Arquivo do blog
-
▼
2025
(179)
-
▼
agosto
(17)
- Dificilmente um rico entra no Reino de Deus...
- Se queres ser perfeito...
- ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA...
- Deixai vir a mim as crianças...
- O que Deus uniu, o homem não separe ...
- Senhor quantas vezes devo perdoar meu irmão?
- A correção fraterna ...
- Homilia do 19°Dom tempo comum...
- Oração, fé, jejum e disciplina...
- Negar a cruz é negar Cristo...
- Tu és o Cristo, o Filho de Deus...
- Festa da Transfiguração do Senhor...
- «Tende confiança. Sou Eu. Não temais»
- Quem a Deus tem nada lhe falta...
- Ajuntai para vós tesouro no céu...
- O martírio de São João Batista...
- Sem fé é impossível agradar a Deus...
-
▼
agosto
(17)
segunda-feira, 16 de abril de 2012
NOSSA PÁSCOA ESPIRITUAL
quarta-feira, 20 de abril de 2011
Feliz Páscoa !
Paz, bem e feliz Páscoa!
Que Deus nos ajude
a percebermos Sua mensagem de vida
(e vida em abundância) para todos,
mesmo quando o mensageiro, a mensageira,
é alguém que não esperamos
que traga este tipo de mensagem.
E que não desanimemos
quando nós formos os mensageiros, as mensageiras,
e não acreditarem no que anunciamos.
Eugenio, OFS
Iustração:
Cristo e as duas Marias / William Holman Hunt. ca. 1897. Adelaide : Art Gallery of South Australia. Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:William_Holman_Hunt_-_Christ_And_The_Two_Marys.jpg acesso em 20 abr. 2011.
quinta-feira, 1 de abril de 2010
Paz, bem e feliz Páscoa !
A festa da vida !
Ilustração: Chora Church/Museum, Istanbul,fresco,Anastasis, Harrowing of Hell and Resurrection / fotografia de Gunnar Bach Pedersen. Fev. 2004. Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Chora_Anastasis1.jpg acesso em 1 abr. 2010.
domingo, 28 de março de 2010
Páscoa não é fim, mas recomeço de jornada
segunda-feira, 13 de abril de 2009
Hans Küng : O que significa e o que não significa “ressurreição”
Deu na Revista IHU on-line:
Teólogo católico, Küng vive desde 1967 em Tübingen, onde leciona na Universidade. Por suas posições firmes diante de Roma, sofreu duras represálias, que em 1979 culminaram na cassação de sua autorização canônica para lecionar Teologia em instituição superior católica. A partir desse fato, criou o Instituto de Pesquisas Ecumênicas, como unidade autônoma em relação à Faculdade de Teologia Católica. Em 1990, ao encerrar sua carreira na Universidade, Hans Küng lançou o Projeto de Ética Mundial. Recentemente, em setembro de 2005, o papa Bento XVI surpreendeu a opinião pública mundial ao receber Küng para uma longa conversa amigável, na residência de Castel Gandolfo. Também no Brasil, a obra de Küng Projeto de Ética Mundial. Uma moral ecumênica em vista da sobrevivência humana (São Paulo: Paulinas, 1992) foi marco fundador de uma discussão que, pela premência dos fatos, frutificou rapidamente e continua a angariar apoio. Seguiu-lhe a publicação de Uma ética global para a política e a economia mundiais (Petrópolis: Vozes, 1999). A obra mais recente de Hans Küng, traduzida para o português é O princípio de todas as coisas. Ciências Naturais e Religião (Petrópolis: Vozes, 2007). Sua última obra intitula-se Umstrittene Wahrheit. Erinnerungen (München-Zurich: Piper, 2007), traduzida em várias línguas. A tradução espanhola acaba de ser lançada.
Em visita ao Brasil no mês de outubro de 2007, Hans Küng esteve na Unisinos apresentando seu projeto de Ética Mundial. Na ocasião, a IHU On-Line dedicou uma revista especial sobre a temática, intitulada Projeto de Ética Mundial. Um debate. A edição número 240, de 22-10-2007, está disponível no sítio do IHU (www.unisinos.br/ihu).
Confira o artigo.
É claro que os testemunhos mais antigos e mais curtos do Novo Testamento não apresentam a ressurreição de Jesus como uma devolução da vida mundana – portanto, não estabelecem uma analogia com a devolução da vida pela mão dos profetas no Antigo Testamento. Não, do ponto de vista do horizonte de esperança apocalíptico-judaico trata-se nitidamente do enaltecimento do Nazareno assassinado e sepultado por Deus e para junto de Deus, para junto de um Deus que ele próprio chama “Abba”, Pai.
Afinal, o que significa “Auferweckung”, uma palavra que transmite uma imagem, que significa literalmente despertar do sono? Agora posso responder resumidamente à pergunta:
- Ressurreição não significa o regresso a esta vida espaço-temporal. A morte não é anulada (não se trata da animação de um cadáver). Pelo contrário, a morte é definitivamente superada. Trata-se da entrada numa vida totalmente diferente, imperecível, eterna, “celestial”. A ressurreição não é um “fato público”.
- Ressurreição não significa uma continuação desta vida espaço-temporal. O fato de se falar em “depois” da morte é enganador; a eternidade não é determinada por um antes nem por um depois temporais. Pelo contrário, significa uma nova vida na esfera de Deus, invisível, incompreensível, que rompe com as dimensões de espaço e tempo, simbolicamente designado por “Céu”.
- Ressurreição significa positivamente o seguinte: Jesus não morreu para dentro do Nada. Pelo contrário, morreu para dentro de uma realidade última e primeira, inconcebível, englobante. Foi recebido por essa realidade verdadeira a que chamamos Deus. O que espera o Homem ao encontrar o seu Eshaton, o fim da sua vida? Não o Nada, mas sim Tudo, isto é, Deus. O crente sabe desde então que a morte é a passagem para Deus, é a retirada para junto de Deus, nesse domínio que supera todas as ideias, que nenhum Homem alguma vez viu, alheio ao nosso toque, entendimento, reflexão e fantasia! A palavra mistério é bem empregue para descrever a ressurreição para a vida nova, porquanto se trata do domínio primordial de Deus.
Dito de outro modo, a fé dos discípulos é – tal como a morte de Jesus – um acontecimento histórico (apreensível por meios históricos); por sua vez, a ressurreição através de Deus para a vida eterna não é um acontecimento histórico, visível e imaginável, nem biológico. Todavia, trata-se de um acontecimento real na esfera de Deus. O que significa isto? O que significa “viver”? Um olhar para o quadro da ressurreição de Grünewald adverte-nos para o fato de o ressuscitado não ser meramente um outro ser puramente celestial, continua possuindo o corpo e a alma do homem Jesus de Nazaré, o crucificado. E a ressurreição não transforma este homem num fluido indeterminado, fundido com Deus e com o universo. Este homem permanece também na vida de Deus, o homem determinado, inconfundível que foi, porém, sem as limitações espaço-temporais da sua figura mundana! Daí a transição do seu rosto para pura luz em Grünewald. Segundo os testemunhos das escrituras a morte e a ressurreição não anulam a identidade da pessoa, mas preservam-na numa forma inimaginável, transformada, numa dimensão completamente diferente.
A consequência? Atualmente para nós, com formação científica, tem que se falar claramente. Para que a identidade da pessoa seja preservada, Deus não necessita dos restos físicos da existência mundana de Jesus. Estamos perante a ressurreição para uma forma de existência totalmente diferente. Talvez a possamos comparar com a existência das borboletas, que saem do casulo da lagarta. Tal como esse ser vivo deixa a velha forma de existência (“lagarta”) e aceita uma nova forma de existência inimaginável, liberta e leve (“borboleta”), assim podemos imaginar o processo de transformação de nós mesmos através de Deus. Uma imagem. Não estamos obrigados a qualquer tipo de ideias fisiológicas de ressurreição.
Afinal a ressurreição está ligada a quê? Não ao substrato constantemente a mudar ou aos elementos deste corpo particular, mas sim à identidade dessa pessoa inconfundível. O caráter físico da ressurreição não exige – nem outrora nem hoje – que o corpo morto seja reanimado. Pois, Deus ressuscita o Homem numa nova forma, inimaginável, como consta do paradoxo de Paulo: como “soma pneumatikón”, de “caráter físico-espiritual”. Com estas palavras, de fato, paradoxais, Paulo pretendia transmitir-nos simultaneamente as seguintes duas mensagens: continuidade – porque o “caráter físico” representa a identidade da pessoa até ao momento, que se desfaz, como se a história vivida e sofrida até ao momento se tivesse tornado irrelevante – e, simultaneamente, descontinuidade – porque o “caráter espiritual” não representa simplesmente a continuação ou a reanimação do antigo corpo, mas sim a nova dimensão, a dimensão do infinito, que depois da morte de tudo o que é finito se transforma, tem seu efeito.
