisés Sbardelotto – Estamos em uma nova etapa da comunicação, em que as mídias não são apenas veículos de troca de informações, nem se resumem a instaurar mediações entre âmbitos sociais. Com a convergência tecnológica e midiática, temos um ambiente formado pela comunicação midiática, onde se dão os processos sociais contemporâneos. Existe agora uma cultura atravessada, perpassada, embebida pelas mídias. A partir dessa compreensão, percebe-se que é esse ecossistema midiático que constitui o socius. O conteúdo do fenômeno da midiatização é a convergência das mídias, cada vez mais abrangente, cada vez mais acelerada. Não se trata apenas de um avanço tecnológico, mas sim de uma nova configuração social ampla, que gera novos sentidos em escala complexa e dinâmica, a partir da tecnologia e para além dela.

Analisar a midiatização da religião, portanto, é analisar também um processo de secularização: o processo histórico em que as mídias assumiram muitas das funções sociais que costumavam ser desempenhadas, por exemplo, pela própria religião. Por meio das processualidades da midiatização, a lógica midiática vai subsumindo outras lógicas sociais, em termos de regulação institucional, de conteúdo simbólico e de práticas individuais.

IHU On-Line – Qual o significado da religião em uma sociedade midiatizada? Como ela constrói e gera sentido nesse novo contexto?

Moisés Sbardelotto – Hoje, os fiéis estão fazendo de forma online grande parte daquilo que fazem offline, mas, como dizíamos, fazem isso de uma forma e em um ambiente diferentes, que geram diferença para a religião como a conhecemos. Essas microalterações na vivência da fé não são apenas uma isenta mudança de “forma”, mas sim, em sentido mcluhaniano, uma mudança de “conteúdo”: religião e mídia coevoluem de forma midiatizada, gerando novos predicados.

Em um contexto de aprofundamento das interações sociais via mídia, ganha menos destaque o discurso sobre Deus, e mais o contexto, as circunstâncias específicas, em que as pessoas interagem com Deus: não como as pessoas creem ou devem crer (doxa), mas sim como as pessoas expressam a sua fé (praxis). Hoje, esse contexto da fé é vivenciado na internet, é um o contexto comunicacional construído pela interação entre o fiel e o sistema católico online. No fundo, os fiéis encontram nos protocolos da internet características outras, que são ou não encontradas nos santuários do mundo offline. Uma mídia tão simbólica da pós-modernidade como a internet permeia, mas também altera, a vivência e a experiência de uma fé tradicional, pré-moderna. Não acredito que se dê um processo de substituição de um por outro, mas sim uma justaposição das ofertas religiosas offline e online, a partir daquilo que o mundo digital concede a mais ou a menos, ou de forma mais instantânea, acessível ou disponível do que a religião tradicional.

Raízes agrárias

Nesse sentido, para religiões tradicionais como a Igreja Católica, ainda tão enraizadas em culturas e origens agrárias e pastoris, são necessárias mudanças realmente profundas em seus sistemas simbólicos para que possam ser capazes de responder a todos esses desafios na compreensão de uma nova forma de ver e de viver o “novo mundo” que vai nascendo. Noções como tempo, espaço, comunidade, autoridade, presença, participação etc. – tão centrais ao contexto religioso – vão sendo reconstruídos e readaptados a uma nova configuração social que, por vezes, é combatida pela Igreja e tem sua importância diminuída, como um processo localizado e sem grandes repercussões para as estruturas eclesiais. Porém, esse é um grande engano, já que, a partir das beiradas, uma modificação de fundo vai ocorrendo, para o bem ou para o mal, na configuração das religiões tradicionais.

IHU On-Line – Como vê o incentivo e o estímulo que a Igreja tem dado à relação e ao vínculo do fiel com Deus por meio do ambiente digital?
 
Moisés Sbardelotto – A relação com os meios de comunicação é quase vital à Igreja. Como indicou a Instrução Pastoral Communio et progressio , ainda em 1971, “os modernos meios de comunicação social dão ao homem de hoje novas possibilidades de confronto com a mensagem evangélica”. Para o então Papa Paulo VI, a Igreja “viria a sentir-se culpada diante do seu Senhor” se não lançasse mão dos meios de comunicação. Já para o Papa João Paulo II, na encíclica De Redemptoris Missio , os meios de comunicação social seriam “o primeiro areópago dos tempos modernos”. E aqui, o papa reconhece um ponto importante, já em uma era digital (1990): “A experiência humana como tal se tornou uma experiência vivida através dos mass media”.

