Há questões candentes que afetam a Igreja e que, nas palavras do cardeal Carlo Maria Martini, não podem esperar mais e devem ser abordadas imediatamente. A atitude da Igreja para com os divorciados, a nomeação e a escolha dos bispos, o celibato da vida consagrada e dos sacerdotes, o papel dos leigos na Igreja, a relação entre a hierarquia eclesial e a política e os governos, são algumas dessas questões, e delas se fala no livro Estamos todos en la misma barca (Editorial San Pablo), que reúne as conversas entre o cardeal Martini e o Pe. Luigi Maria Verzé durante os primeiros meses de 2009 em uma tentativa de dialogar sobre os mares pelos quais navega a barca da Igreja.
A reportagem é de Jaime Vázquez Allegue e está publicada na revista espanhola Vida Nueva, 28-08-2009. A tradução é do Cepat.
Como se costuma dizer, Carlo Maria Martini não necessita de apresentação. Todos – crentes e nem tanto – sabem que durante muitos anos foi, além de príncipe da Igreja, um candidato à cátedra de Pedro. Com toda a segurança, a Igreja do século XXI teria sido diferente com ele no leme. Mas o Espírito soprou em outra direção e hoje Martini experimenta o sofrimento da cruz na dor da doença, mas com o ânimo e a ilusão de servir à igreja com o entusiasmo de um jovem que toma o Evangelho como norma de vida.
O padre Luigi Maria Verzé é um sacerdote bem conhecido por sua opção comprometida pelos doentes. Foi o fundador do Hospital de São Rafael de Milão e promotor da Universidade de mesmo nome. Verzé interpela a Igreja com questões candentes e de primeira ordem a partir da experiência da rua e do serviço aos mais necessitados, com a parábola do bom samaritano – texto de cabeceira – que o ajuda a interpretar a mensagem de Jesus a partir de uma nova perspectiva.
Em Estamos todos en la misma barca, encontramos as experiências dialogadas de dois homens da Igreja, o cardeal Martini, de 82 anos, e o padre Verzé, de 89. Os dois dialogam como os anciãos da tradição bíblica, com a experiência do passado, o conhecimento do presente e o olhar voltado para o futuro com o pleno conhecimento de que só desta forma a visão objetiva da realidade costuma acertar em seus prognósticos.
“Você não sofre porque a Igreja fica à margem, enquanto a humanidade avança sem Cristo?”, pergunta Verzé a Martini em um determinado momento das conversas. O cardeal se dirige ao sacerdote com estas palavras: “Homens como Paulo VI tinham uma profunda e dolorosa consciência desta separação. Fez-se muito no Concílio Vaticano II para superar essa fratura. Mas este convencimento ainda não chegou a todos os aspectos e níveis da vida da Igreja”. O debate está posto.
Revisão das normas canônicas
A situação dos divorciados que se casaram novamente é, talvez, a mais desenvolvida no diálogo entre o sacerdote e o cardeal. Um tema que adquire crescente atualidade e uma situação que cada vez afeta a mais pessoas de fé e comprometidas com o anúncio do Evangelho. O aumento de separações civis e a situação de recusa da instituição religiosa em relação aos divorciados que contraem novas núpcias fazem com que muitos crentes abandonem os seus costumes religiosos e se afastem da Igreja. Mesmo que divirjam em algumas questões, tanto para Martini como para Verzé a desproporção entre divórcios civis e nulidades matrimoniais obriga a fazer uma revisão das normas canônicas e eclesiais.
As questões debatidas entre os dois tertulianos são analisadas seguindo o estilo direto, sem circunlóquios, sem evasivas, sem respostas vagas nem frase com duplo sentido. Os temas são abordados com a mesma clareza com que são apresentados. A novidade – e esse é um dos méritos do livro – reside na qualidade das respostas. Tanto o jesuíta Martini como o padre Verzé sabem do que falam com conhecimento de causa, o que, longe de se converter em mero espetáculo de opiniões contrastadas, faz do debate um colóquio interessante do qual se pode divergir, concordar, rechaçar ou aprovar de forma absoluta. É que os temas abordados são analisados com fundamentos sólidos e com argumentos de peso. Pode-se estar de acordo ou não, mas o que ninguém poderá questionar é que faltem razões para o diálogo.Extraído de http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=25474 acesso em 06 set. 2009.
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