Extraído de http://www.unisinos.br/ihuonline/index.php?option=com_tema_capa&Itemid=23&task=detalhe&id=1543 acesso em 09 abr. 2009.
domingo, 12 de abril de 2009
Antonio Cechin: “Um mundo novo é possível porque Jesus ressuscitou e caminha conosco”
Deu na Revista IHU on-line:Por: Graziela Wolfart , 06/04/2009
Para o irmão marista e militante dos movimentos sociais Antonio Cechin, “Páscoa é passagem da morte para a Vida, da escravidão para a libertação”. Na entrevista que concedeu por e-mail para a IHU On-Line, ele defende que, “se os cristãos no mundo de hoje, enraizarem firmemente a sua fé em Jesus Cristo e se empenharem na luta por um mundo melhor, passaremos de um mundo capitalista, individualista, egoísta, desumano, de violência institucionalizada, para um mundo mais humano, fraternal, cooperativo, solidário, de paz”. E dispara: “A mão invisível da Providência realizou o milagre do tombo do capitalismo. O grande dilema em que estamos mergulhados neste momento é consertar o capitalismo ou inaugurar um mundo novo que é inteiramente possível. Essa é a grande esperança com que vamos embalados para as festas de Páscoa que se aproximam”.
Antonio Cechin formou-se em Letras Clássicas e em Direito, pela PUCRS, onde também foi professor. Fez sua pós-graduação no Centro de Economia e Humanismo, em Paris. Iniciou na Instituição Católica de Paris a especialização em catequese, quando foi chamado para o Vaticano, na Sagrada Congregação dos Ritos, no início da década de 1960. Depois, retornou ao Brasil e iniciou a luta junto aos movimentos sociais. Sua obra está centrada no seu ativismo mais do que na sua elaboração intelectual, e voltada para manuscritos e artigos.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - Para o senhor, celebrar a Páscoa em pleno século XXI o que significa? Qual o significado do sentido da morte e ressurreição de Jesus Cristo para o contexto sociocultural atual?
Antonio Cechin - Páscoa é passagem da morte para a Vida, da escravidão para a libertação. Sempre que no cotidiano conseguimos passar de uma situação difícil para uma situação melhor, realizamos Páscoa, a exemplo de Cristo que passou da paixão e morte para a Vida e a Ressurreição. “Não há maior prova de amor do que dar a vida por aqueles a quem se ama.” Isso o Homem Jesus de Nazaré falou, isso Ele realizou. O mundo vive estertores de sofrimento e morte. Todos hoje falam em crise, desemprego, violência e morte, com milhões de famintos, doentes, desempregados etc. etc. “Não estamos simplesmente vivendo uma época de mudança, mas uma mudança de época.” Se os cristãos no mundo de hoje, enraizarem firmemente a sua fé em Jesus Cristo e se empenharem na luta por um mundo melhor, passaremos de um mundo capitalista, individualista, egoísta, desumano, de violência institucionalizada, para um mundo mais humano, fraternal, cooperativo, solidário, de paz.
IHU On-Line - De que maneira podemos relacionar a celebração da Páscoa com o perfil da sociedade e do ser humano contemporâneos?
Antonio Cechin - A humanidade ao longo dos séculos não soube se organizar de maneira fraterna. Foi montado o sistema em que uns poucos usufruem da maior riqueza, enquanto a imensa maioria vive a carência de tudo. Esse sistema capitalista que aí está é intrinsecamente perverso. Depois que a experiência do sistema comunista fracassou, houve quem afirmasse o fim da História (Fukuyama). Parecia que o capitalismo seria nossa sina perpétua. Porém, a mão invisível da Providência realizou o milagre do tombo do capitalismo. O grande dilema em que estamos mergulhados neste momento é consertar o capitalismo ou inaugurar um mundo novo que é inteiramente possível. Essa é a grande esperança com que vamos embalados para as festas de Páscoa que se aproximam.
IHU On-Line - Lembrando que o tema da Campanha da fraternidade deste ano é “a paz é fruto da justiça”, de que forma o senhor pensa que podemos celebrar a páscoa em uma sociedade cada vez mais marcada pela violência?
Antonio Cechin - A violência que irrompe por toda a parte, especialmente no mundo urbano, nada mais é do que o fruto da violência institucionalizada do sistema capitalista que já dura centenas de anos. As forças que oprimem os pobres são as mesmas forças que oprimem o planeta Terra, hoje doente. O momento que vivemos hoje no mundo de 2009, às portas da festa da Páscoa, é um verdadeiro “kairós” isto é, um tempo favorável a que todos nos empenhemos em realizar o tão sonhado “mundo diferente” como cantamos sempre por ocasião dos Fóruns Sociais Mundiais “Um mundo novo é possível!”. Já pinta “a paz como fruto da justiça”. Oxalá a Páscoa de Jesus nos ilumine, na linha das páscoas dos índios da “Raposa, Terra do Sol” com sua utopia da “Terra Sem Males”; dos quilombolas que, num dos bairros mais ricos de Porto Alegre, conseguiram suportar a pressão e transformar a área em que viviam desde a abolição em 1888, em assentamento regular; dos lutadores do MST que, apesar da criminalização, ainda estão conseguindo realizar ocupação em cima de ocupação e mantendo suas escolas itinerantes. Um mundo novo é possível porque Jesus Ressuscitou e caminha conosco!
Extraído de http://www.unisinos.br/ihuonline/index.php?option=com_tema_capa&Itemid=23&task=detalhe&id=1544 acesso em 09 abr. 2009.
Ilustração: En el British Museum de Londres (Reino Unido) se conserva esta placa de alabastro, del s. XIV, con un altorrelieve que representa la Resurreción de Cristo. Una pieza similar se encuentra en el Museo Arqueológico de Jerez de la Frontera.(Cádiz, España).
sábado, 11 de abril de 2009
Leomar Brustolin : A Páscoa e a humanização do mundo
Deu na Revista IHU on-line:Por: Graziela Wolfart e Márcia Junges, 06/04/2009

Leomar Antônio Brustolin é pároco da Catedral Diocesana de Caxias do Sul. Possui graduação em Teologia, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, mestrado em Teologia, pela Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia (FAJE), em Belo Horizonte, e doutorado em Teologia, pela Pontificia Università San Tommaso, em Roma, Itália. Atualmente, é professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, onde é coordenador do Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Teologia. De sua autoria, destacamos: Quando Cristo vem... a Parusia na Escatologia Cristã (2. ed. São Paulo: Paulus, 2001), Maria, símbolo do cuidado e Deus (São Paulo: Paulinas, 2004), Antonio Francisco. Caminho de fé. Livro do catequizando (São Paulo: Paulinas, 2006) e A fé cristã para catequistas (São Paulo: Paulinas, 2008). Ele estará presente na Unisinos hoje, dia 06 de abril, participando do evento de Páscoa promovido pelo Instituto Humanitas Unisinos – IHU, com a palestra “A paixão de Cristo hoje”.
Confira a entrevista.
IHU On-Line - O que significa, hoje, a Paixão de Cristo?
Leomar Brustolin - Vivemos num mundo marcado tanto pela beleza, pelo conforto e pelo prazer, quanto pela dor, pelo vazio e pelo mal. O sofrimento, entretanto, questiona o sentido da vida. Queremos justificar a presença intrusa do mal buscando seus responsáveis. Muitas vezes, a procura dos culpados nos faz esquecer das vítimas. Nem sempre é possível identificar a causa da dor. Em alguns casos pode ser o resultado de um processo violento cometido livre e conscientemente por grupos ou indivíduos. Assim se conhece a paixão causada em Auschwitz, Hiroxima e Nagasaki. Outras vezes, pode ser o que resulta da injustiça social. É o caso da fome e do desemprego causados pelo sistema econômico. Pode ser também a paixão de sentimentos enlouquecidos que matam o outro. Como o ocorrido com a menina Eloá, em São Paulo, mantida em cárcere privado e assassinada pelo namorado. Pode ser até a paixão da natureza destruída pela intervenção humana. Veja-se a situação da Amazônia brasileira. Enfim, pode ser também a fatalidade da vida que está sujeita aos acidentes naturais. Esse foi o mal experimentado pelas vítimas do tsunami, a onda gigante gerada por distúrbios sísmicos, que possui alto poder destrutivo quando chega à região costeira.