Portanto, em nível internacional, começando pelo órgão máximo da Igreja, o Vaticano lançou sua página online ainda nos primórdios da internet, em 1995. O sítio continha apenas o texto da mensagem de Natal do então Papa João Paulo II para aquele ano e um e-mail de contato. Hoje, o sítio oficial da Igreja Católica já está disponível em oito idiomas, incluindo o português e até o latim, língua oficial do Vaticano. Em junho de 2011, foi lançada uma nova interface do sítio com poucas alterações na página de entrada, principalmente, um menu em formato de “calendário maia”, como li em uma crítica. A grande novidade do novo sítio ainda está em construção, que será um serviço de notícias do Vaticano, o News.va . Também houve uma recente ampliação dos serviços prestados pelo sítio, como uma seção de vídeos e a criação de uma “visita virtual” a diversas basílicas vaticanas, além da Capela Sistina e da Necrópole Vaticana.

Além do sítio oficial, o Vaticano também criou outros serviços específicos, como a página Pope2You (pope2you.net), lançada em 2009. A intenção de lançar esse sítio foi o de aproximar os jovens à mensagem de Bento XVI, ou a chamada “geração digital”, conforme palavras do próprio pontífice. Foi uma aproximação, mas nada além disso. Na página, os usuários têm acesso a aplicativos para Facebook, iPhone e iPad, para o recebimento de conteúdos religiosos, além de links para a Jornada Mundial da Juventude e para a página do Vaticano no YouTube. O fiel continua apassivado para o sistema, e precisa encontrar brechas em outros ambientes online, não oficiais, em que dá vazão à sua construção simbólica do religioso.

Tecnologia à “nossa imagem e semelhança”

Porém, é preciso superar, por parte da Igreja, uma imagem das mídias meramente como meios a seu dispor para a difusão de uma mensagem, como se a “influência” da tecnologia sobre nossas vidas fosse só um problema no “modo de usar”. Ao contrário, é necessário compreender que toda a tecnologia – incluindo a comunicacional midiática – não é uma “escrava” a serviço do ser humano, nem mero prolongamento, extensão ou magnificação das capacidades humanas. A tecnologia é nossa “irmã” (como diria São Francisco) e nasce à “nossa imagem e semelhança”, da nossa “costela”, depende de nós. E, por isso, também nos molda poderosamente através de uma coevolução cada vez mais intensa. Como a Igreja, enquanto instituição hierárquica, em sua organização interna, irá reagir ao longo do tempo a uma cultura do compartilhamento, da instantaneidade, das redes, da fluidez de tempo, espaço e vínculos etc.? Acho que o Wikileaks e as revoluções no Oriente Médio são demonstrações mais do que suficientes de que a cultura contemporânea é, em grande parte, o resultado do encontro entre as possibilidades da técnica diante das impossibilidades e limitações da episteme contemporânea (social, política, econômica, mas também religiosa). A tentativa de conjugar e resolver essa tensão será cada vez mais forte.

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IHU On-Line – A virtualização provoca alguma modificação na vivência da fé?


Moisés Sbardelotto – Cremos que apontamos diversos aspectos nas respostas anteriores. Mas a pergunta é válida para debater o conceito de “virtual”, tão disseminado no campo de estudos das mídias digitais. Virtual é um termo que vem do latim (virtus), no sentido de força, potência, virtude. Ou ainda, filosoficamente, é aquilo que não tem efeito atual (“concreto”), que existe somente em potência. Mas essa conceituação não nos possibilita compreender a internet e suas processualidades. A internet pode, sim, ser considerada virtual quando o indivíduo está, por exemplo, descansando no campo, longe de um computador conectado. Nesse momento, ela, para ele, é virtual. Porém, assim que ele a acessa e interage com a rede, ele já a atualiza, a presentifica, poderíamos dizer. Passa-se do virtual ao atual. Por isso, mesmo que a informação da internet esteja “virtualmente presente em cada ponto da rede onde seja pedida”, como afirma Pierre Lévy , ela se atualiza, fisicamente até, em algum lugar (por exemplo nos mais de 7 mil metros quadrados ocupados pelos quase 2 mil servidores do centro de dados do Google na Califórnia, ou nos mais de 65 mil metros quadrados do centro de dados da Microsoft, em Chicago), em determinado momento, em determinado suporte, deixando assim de ser virtual. A internet em sua virtualidade não é do interesse da comunicação, mas sim a atualização do virtual nas interações e processos comunicativos.

Por isso, preferimos usar conceitos como digital ou online (conectado), mas que também não são sinônimos. Digital é a operação computacional que lida com quantidades numéricas ou informações expressas por algarismos (dígitos), com bits, com “cacos” de informação. Mas os fenômenos aos quais nos referimos aqui não são apenas digitais, mas também online, ou seja: o acesso do fiel ao “sagrado digitalizado” se dá por meio da internet, em rede, em qualquer ponto do tempo e do espaço.

