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sábado, 13 de novembro de 2010

O desafio de conciliar ecologia e fé

Nós podemos mudar. Mais que o tema do Seminário sobre questões climáticas e a vida no planeta que ocorreu nesta sexta-feira, em Porto Alegre, a frase retrata a esperança dos que querem ser multiplicadores do amor e do respeito ao planeta. Pessoas de todo o Estado aprenderam que não basta olhar o Governo tratar das questões ambientais, mas é preciso trazê-las para dentro das igrejas, da espiritualidade, da vida da sociedade. O seminário marcou o fim da Semana da Solidariedade e o início das comemorações do Ano Jubilar da Cáritas RS, que completará 50 anos em 2011.

O salão de eventos da Igreja Nossa Senhora do Rosário da Pompéia, localizado em uma movimentada rua da capital gaúcha, ficou tomado de estandes com amostras de trabalhos realizados pelas Cáritas espalhadas pelo Estado. Nas paredes, vários cartazes da Semana da Solidariedade que traz a imagem dos olhos de uma criança e a pergunta: “Qual o nosso olhar?”.





“Eu vii a opressão do meu povo no Egito, ouvi os gritos de aflição diante dos opressores e tomei conhecimento dos seus sofrimentos”.
Esse foi o trecho bíblico escolhido para guiar as reflexões ao longo do Seminário, que também contou com momentos de música e descontração. Após a oração inicial, foi apresentado um apanhado histórico sobre a Cáritas no Estado. Figuras importantes nessa caminhada, como Dom Helder Câmara e Dom Ivo Lorscheiter, não foram esquecidos. Durante a tarde, foram realizadas quatro oficinas que tiveram como tema o desenvolvimento sustentável.

Entretanto, a principal atividade do dia foi a palestra do monge beneditino Marcelo Barros. Teólogo e biblista, Barros trabalha a junção entre ecologia e espiritualidade. A religiosa Lourdes Dill saiu com outras cinco companheiras às 3h30min para chegar a Porto Alegre a tempo de escutar o monge. “Ele é um profeta”, resumiu. Há mais de 25 anos, Lourdes atua na Cáritas, promovendo ações de inclusão social e economia solidária, principalmente junto aos catadores de lixo da região Central do RS. Para ela, a Cáritas é uma peça fundamental na caminhada da Igreja no Rio Grande do Sul.

Caty Griebeler, 70 anos, é moradora de Porto Alegre e trabalha na Pastoral da Educação. Durante o seminário desta sexta-feira, ela procurava mais subsídios para falar sobre ecologia com educadores e estudantes. “É um tema sempre presente na sala de aula. A próxima Campanha da Fraternidade será um desafio para nós”, afirmou. A CF 2011 tem como tema Fraternidade e a vida do planeta.

Há 18 anos, Cláudio Roberto Schaab participa da Cáritas da Diocese de Novo Hamburgo e ajudou a levar o trabalho a 37 paróquias. Ao longo desses anos, Cláudio viu nascerem oito empreendimentos solidários, que hoje geram emprego e renda. Ele acompanhou também a inclusão das questões ambientais na pauta da Cáritas. O voluntário não escondia a tristeza ao falar sobre a nova mortandade de peixes no Rio do Sinos, preocupação presente na Cáritas da região de Novo Hamburgo. “Viemos aqui buscar novas forças”, afirmou, antes de acompanhar a palestra de Marcelo Barros.

Odete Silveira saiu de Passo Fundo para comparecer ao evento na capital. Ela e algumas companheiras não abriram mão de rezar pelos próximos 50 anos da Cáritas. “Queremos continuar com esse espírito alegre, de caminhada e partilha.” A Cáritas tinha apenas oito anos de existência no Rio Grande do Sul quando Ivo Guizardi começou a participar. Há 42 anos, ele atua como voluntário. “Estou aqui para celebrar este grande feito da Igreja e do homem.”

Integrantes da Cáritas de Bagé acabaram se perdendo e rodaram por mais de uma hora em Porto Alegre até encontrar o local do seminário. “Estamos firmando um compromisso com as questões climáticas. Precisamos cuidar da terra, das pessoas, da vida”, disse Nilzamar de Macedo.

O sistema atual de desenvolvimento é insustentável

Marcelo Barros tem um tom de voz suave, uma tranquilidade característica do povo do norte do país. Entretanto, quando começa a falar sobre o descaso que o povo tem com o meio ambiente, muda de feição e as palavras ganham contundência. Muitos dos que ali estavam o chamavam de “companheiro de muitas lutas”. “Pelos pobres, pelos desfavorecidos, pela terra, pela vida”, afirmou a assessora da Cáritas Brasileira – Regional do Rio Grande do Sul, Loiva de Oliveira, ao apresentá-lo.

Era madrugada quando o avião do religioso pousou em solo gaúcho. Após descansar durante algumas poucas horas, ele se dirigiu ao salão de eventos da Igreja Nossa Senhora do Rosário da Pompéia. Ao meio-dia, embarcaria para São Paulo, sendo que, na próxima semana, passará também por Brasília e Argentina, onde tem vários compromissos, para só depois retornar ao Recife.

Segundo Barros, medidas técnicas e políticas precisam ser tomadas em relação ao meio ambiente. Entretanto, o mais importante é que a sociedade modifique sua forma de lidar com a natureza. “Caso contrário, todas as ações serão paliativas.” O monge deixou a plateia impressionada quando afirmou que a Terra já perdeu a capacidade que tinha de se regenerar. “A lógica do capitalismo assassina o povo e o meio ambiente.”

Religiões como o budismo e o hinduísmo, de acordo com Barros, sempre defenderam a vida. Porém, a Igreja Católica tem uma dívida grande com o meio ambiente. “A ecologia não pode ser tratada como apêndice. Tem de ser algo fundamental, central da fé”, disse. “Qual carta papal fala sobre ecologia? Há apenas um parágrafo ou outro, sempre de um jeito marginal. Acaba a Campanha da Fraternidade e o meio ambiente é esquecido” completou.

Para o monge, a situação é mais preocupante do que se imagina. “Precisamos mudar. O sistema atual de desenvolvimento é insustentável. A terra sobrevive sem o homem. O homem não sobrevive sem a terra.”

Extraído de http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=38306 acesso em 13 nov. 2010.

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