Como falar da paixão de Cristo diante de realidades tão plurais? Poderíamos escolher um tipo de sofrimento para especificar o acontecido com Jesus: o martírio, que é uma dor provocada por uma causa defendida. Certamente, esse tipo de sofrimento remete a Jesus Cristo, mas o mistério da paixão vai além desse âmbito. O sentido de sua morte abrange toda a realidade humana alienada de diferentes formas pela força do mal. Para falar da paixão de Jesus Cristo hoje, portanto, será preciso encontrar o significado dessa morte para nós. Ora, o próprio Cristo na cruz não resolveu o problema do sofrimento inocente e nem respondeu a todos os enigmas que a morte impõe. Mais do que explicar e responder às indagações da existência, Jesus Cristo apresenta-se como Presença entre os sofredores e como solidariedade para as vítimas que o mal produziu. Durante sua crucificação, Jesus pede que o Pai perdoe seus algozes, porque, diz ele: “não sabem o que fazem”. A irracionalidade da morte de Cristo faz com que ele mesmo perdoe, pois, para ele, mais importante do que encontrar os culpados e condená-los é derrotar o mal. Sua perspectiva de salvação supera tudo. A compaixão do Deus de Jesus Cristo não explica o padecimento. O Deus cristão, porém, não fica imparcial diante da ação do mal, ele toma posição solidária ao sofredor e julga, assim, o causador do mal, seja quem for. A paixão de Cristo hoje, então, implica em solidariedade e compromisso com as vítimas. Para isso, será preciso vencer a apatia diante da dor do outro. Será preciso amar, interessando-se pela dor do outro. É como escreve Erico Veríssimo : o oposto do amor não é o ódio, mas sim a indiferença.
IHU On-Line - Quais são as grandes lições existenciais e espirituais da Paixão de Cristo?
Leomar Brustolin - A sentença de morte não surgiu de repente na vida de Jesus. Ela foi o preço que Cristo pagou por sua opção pelo Reino de Deus e sua justiça. O que dá sentido à morte de Jesus é a sua total fidelidade ao Pai e ao seu projeto de salvação. A cruz é o fim de um processo. Pode-se dizer que a grande lição do martírio de Cristo é a da prova de amor pela vida. Ele veio para que todos tenham vida em abundância (Jo 10,10). Contudo, por defender a vida ameaçada, foi assassinado. Hoje, da mesma forma, o seguidor de Jesus há de colocar-se ao lado de todos que perdem seus direitos de viver. Essa tarefa há de ser uma causa coerente que cuide da vida, desde o seu início até o seu fim natural.
Outra lição que aprendemos com Jesus é que o amor subverte nosso pensar e nosso agir. Quem segue o Crucificado não pode recear o escândalo da cruz. Para os judeus, a morte de cruz era um sinal de maldição. Pela lei judaica, um homem crucificado era expulso do povo, maldito por Deus. Mas a cruz de Jesus não é a imagem do seu fracasso. Muito pelo contrário, ela é a imagem da maior prova do amor de Deus pelos homens: “Não existe amor maior do que dar a vida pelos amigos!” (Jo 15,13). Na cruz, o Filho de Deus sofre e morre pelos últimos deste mundo: os pobres e injustiçados, doentes e rejeitados, mulheres marginalizadas, pecadores e prostitutas. Todos amigos de Jesus que o Pai ama e quer resgatar. Seguir Jesus hoje significa não temer a estranheza entre o Evangelho e o estilo excludente de vida que se impôs entre nós.
Finalmente, é preciso ver que no meio da cruz, brilha a luz. Não existe noite que impeça a aurora. Quiseram matar o Nazareno da forma mais vergonhosa possível, para acabar com Ele e a obra que havia iniciado. Porém, essa “hora das trevas” já havia sido anunciada pelo próprio Jesus diversas vezes. Através da sua paixão e morte, o Cristo manifestaria sua glória ao mundo. Para os cristãos, a cruz do Senhor é a verdadeira “árvore da vida”. Neste sentido, o sofrimento, a incompreensão, a perseguição e tudo que possa parecer a hora das trevas do cristão neste mundo está galvanizado de uma esperança maior: a ressurreição.
IHU On-Line - Como a Paixão pode inspirar a nós, homens e mulheres da pós-modernidade, a cultivarmos nossa espiritualidade e solidariedade?
Leomar Brustolin - O amor revelado sobre a cruz indica para todos – crentes e não-crentes que estão em busca da verdade – o bem que salva e se oferece como luz e força também para superar os tormentos do mal. O cristão deve ser, ao mesmo tempo, empenhado e desempenhado, cidadão da terra e do céu, plenamente disponível a cooperar para humanização do mundo e também crítico para esperar a novidade do reino que há de vir. Esta esperança o faz olhar sempre além das realizações. Empenhado, deve ajudar a produzir um futuro melhor para o mundo, mas, ao mesmo tempo, disponível, para acolher o dom de Deus que traz a consumação das esperanças humanas. A descontinuidade existente entre o progresso humano e o avanço do Reino de Deus no mundo apresenta estas exigências imprescindíveis. Isto não implica num dualismo na história (sagrada–profana), nem incompatibilidade, mas profundo realismo na avaliação das realidades terrestres. A evangelização cristã introduz no mundo um espírito novo que resgata e exalta valores e esperanças em vistas de um processo de humanização.
IHU On-Line - De que forma a Parusia de Cristo serve como uma fonte de inspiração para nossa atitude frente aos semelhantes e para a relação que temos com o cosmos?
Leomar Brustolin - O que mais ameaça a esperança é a crise. Esta faz com que se perca a confiança no tempo, pois não se sabe mais se haverá futuro. Perde-se a confiança na terra, porque se assiste uma desmedida exploração dos recursos naturais. Perde-se a confiança na humanidade quando se conhece os constantes extermínios que dizimam populações inteiras. A reação à crise se manifesta de diferentes formas, principalmente com o retorno do sagrado, não tanto para recuperar a esperança no futuro, quanto para resgatar terapeuticamente o presente. A crise de sentido possibilita refletir o presente da história na perspectiva de quem deseja “construir a esperança”. Para tanto, será necessário resgatar os enfoques teológico, antropológico e ecológico numa perspectiva de parusia.
A primeira exigência para uma práxis da esperança é esperar em Deus sem triunfalismos. O messianismo moderno assegurava: unidos a Deus, dominaremos a terra e com Cristo julgaremos os povos. Esse sonho entrou em crise porque não foi capaz de perceber que Deus não vem em nosso poder, mas em nosso sofrimento, mediante do seu Espírito vivificador.
Na dimensão antropológica, é preciso avaliar o projeto moderno de ser humano, convencido de que os homens são criados livres e iguais, e que a liberdade, a igualdade e a fraternidade estão estreitamente ligadas entre si. Isso tudo, no entanto, tornou-se apenas uma promessa jurídica e institucional que espera sua concretização. Ora, a esperança cristã supõe fraternidade e solidariedade numa humanidade que, queira ou não, terá um fim comum. Todas as raças e culturas, povos e nações participarão da glória de Deus. Nela, a convivência livre, igual e fraterna será realidade para todos que entrarem na comunhão da pátria trinitária, sem exclusão, discriminação ou castas.
Finalmente, a questão ecológica há de fazer-nos mais atentos à Terra. O projeto da civilização técnico-científica sacrificou muitas vidas, espécies e ecossistemas. O caminho tende à catástrofe planetária. E diante do iminente caos apocalíptico, a esperança parusíaca tem uma palavra para o hoje da terra. A preservação do ambiente e da vida humana não pode ser apenas em vistas de um futuro remoto. O tempo da salvação da terra é o presente. É hoje que se deve agir como se o futuro inteiro do gênero humano estivesse nas mãos da atual geração.
IHU On-Line - A vida de Cristo ainda pode ser compreendida como um grande exemplo a ser seguido em nossos dias?
Leomar Brustolin - Sim, a vida de Cristo, relatada pelos evangelistas, não exclui ninguém do convívio com Jesus. Hoje, como outrora, é preciso acolher essa Boa Nova que chega como apelo específico para cada pessoa na sociedade. O Evangelho de Jesus apresenta duas tarefas: se, de um lado, anuncia a Boa Nova aos pobres (Lc 4,18), a quem pertence o Reino de Deus (Mt 5,3), de outro, é um forte apelo de conversão aos ricos (Mt 6,24). A primeira coisa que o rico deve fazer diante da aproximação do Reino é reconhecer a própria pobreza, para inserir-se na comunhão com os pobres.
Converter-se significa viver na antecipação de um Reino de Deus que nos precede, e que realiza uma reviravolta da violência para a justiça, do isolamento à comunhão, da morte, para a vida. A conversão possibilita o seguimento de Jesus a homens e mulheres que representam um novo mundo que virá. Esta comunidade, nos primeiros tempos do cristianismo, era composta de pobres e ricos, de tal modo que estes últimos exercitavam o dever da misericórdia no confronto com os necessitados.
IHU On-Line - Nesse sentido, o que significa ser cristão hoje?
Leomar Brustolin - Os cristãos são “paroquianos” no mundo. Os paroquianos eram, no ambiente grego e romano, aqueles estranhos que passavam por algum território, aí se detinham um pouco, para em seguida prosseguirem a caminhada. Os cristãos sentem-se estrangeiros que vivem em terra estranha, porque já sabem que existe a pátria verdadeira e degustam das forças do mundo que virá. Eles vivem numa realidade nova dentro da velha e atual. Onde se perde a presidência do futuro, decai-se na administração do passado, na institucionalização repetitiva sem criatividade. Esperar o futuro é já permear o presente de uma força que renova o sentido da vida.