Em uma analogia teológica, para se fazer presente na internet, o Verbo se torna informação e faz-se bit. Mas Deus, segundo a tradição cristã, se faz “carne”, para integrar tudo o que é do ser humano: seus órgãos, seus sentidos, a terra que o envolve. E não apenas o seu DNA. Em bits (o DNA da computação), o Verbo fica impossibilitado de assumir o “homem todo inteiro”, segundo Leonardo Boff – assim como o DNA não dá conta de toda a complexidade da “carne”. Portanto, na internet - entre fiel, Igreja e Deus - interpõe-se a técnica comunicacional digital, que reduz a bits, a “cacos”, a experiência multissensorial do sagrado. E “os bits fazem com que a matéria seja mais maleável do que os átomos”, como aponta Kerckhove.

Leia mais...

>> Sobre o tema da midiatização leia também:

    * Midiatização. Um modo de ser em rede comunicacional. Revista IHU On-Line, número 289;
    * Da sociedade dos mídias à sociedade em midiatização;
    * Midiatização traz mudanças no campo religioso;
    * Igrejas neopentecostais nascem com a midiatização;
    * ''O processo de midiatização nos coloca em outra ambiência social''. Entrevista especial com Pedro Gilberto Gomes;
    * Processo de midiatização: da sociedade à Igreja. Entrevista especial com Pedro Gilberto Gomes.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

Os cristãos do futuro: místicos e inter-religiosos

Se "a fidelidade à Bíblia e ao magistério da Igreja não é principalmente uma questão de palavras" – isto é, se a ortopraxia é verdadeiramente mais importante do que a ortodoxia –, então é altamente provável que uma nova definição de uma verdade de fé tradicional, capaz de permitir uma adesão mais profunda ao Evangelho, possa ser considerada como uma "reinterpretação" fiel, ortodoxa, daquela verdade da fé, "independentemente da diferença no plano terminológico". E também independentemente do fato de que essa nova definição possa nascer do diálogo com uma outra tradição religiosa.

A reportagem é de Claudia Fanti, publicada na revista Adista Documenti, nº 52, 27-06-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Está aqui, na "tentativa de distinguir entre uma nova concepção da fé, entendida como reinterpretação, ou, ao contrário, como rejeição da própria fé", que se desenvolve a aventura espiritual do teólogo norte-americano Paul Knitter, um dos maiores representantes da Teologia do Pluralismo Religioso, assim como ele mesmo a relata no livro Senza Buddha non potrei essere cristiano [Sem Buda não poderia ser cristão], recém-publicado pela editora Fazi (Roma, 2011, 320 páginas), a segunda publicação da coleção de livre pesquisa espiritual "Campo dei Fiori", dirigida por Elido Fazi, junto com Vito Mancuso (e inaugurada pela obra-prima do ex-frei dominicano Matthew Fox “In principio era la gioia”).

Trata-se do testemunho pessoal e convincente de quem atravessou a fronteira do budismo para abraçá-lo e depois a atravessou novamente para voltar à própria religião: "O meu diálogo com o budismo – pergunta-se o autor – tornou-se um cristão budista? Ou um budista cristão? Sou um cristão que compreendeu mais profundamente sua própria identidade com a ajuda do budismo? Ou me tornei um budista que ainda conserva vestígios cristãos?".

Na realidade, como o Pe. Luciano Mazzocchi, missionário xaveriano e animador do movimento Vangelo e Zen, enfatiza na “Introdução", "quando duas tradições religiosas se fundem ao ponto de se tornarem a única energia que faz viver, então não há mais filiação alguma. Há apenas o homem que caminha".

E, no caso de Knitter, um homem que, ressalta Mazzocchi, "deu um passo até agora tentado só por poucos: vestido pela sua fé católica, emitiu o voto budista do Bodhisattva, ou seja, prometeu não querer entrar na paz do nirvana até que todos os seres não tenham lá entrado".

O caminho que leva a enriquecer a própria espiritualidade mediante o diálogo com as outras fés é, em sentido, inevitável: "O homem de hoje – continua Mazzocchi – é maior, mais vasto, mais profundo, mais complexo, mais maduro do que as tradicionais respostas religiosas e os sistemas teológicos em que estas foram encaixotadas", chegando a "experimentar a verdade como o seu modo de se relacionar com a alma que tudo pervade", consciente de que nenhuma religião é um ponto de chegada, mas só uma sinalização preciosa "ao longo do caminho da história humana".

É nesse quadro que se coloca a luta interior conduzida por Knitter com relação às "interrogações desconcertantes e desestabilizantes" sobre a natureza de Deus, o papel de Jesus, o significado da salvação: "Acredito realmente naquilo que eu digo acreditar, ou naquilo que eu deveria acreditar como membro da comunidade cristã?".

