Introdução
O
século XIV assinala para as Clarissas, assim como para os franciscanos,
um período de queda no fervor e na observância inicial. Crescendo o
número de Irmãs, cresceram também as posses e vendas acumuladas pelas
doações de generosos benfeitores e pelos dotes. Passaram a existir
condescendências fáceis para o luxo, recorrendo-se mesmo às dispensas
pontifícias da vivência da pobreza.
Facilmente eram admitidas nos mosteiros damas nobres, que por motivos
interesseiros, não eram modelos de virtudes, mas até mesmo pedra de
escândalo para as Irmãs simples. Essas damas da nobreza procuravam
conseguir rodear-se de pompas e de criadagem dentro dos claustros,
obtendo privilégios papais, contrariando assim expressamente o que
dispunha Santa Clara na sua Regra. Com o cisma do Ocidente, em que três
papas dirigiam a Igreja ao mesmo tempo, e a confusão reinara, a situação
piorou seriamente. A Clausura, que por bula de Bonifácio VIII, em 1298,
(“Periculoso”) havia se convertido em lei universal para todos os
mosteiros femininos, mas que por motivos diversos deixava-se de observar
com freqüência, deu ocasião a numerosas intervenções dos visitadores e
alguma vez da própria Santa Sé.
Visão da Beata Clara de Rimini |
Os Estatutos de Benedito XII, em 1336, trataram de por fim aos abusos,
com uma reorganização da vida religiosa, segundo formas mais
acentuadamente monacais. Porém, a decadência era visível e aumentava.
Naquilo que toca a Ordem de Santa Clara, com a independência dos
mosteiros entre si, não se pode falar de uma decadência simultânea nem
universal. Não faltaram exemplos de santidade, ainda que raros no século
XIV: a Bem-aventurada Matia de Matélica (1253-1319)). a Bem-aventurada
Clara de Rímini (+1326) e a Bem-aventurada Petronila de Troyes (+1355)
comprovam isto. Além disso, a aspiração de Santa Clara de ver suas
filhas sendo orientadas e ajudadas pelos frades Menores ia aos poucos se
realizando. Os Provinciais foram aos poucos assumindo o cuidado das
Clarissas em diversas regiões. Além do recurso ordinário às visitas
canônicas houve, sobretudo a partir da segunda metade do século XIV
visitadores apostólicos extraordinários, alguns encarregados de reformar
mosteiros em algumas regiões. Esse foi o caso dos mosteiros de
Clarissas no reino de Castela, por exemplo, entre os anos de 1373-1376.
Quatro franciscanos foram encarregados de visitá-los e reformá-los.
Também
a excessiva duração dos cargos tornou-se prejudicial nesta época de
decadência do espírito primitivo da Ordem. Clara não limita o tempo de
governo da abadessa, mas dispôs que quando j não fosse idônea para o
serviço e atividade das Irmãs, estas a depusessem e elegessem outra.
Esse recurso jurídico não era de fácil aplicação. Em 1405, o Papa
Inocêncio VII declarou que as abadessa não fossem vitalícias, mas
eleitas a cada dez anos. Mais tarde o tempo foi reduzido a três anos.
Entretanto, continuaram a existir mosteiros onde a abadessa continuava a
ser vitalícia.
As reformas e os remédios não poderiam vir de fora. A verdadeira
reforma vem sempre de dentro, do contato com o verdadeiro espírito que
move a vivência evangélica. Senão, quando muito podem sustentar a
observância exata das prescrições e evitar abusos, mas são vazios de
idealismo.
A Ordem de Santa Clara, que desde o princípio representou um novo
princípio de vida evangélica, sofreu com as estruturas impostas de fora.
Mas os ideais da Regra própria de Santa Clara serviram sempre como
fermento renovador. Numerosas clarissas fizeram a experiência de amar e
de atualizar em sua época o seu ideal. Essas reformas nasceram de
dentro. Outras surgiram a partir de fora, da parte da Igreja ou dos
Frades, mas foram acolhidas como bênção e realização de esperanças.
Estudaremos as grandes reformas da Ordem surgidas nos séculos XV e XVI.
Ao renovar-se o ideal, abriu-se o caminho para a restauração da
regularidade, da vida comum, da clausura, da oração, da sororidade e da
dimensão penitencial, com um novo espírito, radicado em Clara - a
fundadora - mas que recebeu característica peculiares, segundo a época e
os lugares, das diversas reformadoras ou reformadores.
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