Contra todo desespero e ilusão, será necessário seguir criando e trabalhando por um mundo melhor. Apesar dos impérios da morte, da potência dos grupos violentos e das propostas que favorecem uma minoria mundial, o cristão não pode deixar de profetizar em favor da vida, da dignidade humana e da preservação do cosmos. A Páscoa há de possibilitar sonhar, como Isaías, esperando o novo céu e a nova terra. Há de proporcionar o início de um tempo onde justiça e paz se abraçam como canta o salmista. Há de valorizar, defender e conservar o grande cenário que é o universo, no qual a aventura da vida se expressa e se sustenta.
IHU On-Line - O significado da Páscoa se perdeu em nossos dias?
Leomar Brustolin - Páscoa é passagem. Os povos antigos de cultura agrícola a celebravam como a saída do inverno e a chegada da primavera. Os judeus celebram a passagem da escravidão para a libertação, conforme o relato do êxodo. Nós, cristãos, celebramos a passagem da morte para vida realizada na cruz e ressurreição de Jesus. Ora, em toda celebração pascal há uma dinâmica que impulsiona o ser humano para uma condição nova, desconhecida, maior e plena de esperança. É uma flecha que se lança ao futuro. Em nosso tempo, temos eternizado o presente, muitos não querem pensar uma situação nova, apenas desejam melhorar um pouco a atual. Por isso, a festa da Páscoa fica reduzida a feriado religioso que intensifica a economia: o turismo, o chocolate, o bacalhau. O fato de vivermos numa sociedade pós-cristã se traduz nessa ressignificação do tempo e da festa. Sexta-feira santa virou a festa do peixe e a Páscoa, a do chocolate. Essa situação, contudo, não chega a abalar as pessoas, até muitos cristãos aderem a essas práticas, sem preocupações com seu real sentido. E a beleza sempre nova da Páscoa, a passagem para as primaveras da vida, a libertação das amarras do presente e a ressurreição que dá sabor ao cotidiano ficam escondidas e somente são acolhidas por aqueles que esperam um tempo novo, um outro mundo possível.
Extraído de http://www.unisinos.br/ihuonline/index.php?option=com_tema_capa&Itemid=23&task=detalhe&id=1542
Ilustração: Kalvária, stropná maľba, Banská Štiavnica. acesso em 09 abr. 2009.
A morte não deve ser o critério de leitura dos acontecimentos
Deu no Instituto Humanitas -Unisinos:
o critério de leitura dos acontecimentos.'
Entrevista especial com João Batista Libanio
Nestes dias de celebração da Paixão, Morte e Ressurreição de Jesus Cristo, a esperança que nasce da pessoa de Jesus frente ao mal e à morte é um convite a fazermos uma nova leitura da realidade. E em Jesus podemos encontrar a força e a confiança necessárias para superar e vencer o mal que ainda existem em nossa sociedade.
Para o Pe. João Batista Libanio, a Páscoa é um momento central para se compreender que cada situação concreta da vida desperta uma maneira diferente de se entender o amor de Deus. Em entrevista concedida por telefone, Libanio afirma que "toda situação humana é um jogo dialético entre vida e morte".
Nesse sentido, "a Ressurreição quer dizer que a vida é mais importante do que a morte, e que, portanto, a morte não deve ser o critério de leitura dos acontecimentos", afirma o doutor em teologia pela Pontifícia Universidade Gregoriana de Roma.
João Batista Libanio é padre jesuíta, escritor, filósofo e teólogo. É também mestre e doutor em Teologia, pela Pontifícia Universidade Gregoriana (PUG) de Roma. Atualmente, leciona na Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia e é Membro do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais. É autor de diversos livros, dentre os quais "Teologia da revelação a partir da Modernidade" (Loyola, 2005, 5ª ed.), "Qual o futuro do Cristianismo" (Paulus, 2008, 2ª ed.) e "Qual o caminho entre o crer e o amar?" (Paulus, 2005, 2ª ed.).
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O que o tempo pascal convida os cristãos a fazer ou a refletir sobre o mundo e a Igreja de hoje?
João Batista Libanio – Todo momento litúrgico tem uma peculiaridade. O momento da Quaresma foi um momento especialmente penitencial, de conversão e de revisão das nossas estruturas. E a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) apresentou esse problema muito grave da segurança e da paz, não para que nós os esqueçamos, mas para que continuemos a cultivar e a tentar encontrar soluções para essas duas questões.
Agora, a Páscoa já quer olhar o aspecto de esperança que se realizou na pessoa de Jesus: quer dizer, essa luta contra o mal, essa luta contra a morte, essa luta contra tudo o que há de perverso na sociedade termina com a vitória da ressurreição. Portanto, a última palavra não vem do mal, mas vem da salvação. Isso nos dá muita esperança, muita confiança.
Eu diria que a Ressurreição é uma grande experiência filial, por assim dizer, usando um conceito bem atual de cuidado e de ternura. Assim como a mãe cuida do seu filho pequenino e cria uma condição básica de confiança, saber que o Senhor Jesus, que nos amou e se entregou por nós, venceu a morte e todos os males nos dá uma confiança muito profunda, de que também nós, com a força dele, temos condições de ir vencendo e trabalhando contra o mal que impera na sociedade.
"A vida é mais importante do que a morte, e , portanto, a morte não deve ser o critério de leitura dos acontecimentos" |
IHU On-Line – Como a paixão de Cristo se expressa na "paixão" do mundo e da Igreja hoje?
João Batista Libanio – Gosto muito da ideia de Jon Sobrino que fala dos povos crucificados. Até então, a reflexão olhava mais as pessoas enquanto indivíduos, isto é, uma mãe que perde o filho, o esposo que perde a sua esposa, uma situação de desemprego etc., sempre em uma condição de sofrimento. E aí temos uma palavra de esperança, porque o Senhor Jesus foi aquele que assumiu o sofrimento humano até o extremo.
Agora, podemos ampliar esse horizonte para o aspecto social. E não o sofrimento do indivíduo, mas o sofrimento de classes, de regiões, de países, e até de fenômenos, como agora na Itália, em Aquila, com o terremoto que fez muita gente sofrer. Nesse sentido, a vida humana traz sofrimentos coletivos. E, nesses momentos, nós gritamos, como Jó perguntando a Deus: como isso é possível?
Um ateu dizia que, enquanto uma criança inocente sofrer, todos os argumentos para a existência de Deus são inúteis. Outro dizia que um escândalo contra Deus é o sofrimento. Ora, isso seria correto se fosse um Deus distante, um Deus que ficasse fora, o famoso Deus de certas religiões, um Deus ocioso, como dizem os antigos. Mas nós sabemos que o nosso Deus não ficou fora da história humana. Ele entrou nela, e isso mostra que Ele está ao lado não só dos indivíduos, mas também dos povos. E pode prometer a eles essa esperança, que começa agora, pela presença, pelo carinho, pelo amor. Eles não são desprezados de Deus, mas sim amados de Deus, mesmo nas condições tão desprezadas em que estão.
IHU On-Line – Qual a sua avaliação dos chamados "erros de governo e comunicação" de Bento XVI (caso dos lefebvrianos, o aborto da menina do Recife, a questão dos preservativos na África)?
João Batista Libanio – Temos que perceber que hoje estamos numa situação bem diferente. Antes, a Igreja tinha muita liberdade para tomar posições internas sem que as repercussões fossem para fora do nosso âmbito e, portanto, para âmbitos que desconhecem a regra interna da Igreja.
Suponhamos que um clube de futebol tome uma medida respectiva a um jogador por ser um problema interno do clube. Disso, ninguém iria reclamar em tempos antigos. Hoje, isso sai na imprensa, e a pressão sobre o técnico, sobre o diretor do clube é tão grande que eles ficam sem saber o que fazer. Se isso vale para um clube, isso vale muito mais para a Igreja que é universal. Então, uma medida que seria puramente interna, por exemplo celebrar a missa em latim ou celebrar a missa em português, não tem nada a ver com a política de Obama, nem de Lula, nem com os interesses do Estado de São Paulo.
Mas hoje não. Hoje todas essas medidas têm uma repercussão social muito grande. E talvez isso não seja suficientemente levado em conta nos mundos mais burocráticos, porque ficam muito fechados entre si, e só percebem que o incêndio começou depois que o fogo já está muito alto. Então, tenho a impressão de que falta, talvez, uma certa assessoria mais sensível às repercussões midiáticas de medidas até justas e dignas no interior da Igreja, mas que hoje não podem ser tomadas sem mais, porque as repercussões são muito graves, e isso faz com que a imprensa selecione esses pontos escuros da vida do Papa e crie uma imagem muito escura dele, que não corresponde talvez à verdade.