E é justamente olhando "para além das fronteiras tradicionais do cristianismo" que o teólogo é capaz de encontrar respostas mais satisfatórias e frutíferas às suas perguntas: só depois de ter "começado a levar a sério e a explorar as Escrituras de outras religiões" é que ele foi capaz de compreender mais adequadamente "o que significa a mensagem de Jesus no mundo contemporâneo".

E, entre as religiões, foi o budismo que constituiu um dos dois recursos mais úteis (o outro é a teologia da libertação), que lhe permitiram continuar desenvolvendo a sua tarefa pessoal de cristão e de teólogo, permitindo-lhe rever, reinterpretar e reafirmar as doutrinas cristãs sobre Deus (capítulos 1-3), sobre a vida após a morte (capítulo 4), sobre Cristo como Filho único de Deus e Salvador (capítulo 5), sobre a oração e o culto (capítulo 6) e sobre o compromisso para conduzir o mundo rumo à paz e à justiça do Reino de Deus (capítulo 7), na consciência de que, como admite o teólogo na Conclusão, "no final da jornada, a casa para onde eu volto é Jesus".

E se, olhando para trás, para toda a sua vida, Knitter não consegue se imaginar "como cristão sem esse envolvimento com o budismo", é claro, porém, que a sua "preocupação principal" é que "os genes teológicos que eu transmito sejam ainda cristãos, que a minha reinterpretação do credo cristão, embora verdadeiramente diferente, não seja totalmente diferente daquilo que era antes dela". Que, portanto, "este livro contribua para uma boa teologia cristã".

E, junto com essa preocupação, uma convicção e uma esperança: "Acredito e espero justamente que, se Karl Rahner tem razão ao dizer que os cristãos do futuro deverão ser místicos, eles também deverão ser místicos inter-religiosos".

Para ler mais:
- Extraído de http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=44797 acesso em 29 jun. 2011.
- Prof. Knitter in Salzburg, Austria / Gakuro. -- 2007. -- Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Paulknitter.jpg acesso em 29 jun. 2011.

Blog OFM Moçambique


Blog da Custódia Santa Clara de Moçambique:

terça-feira, 28 de junho de 2011

A GRANDE LUTA ESPIRITUAL CONTRA O MAL













A GRANDE LUTA ESPIRITUAL CONTRA O MAL

Vivemos em meio ao Mistério da vida, somos obra das mãos de Deus, mas não o vemos na mesma dimensão que Ele nos vê, porque a nossa visão de Deus é ainda tênue, ela se dá pelas evidências que Ele nos concede, quer por meio de suas obras (Cf. Rom 1,20); quer pela revelação que faz de Si mesmo em seu Filho, Jesus Cristo (Cf. Jo 14,8-11). Mas, com toda certeza, já é um grande privilégio fazer parte desta obra criada por Deus; e privilégio maior ainda é viver a esperança de vida eterna como recompensa por uma vida vivida sem máculas, fundamentada nas virtudes do Espírito Santo, presente em cada um de nós que o recebemos no batismo.

Sem dúvidas, olhando a nossa humanidade em meio às contradições nas quais se encontra, notamos que há uma batalha espiritual terrível sendo travada a todo instante, onde os maus avançam com tanta intensidade contra os poucos justos que ainda existem que tememos pela prevalência do mal sobre o bem; todavia, sabemos que isso é impossível. Porém, temos de reconhecer, que o inimigo de nossas almas, o demônio, luta noite e dia, dia e noite em todas as frentes de batalhas, usando as armas mais perversas e maliciosas que há no mundo do pecado, ou seja, a mentira, o orgulho, a desobediência, toda espécie de vícios, a violência e as mortes trágicas, a fim de destruir tudo e todos que se reconhecem como filhos e filhas de Deus neste mundo.

Podemos até perguntar, por que o demônio existe e por que temos de lutar contra ele? A minha resposta é: de que lado da batalha nós estamos? Porque respondendo a essa pergunta, obteremos a resposta porque o mal existe e porque temos que lutar contra ele. São Paulo, na segunda carta a São Timóteo, escreveu o seguinte: “Nota bem o seguinte: nos últimos dias haverá um período difícil. Os homens se tornarão egoístas, avarentos, fanfarrões, soberbos, rebeldes aos pais, ingratos, malvados, desalmados, desleais, caluniadores, devassos, cruéis, inimigos dos bons, traidores, insolentes, cegos de orgulho, amigos dos prazeres e não de Deus, ostentarão a aparência de piedade, mas desdenharão a realidade. Dessa gente, afasta-te!”. (2Tim 3,1-5).

