QUANDO E COMO OUVIMOS A VOZ DE DEUS?
Na verdade é preciso primeiro perguntar: o que é
um ouvido cioso? É aquele que sempre escuta atentamente e não perde nada do que
se lhe é comunicado; digamos melhor, é uma espécie de ouvinte permanente que
nunca esquece o que ouve, e por isso mesmo, guarda no seu coração tudo o que
lhe é revelado (Cf. Lc 2,51); porque, para nós que esperamos em Deus, tudo é
revelação, pois nada conhecemos plenamente, visto que o saber intelectual é um
apreender a partir da realidade que nos cerca e que fazemos parte dela, mas só
a conhecemos parcialmente e nunca a sua essência, ela mesma; pois o mistério criador
a envolve e a guarda como que a nos dizer: cabe a mim somente a mim conhece-la
e revelá-la a quem me apraz...
Ouvir a Deus, então, é comungar perfeitamente com
a sua Vontade que Ele mesmo se nos revela nas Sagradas Escrituras e em Seu
Filho Jesus Cristo que é o Ápice da Revelação e ainda nos santos e santas que,
conduzidos por Seu Espírito, seguiram Jesus em tudo e se conformaram a Ele
neste mundo pelo exemplo de vida. Assim, o cristão é aquele que vive em Cristo
e interage constantemente com Ele, com o Pai e o Espírito Santo, formando a
unidade da Igreja, seu Corpo Místico, do qual Ele é a Cabeça e nós somos os
membros. (Cf. Col 1,18).
As vias de comunicação nossa com Deus e de Deus
conosco são os Sacramentos, a oração, a vivência das virtudes e as obras que
Deus de antemão preparou para que nós as praticássemos (Cf. Ef 2,10); porque
são essas graças que fundamentam nossa comunhão com o Senhor e nos levam a dar
o testemunho verdadeiro de que somos seus filhos e filhas.
Pelos Sacramentos Deus nos gera na fé e nos faz
viver Nele pela fé enquanto estivermos neste mundo, pois Sacramento é sinal
sagrado onde Deus opera diretamente realizando a sua obra de restauração de
toda a humanidade. Quem vive intensamente a vida sacramental é perseverante em
tudo o que faz, porque vive da fé (Cf. Hab 2,3), conduzido pelo Espírito Santo,
ou seja, ouve e segue a Cristo pela vivência sacramental.
Já a oração é uma via de mão dupla na interação
com Deus. Por ela falamos com o Senhor e o ouvimos e com Ele interagimos como o
fez Jesus, seu Filho Amado (Cf. Jo 11,41-42). E o melhor desse dom é que
podemos usá-lo em qualquer lugar ou a qualquer momento sem restrição alguma, desde
que observemos o que o Senhor Jesus nos ensinou: “Quando orares, entra no teu
quarto (coração), fecha a porta e ora ao teu Pai em segredo; e teu Pai, que vê
num lugar oculto, recompensar-te-á”. (Mt 6,6). Aliás, São Paulo, também nos
ensinou essa verdade, quando escreveu: “Orai sem cessar” (1Tess 5,17).
Quanto à prática das virtudes? Estas são a escada
que nos leva ao céu, pois de dons, são transformadas em atributos divinos pelos
quais atingimos o cume da perfeição, visto que são as propriedades essenciais
que santificam nossas almas. Um dom pode ser praticado ou não; quando praticado
se torna atributo, isto é, próprio do ser, porque nunca lhe será tirado. Assim,
por exemplo, temos o dom de amar; quando amamos perfeitamente pelo Espírito
Santo, o próprio amor nos leva ao infinito dele mesmo nos tornando amor
plenamente.
E as boas obras, como ouvimos o Senhor por elas? Ora,
o servo só faz o que o seu Senhor manda; por elas obedecemos a Deus prontamente
com o coração em festa, porque praticamos o que mais agrada a Deus numa alma
piedosa. Pelas boas obras, além da obediência perfeita, cooperamos com a
implantação do Reino dos Céus já aqui na terra. Quem faz o bem que Deus lhe dá,
este testemunha que Deus está presente no bem feito, por isso, não fica sem
recompensa, porque já o experimenta em si mesmo. Portanto, “Não nos cansemos de
fazer o bem, porque a seu tempo colheremos, se não relaxarmos. Por isso,
enquanto temos tempo, façamos o bem a todos os homens, mas particularmente aos
irmãos na fé”. (Gal 6,9-10).
Destarte, assim diz o Senhor: “Eis o meu Filho
muito amado, em quem pus toda minha afeição; escutai o que ele diz”. (Mt 17,5).
Naquele tempo disse Jesus: “Em verdade, em verdade
vos digo: vem a hora, e já está aí, em que os mortos ouvirão a voz do Filho de
Deus; e os que a ouvirem viverão. Pois como o Pai tem a vida em si mesmo, assim
também deu ao Filho o ter a vida em si mesmo, e lhe conferiu o poder de julgar,
porque é o Filho do Homem. Não vos maravilheis disso, porque vem a hora em que
todos os que se acham nos sepulcros sairão deles ao som de sua voz: os que
praticaram o bem irão para a ressurreição da vida, e aqueles que praticaram o
mal ressuscitarão para serem condenados. De mim mesmo não posso fazer coisa
alguma. Julgo como ouço; e o meu julgamento é justo, porque não busco a minha
vontade, mas a vontade daquele que me enviou”. (Jo 5,25-30).
Paz e Bem!
Frei Fernando,OFMConv.
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