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sábado, 24 de agosto de 2013

O Franciscanismo das Fontes Franciscanas

Frei Dorvalino Fassini, OFM
A história das Fontes Franciscanas (FF), dentro da Ordem, assemelha-se muito com a história da Sagrada Escritura dentro da Igreja Católica. Assim como essa, também aquelas estiveram ausentes, para não dizer excluídasm, na inspiração da formação, das atividades e da vida dos frades e da história da Ordem durante quase cinco séculos. Enquanto vivia era ele, Francisco, quem com seus gestos, atitudes, modo de ser e com suas palavras, escritas e faladas, orientava e formava os Irmãos ao ponto da tradição da Ordem denominá-lo com a expressiva qualificação de “forma minorum”, isto é a “forma”, a “inspiração”, o “princípio”, o “formador dos menores”. Não podemos ignorar, porém, segundo testemunho dele mesmo, que a origem de toda essa novidade de vida evangélica – toda essa “forma minorum” - inaugurada por ele se assentava em dois encontros inesquecíveis e misteriosos.
O primeiro, deu-se no auge de sua crise existencial, na igrejinha de São Damião, quando o próprio Cristo Crucificado lhe apareceu e falou com toda a benignidade e compaixão: “Francisco, não vês que minha casa está se destruindo. Vai, pois e restaura-a para mim”. A partir de então, a Paixão do Senhor passou a ser sua luz, sua paixão e o novo sentido – o Tudo - de sua vida. O segundo encontro deu-se pouco tempo depois, na igrejinha da Porciúncula. Dessa vez o Senhor o visita, ilumina e transforma através de sua Palavra, mais precisamente, com o Evangelho do Envio dos Apóstolos: que os discípulos enviados a pregar não deviam levar pelo caminho nem ouro, nem prata, nem sacola, nem alforge, nem pão, nem bastão e nem tenham calçados e nem duas túnicas (LTC 25). A partir de então, viver como os apóstolos viveram, isto é, indo pelo mundo na extrema pobreza, sem nada de próprio para tão somente testemunhar o Evangelho, passou a ser o sentido de sua vida e da vida de todos quantos quisessem segui-lo. Após sua morte, para que o poder ou espírito formador do Cristo crucificado e do Evangelho do Envio dos Apóstolos que envolvera o seráfico pai pudesse perdurar pelos séculos afora, os frades se apressaram não apenas em fazer o maior número possível de cópias dos Escritos dele e espalhá-las entre as fraternidades, mas também em redigir as famosas Legendas ou biografias do Santo. Nasciam assim aquelas que hoje são conhecidas como Fontes Franciscanas. Assim, até mais ou menos o fim do segundo século franciscano, isto é, 1400, era nesses escritos que a Ordem buscava a fidelidade de sua vocação nas mais diversas situações de sua vida e de suas atividades. Se enquanto vivera, o próprio Francisco era a “forma minorum” dos frades agora quem desempenhava essa função eram as Fontes Franciscanas. A insistência de que foram escritas para a edificação (inspiração, formação) dos frades é uma constante em quase todas elas. Infelizmente, essa bela prática aos poucos entrou em desuso e a Ordem começou a orientar-se e conduzir-se (formar-se) por outras luzes, vindas de fora, principalmente da Cúria romana. Assim, aos poucos, os franciscanos tivemos de nos contentar com um Franciscanismo desfigurado e poluído pela ascética, pela moral, pelo Direito canônico e por outras teologias e espiritualidades. A Ordem, enfim, foi “usada” para outros fins diferentes para os quais ela nascera. Quando nós entramos na Ordem, por exemplo, na década de 50 do século passado, fizemos a profissão, emitimos os votos sem mesmo jamais termos lido ou estudado a Regra franciscana, muito menos qualquer outro escrito das FF. Com a busca de uma renovação a partir do espírito originário dos fundadores proposta pelo Concílio Vaticano II, felizmente, aqueles escritos foram sendo redescobertos, traduzidos e entregues a todos os franciscanos. Pode-se dizer, sem medo de errar, que as Fontes Franciscanas passaram a se constituir na “Bíblia Franciscana”. Vale para elas o que Bento XVI diz da redescoberta da Sagrada Escritura para os cristãos (VD 1): que elas venham a se constituir em fonte de constante renovação, com a esperança de que se tornem cada vez mais aquilo que são: o coração de toda a vida e de toda a atividade de todos os franciscanos. Na década de 1970, o espírito originário que transformara Francisco em novo homem, em novo cristão, e pulsante nas Fontes Franciscanas, começa a encantar alguns franciscanos que se põem numa busca apaixonada do Franciscanismo das Fontes Franciscanas. Assim, o Franciscanismo desfigurado e poluído, vindo de fora da Ordem e que alimentou os frades durante séculos, começa a ceder lugar ao Franciscanismo originário, limpo, puro testemunhado pelos Escritos de São Francisco e de suas Legendas e começa a nascer, aqui e acolá, Uma Formação Nascida e Conduzida Direta e Imediatamente das Fontes Franciscanas, liberta de outras influências e espiritualidades. Em louvor de Cristo, senhor nosso, Amém!

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