Ou seja, Deus nos dar a conhecer a face tenebrosa do “mistério da iniquidade” pelos frutos que essa árvore podre dá, para que possamos vencê-la pelo seu poder divino que habita em nós; pois essa serpente ira, usa as ações humanas deformadas para deformar toda a obra criada por Deus e só quem se mantêm do lado do Senhor, isto é, em comunhão com sua vontade, consegue vencer esse terrível inimigo e seus sequazes.

Então, quais são as armas que nós precisamos para lutar contra tudo o que se levanta contra a Vontade de Deus? A obediência à Palavra de Deus e ao Magistério da Igreja; a penitência, a oração, a vida sacramental e permanência em estado de graça... Desse modo seremos imbatíveis na luta conta o pecado e contra o mal.

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

A VIDA E O DOM DA ORAÇÃO













A VIDA E O DOM DA ORAÇÃO

Deus nos fez na contingência, porém, com alma imortal capaz de conhecê-lo e amá-lo e permanecer imersa Nele; não temos dúvidas de nossos limites, todavia para além do limite que nos cerca, existe o ilimitado divino que nos atrai a todo instante, é por isso que aqui não ficamos por muito tempo, porque nada está parado, mas em movimento constante rumo ao ilimitado de Deus que nos concede todas as graças necessárias para que no dia eterno o encontremos face a Face.

Todavia, enquanto o dia eterno não vem, o Senhor nos concede os seus dons para permanecermos em Sua comunhão, pois, nossas necessidades o atrai assim como nossas virtudes o glorificam e revelam sua presença no meio de nós. Dentre os dons a nós concedidos está o dom da oração; esse dom nos liga permanentemente com a Fonte Inesgotável do Senhor que em seu amor preenche todas as lacunas de nossa existência para que nada nos falta.

Rezar é viver na presença e convivência do Senhor, é viver nossa filiação divina como nos ensinou Jesus: “De manhã, tendo-se levantado muito antes do amanhecer, ele saiu e foi para um lugar deserto, e ali se pôs em oração.” (Mc 1,35). Assim, a oração é ligação direta, é comunhão perfeita, é permanência em Deus, ou seja, é algo mais do que um simples dom, é via de perfeição; seja no falar ou no ouvir, ela é relação filial amorosa, capaz de nos inebriar inteiramente de amor.

Outrossim, a graça nos é dada conforme as necessidades expostas, pois, estamos sempre buscando algo, porém, a maior necessidade que temos é a de Deus e a oração cumpre perfeitamente a função de nos pôr “face a face” com o Senhor de nossa vida, porque Nele temos tudo; é certo que Deus sabe o que precisamos (Cf. Mt 6,8), mas é necessário que tenhamos familiaridade com Ele que é o Pai de nossas almas e o autor e consumador de nossa fé (Cf. Heb 12,1).

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.

sexta-feira, 24 de junho de 2011

FICO PENSANDO...










FICO PENSANDO...

Nasci e nem pensei nisso, porque Deus que me criou, pensou tudo por mim e me amou e me fez assim, todo humano sob sua divina proteção, pois minha inocência lhe pedia por essa sua proteção na simplicidade de meu ser, incapaz por mim mesmo. E o Senhor me deu mãe, e essa me aconchegou no seu ventre, me alimentou, me cobriu, me aqueceu e me fez viver e nunca pensou em matar-me pela crueldade do aborto, porque ao Senhor temeu, uma vez que com Ele cooperou a fim de eu nascesse.

Fico pensando... Meu Deus, eu nada seria se invisivelmente não o tivesse em minha vida, dando-me vida e fazendo-me conhece-lo pela vida a mim dada! Nenhuma existência teria e nem seria capaz de conhecer a existência de tudo o que fizeste além de mim... Por isso estou aqui em busca de Ti, o amor que me criou, porque o teu amor me é preciso para que amor também o seja e Te ame na medida certa e para além dessa medida, e ame todas as tuas criaturas, porque só o amor permanece para sempre...

Ó Amor, infinito Amor que sustentas todas as coisas que criastes; e que mesmo sendo negado por tuas criaturas de comportamentos mal fadados, continuas a acolhe-nos pelo perdão dos pecados a fim de que tenhamos a vida eterna que é só tua. E por teu Filho que nos enviastes, queres ser conhecido, aceito e amado e propagado retamente como Aquele que É e sempre Será e que conosco permanecerá num convívio de eterno amor.

Senhor, quanto tempo falta ainda para restaurares todas as coisas à originalidade impecável de teu propósito divino? É certo que nos redimistes pela cruz de Jesus, mas, Senhor, essa nossa humanidade permanece exacerbadamente mergulhada em pecados cada vez mais horrendos como se tu não existisses e como se tudo que existe fosse criado para um fim trágico...

