O fascinante de Francisco é a sua capacidade de ter reinterpretado a mensagem do Evangelho para as pessoas humildes como uma mensagem libertadora. Não o faz com explicações complicadas e profundas sobre a essência deste Jesus de Nazaré, mas sim, simplesmente, à base das suas ações. Pois não entra em discussões teológicas sobre o significado da encarnação de Deus em Jesus. Se Jesus, o Filho do Homem, é totalmente homem com um carisma especial de união divina, ou o Filho de Deus, que também na sua vida terrestre até à Crucificação e até à morte ficou sempre Deus. Esta foi a disputa teológica durante séculos. E quanto mais Jesus foi divinificado, tanto mais se podia praticar na Igreja uma veneração que pouco tinha que ver com as necessidades concretas das pessoas. Via-se só o Jesus sublimado, o pantocrátor, muito longe dos baixos níveis dos homens. Podia-se venerá-Lo, sem que isso tivesse conseqüências sociais.
Francisco, no entanto, redescobriu em Jesus o Deus humilde que renuncia a tudo, o Jesus de Nazaré, que se dedicava a todas as misérias humanas. Concretamente encontra-O no rosto desfigurado do leproso. E, a partir daí, tenta simplesmente fazer o mesmo que este Jesus de Nazaré humilde e amante dedicando-se aos pobres e aos marginalizados. Imitar Jesus, seguir as Suas pegadas, assim pregou a mensagem libertadora do Evangelho.
E quanto maior foi a semelhança com este Jesus, tanto mais brilhante ficou a mensagem. Um Deus que ama, que se faz homem como nós, que prescinde de todo o domínio, que se dedica aos pobres e aos necessitados, que não quer impor pesos a eles, não faz dos homens objetos. Quer um seguimento voluntário, quer dizer, homens livres, que não queiram cultivar o seu “ego”, através do domínio de outros. Em todas as partes onde os homens convertem outros em objetos, os mesmos são escravos “da ânsia de querer possuir e dominar.” E esta é a raiz de todas as catástrofes no mundo, o antagonismo entre pobres e ricos, entre os que sabem e os que não sabem, entre preservar e explorar a Criação.
Por isso, Francisco não quer ter nada, não quer superiores nem diferentes níveis na sua fraternidade. Somos todos irmãos e irmãs, com a mesma dignidade humana, só com diferentes tarefas e obrigações. Só tal compreensão franciscana da relação entre os diferentes homens, entre os diferentes sujeitos, em vez de atitudes dominantes para como o outro como objeto dominado, faz possível uma relação humana que corresponda à dignidade do homem e da Criação de Deus. Sociedades de classes com poucos ricos e poderosos e a grande massa de dependentes e pobres não podem ser aceites conforme esta compreensão franciscana dos homens e do mundo. O mesmo é válido para a ânsia de domínio sobre os objetos. Só se o pão de cada dia não for considerado como posse, mas sim como um dádiva e uma oferta para a vida, todos poderão participar no mesmo. Só se conseguirmos canalizar as próprias necessidades de maneira que todos os outros também tenham o suficiente, e se organizarmos as nossas relações com os homens e as coisas realmente sem querermos dominá-los, então poderemos encontrar o caminho para superar as pequenas crises e catástrofes do nosso mundo global. Isto continua sendo uma mensagem essencial do carisma franciscano.
Francisco com a sua vida exemplificou que isto é possível e como isto é possível. É simplesmente o irmão Francisco unido com tudo o que é vivo sem querer possuir ou dominar. E viveu isto de tal maneira, tão simples- e tão convictamente que não nos poderemos pasmar da sua grandeza tão superiora a nós. Nós, os pequenos descendentes, não devemos admirá-lo, mas sim aprender com ele. É possível criar um mundo diferente, nas pequenas coisas do dia-a-dia, como Francisco nos ensinou. Só se tentarmos isso, o jubileu faz sentido.
Andreas Müller OFM
Extraído de http://www.ccfmc.net/wPortugues/cbcmf/cbcmf-news/2008/2008_11_News.shtml acesso em 2 Dez. 2008.
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