"Uma fé perfumada só mostra a sua validez no momento em que tenha a caridade e o amor: 'Tive fome, tive sede, estava nu, estava preso e me socorrestes'" |
Isso me faz lembrar de um fato de um psicólogo que um dia levou a um auditório uma folha branca enorme e colocou um pontinho preto no meio e perguntou às pessoas o que elas estavam vendo. E o pessoal gritou: "Um pontinho preto". E ele perguntou: "E a folha branca, vocês não veem, não?". É um pouco isso o que está acontecendo no pontificado do nosso papa. Eles escolhem os pontos escuros e fazem toda uma pintura escura, porque somam todos os pontos escuros e esquecem todas as outras coisas positivas. Agora, uma assessoria melhor ou mais sutil poderia evitar talvez esses equívocos, que acabam difamando a Igreja e também dificultando ou escurecendo a imagem do Papa.
IHU On-Line – Como os cristãos católicos podem entende e assimilar essas situações à luz da Páscoa?
João Batista Libanio – Eu acho difícil, não porque os cristãos sejam melhores ou piores, mas porque a cultura atual envolve a todos nós. Nós vivemos em uma cultura de muita autonomia, de muita liberdade, de uma enorme possibilidade de oferecer e de receber informação. Então, esses atos adquirem uma tal grandeza que as pessoas normais são afetadas.
Não podemos exigir heroísmo das pessoas. Jesus mesmo suportou tantas críticas. Muitas vezes teve que ficar calado diante de Herodes, de Pilatos. Agora, a massa, o grande povo não é santo. Ele reage conforme a cultura. Nós podemos incentivar para que haja uma maior profundidade espiritual, mas não podemos evitar que a grande massa responda conforme a cultura do momento, porque essa é a nossa condição humana.
IHU On-Line – O que o sofrimento e a solidão de Jesus na cruz podem nos ensinar hoje, em nossa realidade, sobre quem é Deus?
João Batista Libanio – A solidão de Jesus tem duas faces. É o silêncio, que aparece na reza daqueles salmos – "Meu Deus, Meu Deus, por que me abandonaste?" –, mas também a face do "Senhor, em tuas mãos eu entrego o meu espírito". Quer dizer, Jesus sentiu, claro, essa solidão, mas ao mesmo tempo – e isso é muito difícil de entendermos –, sentiu uma imensa confiança, uma total confiança no amor do Pai que não o abandonava e não o abandonou minuto nenhum, instante nenhum.
Ele não morreu desesperado, como muitas vezes a gente diz, nem abandonado. Ele morreu envolvido pela experiência profunda de acolhida de Deus Pai, a quem disse "Pai, em tuas mãos eu entrego o meu espírito". Entregar o espírito tem o sentido de morte, de entregar para nós o Espírito Santo, como é a interpretação de João. Ele, na cruz, nos ajuda a fazer essa dupla experiência. No momento de silêncio, de vazio da nossa vida, tentar pensar naqueles outros momentos em que somos envolvidos por muito amor, por muita ternura, seja de pessoas humanas – nossos pais, nossos amigos, ou outras pessoas que estiveram presentes em nossa vida –, seja sobretudo pela certeza absoluta de que Deus, que nos cria e nos chama para o amor, continua nos amando e nos criando, porque a criação não é um ato solto, mas é um ato permanente.
"Jesus não morreu desesperado, nem abandonado. Ele morreu envolvido pela experiência de acolhida de Deus Pai" |
João coloca Maria ao lado da cruz – mesmo que isso não tenha sido histórico, mas isso não tem muita importância para a reflexão teológica. Então, Jesus também foi envolvido pelo amor materno. Ele sabia que podia confiar, porque o amor que o criou como mãe e o amor cuidadoso de José lhe deram uma solidez, uma base de confiança fundamental humana muito grande. E isso também aparece na cruz, na relação com a mãe. Jesus mostra essas duas confianças básicas para a nossa vida, a dos nossos pais e mães – a confiança tutelar – e a de Deus. Essa solidão de Jesus mostra, ao mesmo tempo, esse abandono no amor que o envolvia e mostra que também nós, nesse momento de solidão, temos alguém nos ama e nos encobre: tanto pessoas humanas como o próprio Deus.
IHU On-Line – Como é possível apresentar os mistérios da Paixão, Morte e Ressurreição de Cristo em uma linguagem compreensível à modernidade?
João Batista Libanio – Tenho a impressão de que podemos trabalhar a linguagem simbólica, eu diria, tomando uma certa distância daquele famoso filme, "A Paixão de Cristo", de Mel Gibson, que é todo cheio de sangue. O mundo de hoje gosta muito de ver os fatos de uma maneira cruel: quanto mais sangrento melhor. Eu tenho a impressão que não é por esse viés que deveríamos caminhar. Não é aumentando o realismo da Paixão de Jesus, colocando mais sangue, mais cruz, mais espinhos, mas de uma forma simbólica. Não que o sofrimento não tenha sido real, mas simbólico no sentido etimológico da palavra, isto é, uma realidade visível que nos mostra uma realidade invisível.
Esse visível do sofrimento de Jesus não é o fim, não podemos para nele. Ele aponta para uma outra realidade maior, e é essa outra realidade maior que é mais importante, que é, no fundo, a revelação da ternura e do amor infinito de Deus. Se conseguirmos falar disso, conseguiremos entender uma mãe que passa um mês inteiro dormindo mal cuidando de um filho. Ninguém deseja que as pessoas durmam mal um mês inteiro, mas a mãe passa por isso, sobre esse amor que é enorme.
Agora mesmo, em Belo Horizonte, conheci um pai que trabalha no Tribunal, cuja filha passou dois meses na UTI, e ele passou praticamente todo o tempo ali perto. Um homem que emagreceu, que ficou quase esquálido. Ninguém deseja isso para ninguém. Mas de fato ele fez, porque a filha estava entre a vida e a morte. Foi um sinal de amor. Acho que isso quase todas as pessoas entendem, e não só entendem, mas também praticam. Portanto, não é só Jesus que fez isso: quantos pais, quantas mães, mesmo as enfermeiras que cuidam dos velhinhos aqui em casa. E eu digo para elas: "Vocês são verdadeiros sacramentos do amor de Jesus". Eu acho que é nesse sentido que a Paixão de Jesus é bonita.
IHU On-Line – Como pode se estabelecer uma ponte de ligação entre o mistério da fé cristã e a contemporaneidade?
João Batista Libanio – A fé é a acolhida de uma palavra revelada. E ela pede de mim conversão e compromisso. São as três dimensões fundamentais, para mim, da fé. Então, existe a Palavra revelada de Deus, que não é só a que está na Escritura, mas é aquela que está na Escritura lida e interpretada ao longo dos séculos. Essa palavra está nos provocando continuamente. Para quê? Para que nós a interpretemos.
"Não podemos exigir heroísmo das pessoas. Jesus mesmo suportou tantas críticas" |
Porém, nós só podemos interpretá-la dentro da contemporaneidade, com os problemas que nós temos das relações com as outras religiões, do feminismo, da fome no mundo etc. Acolhendo a palavra, ela pede que eu me converta, para ver como eu vou vivê-la dentro desse mundo concreto, que foi uma tentativa que [a V Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e do Caribe de] Aparecida quis fazer. Ela disse que é importante o encontro pessoal com Jesus, a conversão e o ser missionário.
É a partir daí que temos que perguntar o que essa situação concreta provoca em nós. Cada situação concreta desperta uma maneira diferente de se entender o amor de Deus, que é universal, e que, agora, se encontra nessa situação bem definida, bem determinada.
IHU On-Line – Como os sofredores e os marginalizados do mundo, especialmente dentro da própria Igreja, podem experimentar a Ressurreição?
João Batista Libanio – Só por meio de pastorais concretas que pensem neles. Isto é, por meio de gestos. Do contrário, vamos ter um discurso abstrato e genérico. E os gestos têm que ser físicos e concretos, que as nossas pastorais, portanto, levem a sério e coloquem o problema social como centro de organização.
Se o Apostolado da Oração, a Renovação Carismática, movimentos que são muito bonitos dentro da Igreja, não tiverem nenhum envolvimento com esse mundo social, se não forem um sinal e uma presença desse amor de Deus para essas pessoas, eles não estarão realizando aquilo que é mais profundo no cristianismo. Isso nós temos que dizer com todas as letras. Já dizia São Tiago: sem atos, sem ações, a fé é morta.
Então, uma fé bonita, cantada, perfumada e incensada só mostra a sua validez e a sua força no momento em que tenha a caridade e o amor, como em Mateus 25: "Tive fome, tive sede, estava nu, estava preso e me socorrestes". Todo o cristão tem que perguntar: como eu estou vivendo a minha fé em relação àquelas pessoas que sofrem? Mas de uma maneira real, concreta, que seja a presença amorosa, respeitosa, digna de Deus em relação aos pobres.
IHU On-Line – A partir da Páscoa, quais são os desafios e as esperanças que o Cristo morto e ressuscitado apresenta ao mundo de hoje?
João Batista Libanio – A Páscoa é a vitória sobre a morte e sobre o mal, e não só em um sentido físico, mas todas as mortes que existem na Terra e as pequenas mortes de cada um de nós, como um matrimônio que rompe, por exemplo. Então, se esse casal ficar desesperado, vai ter que encontrar no Ressuscitado uma força para reconstruir a sua vida. Os filhos continuam aí, e eles precisam do carinho dos dois, e como eles vão trabalhar isso?