Senhor, dá-nos uma resposta depressa antes que todos nos percamos definitivamente com tudo o que criastes, pois, sem a tua presença amorosa, tudo o que existe volta a ser nada; porque, de fato, pelos pecados que praticamos nenhum de nós te merecemos.

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


terça-feira, 21 de junho de 2011

POR ISSO FAÇO ESSA MINHA ORAÇÃO















POR ISSO FAÇO ESSA MINHA ORAÇÃO

Senhor livra-nos do mal...
Dá-nos ser constantes em tua graça...
para nunca mais sairmos dela...
Porque sem Ti nada somos...
Nada podemos...
Nada de bom fazemos...

Ó Senhor que a tua força divina nos sustente...
Pois nossa humanidade Te precisa, Te suplica...
Não Te demores mais...
Porque a morte bate toda hora à nossa porta...
Tirando todo nosso sossego...
Por isso o medo, a inquietude, o perigo...
Ó Senhor, o que seria de nós sem a tua Presença aqui?

Por isso, Senhor, te faço essa urgente oração...
Pedindo clemência e perdão para os nossos pecados...
Como Moisés no deserto,
apresenta-nos ao Pai e roga por nós...
Para não pecarmos mais...
Assim viveremos livres do mal...
e das consequências do pecado...
E o teu reinado se estabelecerá para sempre sobre nós...

Por isso, Senhor Jesus, vem...
Acaba com essa agonia e tristeza...
que assola nossa natureza conturbada...
onde o pecado parece reinar...
É por isso que este mundo está um inferno, cercado de perdição...
Cheio de armadilhas e ilusões que muitos teimam cultivar...

Ó Senhor, onde vai parar este mundo do jeito que está indo?
Não deixes que os poucos justos que ainda existem se percam com ele...
Por isso faço essa minha oração...
Sei que ela é insegura...
Mas é devido a amargura de fé vacilante...
Pois é como disseste Senhor:
“Quando vier o Filho do Homem,
acaso achará fé sobre a terra?” (Lc 18,8b).

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


segunda-feira, 20 de junho de 2011

Uma nova classe média sem religião?

Entrevista especial com Jorge Cláudio Ribeiro

Na tentativa de conceituar o que seria a chamada “nova classe média”, o professor Jorge Cláudio Ribeiro, da PUC-SP, percebe que este novo extrato social está se restringindo a fatores ainda referentes à situação anterior. Tem mais renda, mas continua “espiritualmente” o mesmo, podendo fazer mais do que já fazia antes. “O mundo dessas pessoas ainda é pequeno, restrito às preocupações mais imediatas. Por isso, ela é politicamente conservadora, porque não pretende muitas rupturas. É religiosamente também conservadora, no sentido de que ainda mantém os laços religiosos provindos, na sua maioria, de igrejas evangélicas”.

Na entrevista concedida por telefone à IHU On-Line, Jorge Cláudio Ribeiro entende que a Igreja Católica está se sentindo pressionada pela perda de seus fiéis. Sua hipótese é de que as pessoas que recentemente ascenderam para a classe média manterão uma referência religiosa, mas se tornarão pessoas sem religião, “entrando naquele rol dos que são crentes, mas não dentro do catequicismo religioso que aprenderam”.

Graduado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia Nossa Senhora Medianeira, e em Jornalismo pela Universidade de São Paulo, Jorge Cláudio Noel Ribeiro Júnior é mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo e doutor em Ciências Sociais pela mesma instituição. Fez pós-doutorado em Sociologia das Religiões na École des Hautes Études en Sciences Sociales, de Paris, na Unicamp e na Columbia University de Nova York.

É professor livre-docente em Ciências da Religião e professor titular na PUC-SP, onde leciona desde 1976. É autor de vários livros, dentre eles, Sempre Alerta: condições e contradições do trabalho jornalístico (São Paulo: Brasiliense/Olho D’Água, 1994); e Religiosidade Jovem (São Paulo: Loyola e Olho d'Água, 2009).

Recentemente, concluiu no Itesp os créditos de graduação em Teologia iniciados na PUC-Rio. No momento desenvolve mestrado em Teologia no Itesp.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Em primeiro lugar, como poderíamos definir o que seria a chamada nova classe média? Quais seus valores?

Jorge Cláudio Ribeiro – O conceito de classe média não se resume ao nível de renda, simplesmente. Nesse sentido, seria “forçar a barra” chamar esse contingente expressivo – são 30 milhões de pessoas – de classe média, usando apenas o critério da renda. E as classes sociais se definem por outros critérios, como a sua forma de ver o mundo, sua cosmovisão, sua atitude perante a vida, suas memórias, sua história. E esses são fatores um pouco mais qualitativos, que não foram pesquisados. Essa chamada “nova classe média” é nova, mas não é média, pelo menos do jeito como conhecíamos a classe média convencional, que desenvolvia e estimulava o esforço pessoal, que tinha um mundo amplo, tinha escolaridade tradicional na família. A nova classe média parece que está se restringindo, por enquanto, a fatores ainda referentes à situação anterior. Ela tem mais renda, mas continua “espiritualmente” a mesma. Pode fazer mais o que já fazia antes. Não houve ainda uma ruptura muito pronunciada. São pessoas que fizeram um esforço pessoal gigantesco, e que valorizam as realidades mais próximas de si.

O mundo dessas pessoas ainda é pequeno, restrito à família, ao bairro, às suas preocupações mais imediatas. Por isso, ela é politicamente conservadora, porque não pretende muitas rupturas. Ela pretende que a sociedade e o Estado lhe deem mais daquilo que já tem, mas não realidades, propostas e possibilidades diferentes. É religiosamente também conservadora, no sentido de que ainda mantém os laços religiosos provindos, na sua maioria, de igrejas evangélicas. Por isso mesmo são conservadoras também. Vejo isso em alguns alunos meus. Muitos são o primeiro universitário da família. Escolhem a faculdade de grife, mas que não seja muito cara, um curso não muito exigente, mas aquele que foi possível entrar. Muitos não se envolvem com o ambiente universitário, mas querem ter o diploma. Ainda não viram muita efetividade em uma escolaridade maior. Interessante é que muitos não têm ainda segurança nessa nova posição. Estão endividados, não têm perspectiva de futuro muito clara, e os laços anteriores, que são sua rede de sustentação, se mantêm. Essa rede é representada pelos hábitos, pela cultura, pela religião e pelos relacionamentos comunitários do seu bairro.

IHU On-Line – Como o senhor entende a proposta de aproximar a Igreja da nova classe média?

Jorge Cláudio Ribeiro – A Igreja Católica está se sentindo pressionada. Ela está reconhecendo uma situação, que não é de agora, ao perceber cotidianamente a perda de seus fiéis. E não é uma perda geral, mas de fiéis “com cara”, pessoas que têm uma convivência e que, aos poucos, vão abandonando sua paróquia, só vão de vez em quando. Isso dá, para a própria Igreja, uma sensação de serviço que não está sendo adequado ou bem feito. Para a hierarquia dá uma sensação de tristeza, de falta de sentido para o que está se fazendo.

As estatísticas religiosas mostram um contínuo declínio que, de certa forma, foge ao controle da Igreja. Ou seja, é fruto de um movimento histórico, cultural que, a meu ver, é muito mais amplo do que uma pastoral mais ou menos bem feita, com mais ou menos padres cantores, mais ou menos beatos, ou santos, ou milagres. Isso já faz parte do repertório habitual de práticas pastorais das igrejas em geral. O que está acontecendo é que uma realidade que já vem de alguns séculos, está se impondo graças à ciência, à economia.

Hoje, não é necessariamente à religião que se apela primeiramente diante de um problema. Apela-se para outras instâncias. A religião perdeu o prestigio que tinha, perdeu a autoridade de ensinamento que antes possuía. E isso resultou na perda de fiéis, mas não o contrário. Provavelmente, não há muito que fazer com respeito à nova classe média que já tinha saído do catolicismo. Muito dificilmente a pessoa que já passou por duas religiões volta para a primeira.

A nova classe média ainda mantém os laços anteriores, mas certamente esse processo de mudança de estado de vida, de situação, de maior confiança nas próprias possibilidades, pode gerar uma nova atitude religiosa. Se isso acontecer, muito provavelmente elas irão para uma terceira religião. Quando a pessoa muda de estado de vida ela “desencana” do tema religião. Uma das coisas que consolida a pessoa na nova classe média é a escolaridade e muito provavelmente a entrada na universidade.

Com o tempo, essa nova classe média vai buscar formas de escolaridade mais sofisticadas. Com isso, vai gerar uma nova postura frente às religiões. Na prática, a pessoa vai ver que o pastor dela fala errado, e fala coisas que entram em choque com o que aprendeu na escola. Então, surgem necessidades novas que a religião nem sequer percebe. Minha hipótese é que essas pessoas manterão uma referência religiosa, aos poucos frequentarão menos a sua religião, e se tornarão pessoas sem religião, entrando naquele rol dos que são crentes, mas não dentro do catequicismo religioso que aprenderam. Eu pessoalmente acho isso bom, mas sou um pouco secularizado. Pode ser que não seja bom, que as pessoas percam suas raízes. Há essa possibilidade de que as pessoas enlouqueçam, entrem nas drogas. Mas acho que não é desse jeito que funciona.

IHU On-Line – Quais os anseios dos jovens de classe média hoje que poderiam ser atendidos pelo âmbito religioso?