"O nosso Deus não ficou fora da história humana. Ele está ao lado dos povos" |
Portanto, se tomarmos cada situação humana, vamos perceber que toda situação humana é um jogo dialético entre vida e morte. E a Ressurreição quer dizer que a vida é mais importante do que a morte, e que, portanto, a morte não deve ser o critério de leitura dos acontecimentos.
A propaganda nos dá a ideia de que o mundo de hoje é só de morte, de crimes, de misérias. Para cada jovem americano que metralha os seus companheiros, existem milhões de jovens que não fazem isso e que vão à aula, brincam, jogam. Nós criamos uma imagem terrível da humanidade, e parece que a morte está vencendo. E a Ressurreição quer dizer "não".
Para cada mãe que mata a sua criança, para cada padrasto, como aquele no Recife, que prostitui e viola a sua afilhada, existem milhões de mães, milhões de padrastos, milhões de pais que são ternos, que são carinhosos. Acreditar que existe essa vitória do bem em cada momento em que lemos os fatos maus é que é a grande lição da Ressurreição.
Gostaria de deixar a minha mensagem de esperança para um mundo tão desesperançado. E que não nos deixemos dominar por uma mídia sensacionalista, para a qual praticamente só existem notícias de corrupção, de sexo violento, de violência dos assaltos e que esquece que o mais bonito da humanidade é a convivência entre os seres humanos.
(Reportagem de Moisés Sbardelotto)Extraído de http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=21273 acesso em 11 abr. 2009.
A mística da Ressurreição
Por Frei Clemente Kesselmeier
Num de seus livros, Gabriel Garcia Marques fala de uma vila de pescadores, onde reinam o tédio, a monotonia, o vazio, cada novo dia já nascendo velho.
Acontece que num dia como todos os outros, o mar traz à praia um homem morto.
As mulheres preparam o cadáver em profundo silêncio. Mas, de repente, uma mulher fala:
- "Se tivesse vivido entre nós, teria de ter curvado sempre a cabeça ao entrar em nossas casas. Ele é muito alto..."
Uma outra mulher:
- "Fico pensando como teria sido a sua voz... Como o sussurro da brisa? Como o trovão das ondas? Será que conhecia a palavra secreta que faz com que uma mulher apanhe uma flor e a coloque no cabelo?".
De novo a voz de outra mulher:
- "Estas mãos... Que será que fizeram? Brincaram com crianças? Navegaram mares? Travaram batalhas? Construíram casas? Será que sabiam abraçar e acariciar o corpo de uma mulher?".
E todas se surpreendem ao perceber que o enterro está se transformando em ressurreição. Sonhos renascidos, cinzas virando fogo, desejos aparecendo, corpos acesos de novo. Os maridos pensam sobre os sonhos que nunca tiveram, os poemas que nunca escreveram, os mares que nunca navegaram, as mulheres que nunca abraçaram sequer na fantasia...
A história termina dizendo que a aldeia nunca mais foi a mesma. De repente os mortos-vivos ressuscitaram. O mesmo céu, o mesmo mar, as mesmas faces, mas tudo está transformado. Sua vida cotidiana, monótona... tudo é transfigurado.
Novos olhos, novos rostos, um novo sentido, um novo prazer, uma nova percepção e uma nova consciência acordam a beleza adormecida. Sonhos, desejos, visões, esperanças, saudades, palavras, imagens, pessoas se levantam do túmulo.
Falamos muito sobre a Ressurreição.
O que realmente aconteceu?
Como? - Quando? - Onde?
Existem argumentos sólidos?
Podemos provar o acontecido no domingo de Páscoa?
O que poderá significar a Ressurreição para nossa vida?
O que significa nossa fé na Ressurreição?
Sabemos que nossa vida é como uma semente, da qual vai brotar, a planta, a palmeira, o coqueiro, a roseira...
Não há comparação entre a semente e o resultado, a flor, o fruto, a colheita. Não há comparação entre o rio e o mar.
Quando morremos, vai nascer uma vida nova, diferente, espiritual, imortal, humana plena pela energia de Deus.
Somos como flores no tempo da primavera chamados à gloria da Ressurreição. A Ressurreição não é apenas o acontecimento do passado ou do futuro, mas a força existencial, atual e permanente de Cristo que atua e vence em nós e através de nós. É o novo sol da Vida e da Esperança. Os primeiros cristãos não tentaram provar ou explicar a Ressurreição.
Simplesmente viviam com alegria a mística da Ressurreição.
Era a LUZ para enxergar além dos horizontes.
O CAMINHO para escalar a montanha da Vida.
O FUNDAMENTO para construir o homem inteiro.
O DINAMISMO para fazer florescer o novo.
A CERTEZA de realizar nossas potencialidades.
A EXPERIÊNCIA da presença invencível de Cristo.
O SIGNIFICADO definitivo de nossa jornada.
O TESOURO que comunica a felicidade.
A GLÓRIA de viver na plenitude de Deus.
O SOL que não conhece o ocaso.
Não podemos separar a ressurreição da Cruz. Optar pela vida significa abraçar a cruz que nasce da luta contra os sofrimentos. A cruz é sempre o símbolo do amor pela vida, esta nossa vida sempre arriscada e ameaçada. Não é Deus quem nos faz sofrer. O sofrimento é consequência de nosso egoísmo, de nosso desamor.
A Páscoa é sempre existencial, ou ela não significa mais nada. À medida que lutamos contra as forças da morte, somos seres pascais.
Vale a pena meditar o que o poeta alemão Goethe disse no passeio de Páscoa de Fausto:
"Eles festejam a Ressurreição do Senhor, porque eles mesmos ressuscitaram".
Viemos de Deus. Somos de Deus.
Vivemos em Deus. Respiramos o sopro de Deus.
Voltaremos para Deus como o rio ao mar, nosso fim e nossa meta, nosso sonho e nossa bem aventurança, nosso renascer na pureza original.
Só em Deus somos plenamente nós mesmos.
Aqui tudo é passagem, êxodo, caminhada.
Nada está definido, realizado, terminado.
Tudo é provisório, efêmero e fugaz.
Estamos sempre a caminho.
Tudo passa. Nós passaremos.
Só o AMOR permanece.
Deus é nossa estação final. Por isso, nosso futuro é imensamente maior do que o passado e nosso presente.
"O que os olhos nunca viram, os ouvidos não ouviram, o coração humano nunca sentiu, Deus preparou para aqueles que O amam".(São Paulo)
"É impossível não crer em Ti,
É impossível não Ti encontrar,
É impossível não fazer de Ti meu ideal."
Frei Clemente Kesselmeier - Convento de Santo Antônio - Rio de Janeiro (RJ) - Páscoa/2004
Ilustração: Ressureição de Cristo / Rafael. 1499-1502
Extraído de http://www.franciscanos.org.br/v3/vidacrista/artigos/ref23.php acesso em 15 fev. 2009.
sexta-feira, 10 de abril de 2009
Celebrar a Páscoa contemporânea
Deu na Revista IHU on-line:

Nesse sentido, o que significa celebrar a Páscoa hoje? De que maneira podemos relacionar o momento pascal com a crise financeira internacional, com a crise ambiental e com a crise múltipla de valores em que nos encontramos? De que nos serve a reflexão proposta pela CNBB na campanha da fraternidade deste ano: a paz é fruto da justiça? Há sentido em celebrar a Páscoa em uma sociedade cada vez mais marcada pela violência? Qual a contribuição da reflexão da Páscoa para a construção de possibilidades de vida digna do ser humano? A morte e a ressurreição de Jesus Cristo têm algum significado para nosso contexto sociocultural? São questões que motivaram o Instituto Humanitas Unisinos- IHU a organizar uma programação de eventos com atividades que buscaram preparar as pessoas para a Páscoa nesse espírito de insistir na importância da reflexão. Ao mesmo tempo, o IHU quer sentir como a Páscoa pode abrir perspectivas para o debate sobre possibilidades e impossibilidades da narrativa de Deus numa sociedade pós-metafísica, uma vez que o Instituto está organizando um simpósio internacional com este tema, a ser realizado em setembro deste ano.
É por ter a dimensão da complexidade da sociedade contemporânea e por acreditar que celebrar a Páscoa é algo mais do que nunca necessário em nossos dias que a IHU On-Line ouviu pessoas de diversas áreas sobre esse tema. Cada uma delas, do seu ponto de vista e a partir de sua visão de mundo, justifica a importância de lembrarmos a morte e a ressurreição de Cristo e o que isso significa para nossas vidas.