Jorge Cláudio Ribeiro – Meus alunos são de uma universidade particular, razoavelmente cara, tradicional, e eles não são nova classe média. Pelo contrário, são tipicamente classe média. E pela minha pesquisa, que se desenvolveu na PUC-SP, o que percebemos é que entre as questões que mais interessam aos jovens na faixa de 17, 18 anos, é, primeiro, a família; segundo, os amigos; terceiro, o ingresso na universidade; em penúltimo lugar a política, e em último lugar as religiões. A questão que eles dão menos importância é que a religião deles é a única verdadeira, o que significa que, para eles, há outras fontes de verdade que não só a religião e não só a religião dele ou dela.

Pode ser que esses meus alunos de classe média consolidada mostrem uma tendência do futuro perfil espiritual e religioso da nova classe média. Mas isso é questionável. Outra coisa interessante é que a maioria das pessoas dessa nova classe média é de mulheres. As mulheres, por uma série de fatores históricos, psicológicos, têm uma abertura maior para os aspectos religiosos. Pode ser que ainda se mantenha, em grande parte, o teor religioso, mas não necessariamente formal, convencional, mas uma forma de religiosidade mais livre, graças às mulheres das novas classes médias que estão surgindo.

IHU On-Line – O senhor acredita que a ascensão social de milhares de brasileiros enfraquecerá as religiões neopentecostais?

Jorge Cláudio Ribeiro – Sim, porque essas religiões deveram seu sucesso a uma pauta de prosperidade, de religião individualizada, ligada ao pequeno grupo. Na medida em que a pessoa, até graças à religião, atinja esse patamar, ela vai querer mais da vida, terá mais exigências de tipo ético, litúrgico, buscará algo mais racional que do simplesmente acreditar no seu líder, seu pastor ou padre. O novo mundo vai se alargar, com acesso a viagens, ao consumo, e isso trará questões para as quais a religião anterior não estava aparelhada.

IHU On-Line – Como conciliar, no mesmo discurso, os preceitos da Igreja e a valorização do consumo?

Jorge Cláudio Ribeiro – Não sei. Não sou bispo! Embora a Igreja Católica tenha um nível de consumo altíssimo, já que a Igreja é muito rica, ela faz outro tipo de consumo. O Vaticano e as congregações religiosas não têm um consumo de tipo individual, ostentatório, mas têm uma riqueza inegável. Ninguém reúne um bilhão de pessoas sem ter que gastar ou investir muito dinheiro para isso. Talvez a Igreja Católica quis estar nesse ambiente de consumo, mas a médio e longo prazo, e não a curto prazo que, no fundo, é algo meio suicida, meio burro, e aqui falo como alguém da classe média antiga.

A acumulação de cultura – e a Igreja Católica tem uma competência antiga na área da educação – poderia abrir para um tipo de ensino que é de boa qualidade, mas voltado para as classes populares ou classes médias, que teriam interesse. A pessoa consome de forma ostentatória porque só vê isso. Se ela, porém, tiver outras oportunidades ou o ensino que não seja convencional, ela poderá mudar de postura. E a Igreja Católica terá o que oferecer para a sociedade. Por outro lado, os jornalistas que tratam da Igreja Católica têm que desencanar um pouco da ideia de que a Igreja está perdendo fiéis. A Igreja tem que prestar um serviço que não está prestando tão bem como em outras épocas.

IHU On-Line – Qual deve ser o papel da comunicação e do jornalismo nesse debate?

Jorge Cláudio Ribeiro – Os jornalistas deveriam se informar mais. Tradicionalmente, o jornalismo, como classe profissional dotada de certa cultura, é cético. A obrigação dele é ser cético, é duvidar, perguntar, não pode se restringir ao papel de “moleque de recados”. O jornalista não transmite simplesmente, ele tem que questionar. Esse ethos cético impacta com o ethos crente das religiões. Então, os jornalistas não gostam muito das religiões. Mas não têm que gostar ou desgostar. Trata-se de uma realidade social, que deve ser levada em conta. Há um alto índice de pessoas que se dizem ateias no curso de jornalismo, mas pelo menos tinham que ter um respeito maior e isso implica conhecimento. Muitas vezes sou entrevistado e o jornalista não tem preparo nenhum nessa área. É preciso buscar as raízes profundas do tema. Os jornalistas precisavam ser como os médicos, ter estudo permanente e o material com que eles trabalham no seu cotidiano nem sempre permite esse aprofundamento, porque num dia ele está fazendo uma coisa e no outro dia está fazendo outra. É saudável que o jornalista não acredite em tudo, não seja uma pessoa crente como profissional – como pessoa ele faz o que quiser. Mas tem que ser uma pessoa duvidadora, com dúvidas bem fundamentadas por estudo e conhecimento.

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