Para a teóloga Maria Cristina Gianni, da equipe de Atendimento Espiritual do Instituto Humanitas Unisinos – IHU, festejar a Páscoa tem tudo a ver com o nosso contexto. “Celebramos na Páscoa a ressurreição de um crucificado: Jesus de Nazaré. A páscoa é uma celebração da esperança. Não existe realidade de injustiça e de sofrimento que não possa ser superada pela ressurreição”. Para Cristina, “nosso compromisso como cristãos é viver essa ressurreição para sermos instrumentos, possibilitando que esse renascimento também aconteça onde quer que estejamos: na universidade, no meio do povo, trabalhando pela ecologia. Isso tudo tem sentido, porque quem ressuscitou foi um crucificado”. Cristina destaca que temos hoje, no mundo, “uma natureza que está gritando também para ser libertada, que está sofrendo, por nossa causa, por nossas opções equivocadas. Mas temos como reverter isso. Jesus nos mostra que amando até o fim é possível mudar a realidade de nossa vida, de nossa sociedade”.
Já para o frei Alberto Beckhäuser, da Ordem dos Frades Menores (OFM), doutor em Teologia com especialização em Sagrada Liturgia, pelo Pontifício Ateneu de Santo Anselmo, em Roma, a dificuldade, e até mesmo “incapacidade da sociedade moderna celebrar a Páscoa”, está arraigada na necessidade de acreditar em Jesus Cristo. Ele explica: “Sem fé em Jesus, não podemos celebrar a Páscoa, pois a Igreja celebra a morte e a ressurreição de Cristo e a morte e ressurreição dos que creem e seguem a Cristo”. Na sociedade moderna e pós-moderna, caracterizada pela razão, eficiência, e “onde o único valor parece ser o gozo momentâneo, a Páscoa virou feriadão, virou faturamento na área financeira do consumo de chocolate, de pescado, ou exploração turística do vago sentimento do religioso, do sagrado”, lamenta o professor de Sagrada Liturgia, do Instituto Teológico Franciscano de Petrópolis, Rio de Janeiro. Nesta mentalidade consumista e hedonista, garante, “é praticamente impossível celebrar a Páscoa, pois carece do seu verdadeiro sentido”. E questiona: “Quem é Jesus Cristo? Ele é um guru qualquer, um profeta, um super-homem?”. Segundo ele, “Jesus não causa mais impacto no homem moderno e pós-moderno escravizado pela razão, a ciência, a técnica e o consumismo. A cultura contemporânea exclui o absoluto, a transcendência, Deus. É uma cultura materialista e ateia que coloca sua confiança no próprio ser humano”.
“Páscoa é um evento essencialmente cristão, em uma referência a Jesus de Nazaré, um ser humano histórico que é o verbo de Deus encarnado, pelo qual Deus se fez gente, palmilhou nossos caminhos e viveu e morreu pela causa do Reino.” Esta é a definição que a teóloga e doutora em Teologia Cleusa Andreatta, do Programa Teologia Pública do Instituto Humanitas Unisinos - IHU dá para essa época do ano. Nessa perspectiva, Cleusa percebe que a Páscoa remete para a dimensão de solidariedade a partir da figura de Jesus. “Nesse tempo de Páscoa, celebramos a ressurreição de alguém que passou a vida inteira fazendo o bem, como está dito nos Atos dos Apóstolos. Parece simples, mas, quando olhamos para a trajetória dele, vemos que é toda pautada pela solidariedade. É uma vida entregue de muitas formas em ações concretas pelas pessoas de seu tempo e, além disso, ensinando para todas as gerações posteriores um jeito de ser humano, um jeito de ser gente ao lado de outras pessoas”, reflete. E acrescenta: “Quando olhamos para a prática de Jesus, vemos aquele sujeito que olha os outros seres humanos e age em favor deles, gasta seu tempo, sua energia, e faz dessa ação em favor dos outros um projeto para a vida inteira. Nesse sentido, a Páscoa tem tudo a ver com o tema da solidariedade, mas uma solidariedade que não é apenas de fazer pequenas ações ou alguns gestos. É a solidariedade feita estilo de vida, internalizada como projeto pessoal. É o ato de dar a vida pelo outro por amor. Quem celebra a Páscoa se dispõe a andar nesse caminho, a assumir como estilo próprio algo da prática de Jesus”. E a teóloga encerra sua reflexão identificando como um problema a transformação cultural que vem acontecendo, por meio da qual “vamos perdendo toda a referencialidade desse dado central da vida, morte e ressurreição de Cristo e o que isso significa nesse contexto de Páscoa. Às vezes nos espiritualizamos demais e perdemos essa vinculação com o projeto do Reino como ele é entendido”.
Celebrar a Páscoa em nossos dias significa recuperar os laços da humanidade e da solidariedade que sempre precisamos construir entre nós. Isso se vincula permanentemente com a busca que a sociedade faz de compreender a vida e a verdade, pontua o historiador Solon Viola, professor da Unisinos. Em conversa por telefone com a IHU On-Line, ele sustenta que a solidariedade não é oposta à autonomia do sujeito: “Somos solidários na medida em que decidimos e agimos em direção ao outro, e em reconhecimento desse outro. Nessa dimensão nos humanizamos. Somos seres sociais que precisam radicalmente uns dos outros. Parece-me que, quando o individualismo se opõe à solidariedade, comete-se um equívoco brutal em relação aos seres humanos”. O filósofo Alfredo Culleton, também docente na Universidade, pondera que hoje é tarefa difícil celebrar a Páscoa fora do jogo do consumo, “dos presentinhos, ovinhos, festas, de comer peixe na Sexta-Feira Santa”. Para ele, celebrar a Páscoa em seu verdadeiro sentido é “tentar reviver a passagem, o processo da morte, pensando-a, pensando a dor, a partilha, o sofrimento”.
Ainda sobre a nossa condição humana e a irmandade que temos com nosso semelhante, vale a pena conferir nesta edição e entrevista que o jornalista mineiro Chico Lopes concedeu-nos. Nela, é analisado o clássico Os irmãos Karamazov, obra do escritor russo Fiódor Dostoiévski, e que tem seu desfecho com um apelo à irmandade entre os homens. Nesse momento Aliócha, o filho religioso dos Karamázov, “encontrará irmãos num sentido mais amplo, já não da família, já não da carne e do sangue, mas da humanidade toda”. Dostoiévski, com seu pendor cristão, oferece-nos um final alvissareiro e a esperança em nosso semelhante.
Simbologia Pascal
O professor Solon Viola menciona que a simbologia pascal da distribuição do pão e do vinho podem ser transpostas à nossa sociedade do ponto de vista de uma real e equitativa distribuição de recursos, como moradia, escola e até mesmo a alegria. Essa partilha seria essencial para a dignidade de nossas vidas. Quanto à reflexão que a Páscoa nos convida a fazer, sobre a possibilidade de se falar em Deus numa sociedade pós-metafísica, altamente secularizada, o pesquisador remete-nos à coincidência dessa época com o início da primavera na Europa. “A primavera é o reencontro coma natureza, com a vida, com o desabrochar das plantas, do canto dos pássaros. Nessa medida, Páscoa significa o encontro com Deus, com o outro e com a natureza, algo que é fundamental para nós.”
Culleton recupera o valor da partilha como central em nossa vivência cristã, dizendo que esta é um imperativo no mundo absolutamente desigual e em guerra civil que vivemos. “A partilha, a aceitação do outro, o reconhecimento do limite são valores que nós, cristãos, cultivamos. E a Páscoa é uma oportunidade para reencontrá-los, refleti-los e vivenciá-los”, disse à IHU On-Line.
Outro aspecto que Culleton observou em sua conversa com a redação da IHU On-Line foi que, no Estado do Rio Grande do Sul, “tão civilizado, tão culto, tão cheio de universidades, programas de pós-graduação e senadores honestos, temos um sistema penitenciário que é um escândalo”. A partir dessa realidade, frisou, “precisamos pensar a morte, a agonia que é a presença do Cristo gritando em nosso cotidiano, e nós, inertes, não temos respostas”. E completou: “A Páscoa tem de nos levar a buscar em nosso meio quem é o crucificado, quem é o torturado, quem é o acusado injustamente. Temos escândalos que conseguimos desconhecer, ignorar, ocultar, justificar. Em ano de Campanha da Fraternidade, cujo tema é segurança pública, o sistema prisional é a coisa mais escandalosa que temos no Brasil inteiro”.
Extraído de http://www.unisinos.br/ihuonline/index.php?option=com_tema_capa&Itemid=23&task=detalhe&id=1545
Ilustração: Grünewald, Mathis Gothart. Isenheimer Altar, ehemals Hauptaltar des Antoniterklosters in Isenheim/Elsaß, zweite Schauseite, rechter Flügel: Auferstehung. 1512-1516. acesso em 09 abr. 2009.
quinta-feira, 9 de abril de 2009
O Tríduo Pascal
Deu no Instituto Humanitas-Unisinos:Da Quinta-feira santa ao domingo da Páscoa, os cristãos celebram o mistério central de sua fé: a morte e a ressurreição de Cristo. Segue a matéria de Élodie Maurot publicada no jornal francês La Croix, 06-04-2009. A tradução é do Cepat.
O que é o Tríduo Pascal?
O tríduo pascal é o período de três dias durante o qual os cristãos celebram o centro de sua fé, a morte e a ressurreição de Jesus Cristo. Esse termo vem do latim (tres “três” e dies “dia”).
O tríduo pascal começa na quinta-feira santa e termina no dia da Páscoa, depois das vésperas. Esses três dias constituem o centro de gravidade de todo o ano litúrgico. Sucessivamente, os cristãos comemoram a última ceia de Cristo com os seus discípulos, a prisão, crucificação e seu sepultamento e depois a sua ressurreição dentre os mortos.
Esses três dias formam um conjunto fortemente simbólico: recordam aqueles acontecimentos evocados no Evangelho de João. Jesus, tendo expulsado os vendilhões do Templo é interpelado pelos judeus para que manifeste a autoridade em nome de quem realizou esse gesto em Jerusalém, ao que lhes responde: “Destruí esse santuário e em três dias eu o reconstruirei”. Prefigurando a sua ressurreição, o evangelista precisa: “Ele falava do santuário de seu corpo” (Jo 2, 18-21).
Por que esses três dias?
A Igreja celebra num único e mesmo movimento a paixão, morte e ressurreição de Cristo. Ela manifesta assim a relação essencial entre a maneira de Jesus viver e morrer, “dando a sua vida por seus amigos” (Jo 15, 12), e sua ressurreição dentre os mortos. Isso manifesta que a existência de Jesus, tal como foi vivida até a cruz, é acolhida e salva por Deus.
“A ressurreição não significa o começo de um novo período na vida de Jesus (...), mas precisamente a dimensão definitiva permanente e salva da única vida singular de Jesus”, escreveu o teólogo Karl Rahner (Curso Fundamental da Fé, p. 315).
O que é celebrado na Quinta-feira Santa?
Na noite da quinta-feira antes da Páscoa, os católicos celebram a Ceia, a última refeição de Jesus com os seus discípulos, na qual lhes anuncia que vai entregar a sua vida livremente e por amor. Essa entrega é significada de maneira diferente pelos quatro Evangelhos. Marcos, Mateus e Lucas mostram Jesus partilhando com os Doze pão e vinho, que representam o seu corpo e o seu sangue.
No Evangelho de João, esta cena está ausente, e a entregue de Jesus é traduzida pelo gesto do lava-pés. Jesus assume assim a situação de servo e deixa aos seus discípulos este testamento: “Pois é um exemplo que eu vos dei: o que fiz por vós, fazei-o vós também” (Jo 13, 15).
Fiel à memória de Cristo, a Igreja procede, na noite da Quinta-feira santa, ao rito do lava-pés e celebra solenemente a Eucaristia. No fim da missa, os fieis prosseguem a sua oração acompanhando Jesus na noite de sua prisão no Jardim das Oliveiras. “Eis o que distingue os cristãos dos pagãos”, escreverá o teólogo Dietrich Bonhoeffer. “‘Não podeis vigiar uma hora comigo?’, pergunta Jesus no Getsêmani. É o contrário de tudo o que o homem religioso espera de Deus”.
O pastor alemão via nisso o sinal de uma vida cristã liberta dos ídolos: “Deus é impotente e frágil no mundo, e assim somente ele está conosco e nos socorre”.
A Sexta-feira Santa é um dia de morte?
Não apenas isso, porque nesse dia os cristãos celebram o amor extremo de Deus. Eles celebram a “kénose” de Deus, sua humilhação que vai até a cruz para reunir os homens. Nesse gesto radical de humildade, que inverte a visão pagã de um deus dominador, os cristãos recebem a revelação de um Deus que é amor.
Durante este dia, os cristãos acompanham Jesus em sua Paixão, relendo comunitariamente o relato de sua prisão e morte. Ao longo do ofício, a liturgia prevê um gesto de veneração da cruz. Desde o fim da Idade Média, a prática da via-sacra se difundiu largamente. Isso acontece depois do meio-dia da sexta-feira e consiste numa peregrinação em catorze (ou quinze) estações.
O Sábado Santo é um dia “vazio”?
O Sábado santo é o único dia do ano litúrgico em que não se realiza nenhum ofício coletivo, exceto a liturgia das horas (oração do breviário). Nenhum sacramento é celebrado. É um dia de silêncio e de recolhimento, um dia de espera.
A Tradição o associa “à descida aos infernos”, particularmente presente na espiritualidade bizantina: o Cristo reúne os mortos que permaneceram longe de Deus, a começar por Adão e Eva, para associá-los à libertação iminente de sua ressurreição. O Sábado santo é também consagrado aos preparativos da Festa da Páscoa nas famílias e comunidades cristãs.
O que é celebrado na vigília pascal?
Na Páscoa – celebrada tanto na liturgia noturna do Sábado santo como no domingo da Páscoa –, a Igreja celebra a ressurreição de Jesus, sua “passagem” da morte à vida. Segundo a fé cristã, Deus não deixou seu Filho crucificado na cruz. “Deus o ressuscitou”, “Deus o glorificou”, “Deus o restabeleceu” da morte – estas são as palavras em grego utilizadas pelo Novo Testamento – quem deu a sua vida por amor ao seu Pai e aos homens.
Para os cristãos, essa vitória sobre a morte concerne toda a humanidade. “Pois sabemos: aquele que ressuscitou o Senhor Jesus, também nos ressuscitará com Jesus”, escreve Paulo aos Coríntios (2Cor 4, 14). Este anúncio de uma vida em abundância, mais forte que a morte, é a salvação, a “boa nova” festejada na Páscoa.
Extraído de http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=21272 acesso em 09 abr. 2009.
Ilustrações:
- Heilig-Blut-Altar in St.Jakob in Rothenburg. Letztes Abendmahl / Wolfgang Sauber
Liebfrauenkirche, Ravensburg
- Südliches Glasfenster („Ankenreute-Fenster“) von Peter Hemmel von Andlau, 1477–1478, Kreuzigungsszene
- A Ressurreição de Cristo / Rafael Sanzio. Museu de Arte de São Paulo.
quarta-feira, 8 de abril de 2009
Páscoa / entrevista com Maria Clara Bingemer

Deu na Conexão Professor:
“Mesmo quem não crê é obrigado a admitir: o mundo era um antes de Jesus Cristo e é outro depois dele.” A afirmação de Maria Clara Bingemer, teóloga, professora e decana do Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio, ajuda a entender o significado e a importância da Páscoa. Se Jesus mudou o mundo, é natural que uma das passagens mais importantes de sua história, a ressurreição, tenha dado origem à festa máxima do Cristianismo.
Nesta entrevista ao Conexão Professor, Maria Clara, que é autora de diversos artigos e livros, fala sobre o significado da Páscoa e traça um paralelo entre o tempo de Cristo e os dias atuais. Embora haja muitas diferenças – determinadas, sobretudo, pela evolução tecnológica – ela aponta semelhanças e compara o sofrimento de Maria com o das mães que perdem seus filhos de maneira violenta.
Lembrando que Cristo usava as parábolas como recurso pedagógico, Maria Clara acredita que hoje a internet e a TV digital poderiam ser os métodos e processos que Ele utilizaria para transmitir o conteúdo fundamental que trouxe ao mundo: a afirmação do amor incondicional de Deus por todos os homens e mulheres.
Conexão Professor (CP) - Para o Cristianismo/Catolicismo, qual o significado da Páscoa?
Maria Clara Bingemer - A Páscoa é a festa máxima do Cristianismo. Ela celebra a ressurreição de Jesus Cristo, filho de Deus encarnado, da morte para a vida definitiva. Celebrando isto, celebra também a convicção de fé de que os seres humanos, do qual Deus se fez definitivamente próximo em Jesus de Nazaré, também não devem ver na morte um ponto final de suas vidas.
Ou seja, com a ressurreição de Jesus de Nazaré, em quem a comunidade cristã primeira reconheceu e proclamou o Cristo de Deus, não apenas Deus Pai pronuncia sua palavra definitiva sobre a história, declarando que a vida vivida no amor radical e até as últimas consequências não morre, como também a Humanidade pode ter uma risonha esperança de que seu destino é viver para sempre com Deus graças a seu filho Jesus Cristo e à salvação que ele trouxe a todos os seres humanos. A festa da Páscoa celebra tudo isto.
CP - É possível fazer um paralelo entre o tempo de Cristo e os dias de hoje?
Maria Clara Bingemer - Sim. Embora havendo grandes diferenças – Cristo viveu numa era pré-técnica, hoje vivemos numa época de grandes progressos tecnológicos, por exemplo - há muitas semelhanças. Havia naquele tempo e há hoje grupos que, desde o poder, oprimiam e excluíam os mais fracos, os diferentes: leprosos, doentes, crianças, mulheres.
Havia, e ainda há, alguns possuindo muito e muitos possuindo pouco ou quase nada, tendo falta do necessário até mesmo para sobreviver. Havia, e há, gente boa e esperançosa, aberta e humilde, que esperava as promessas de Deus e a realização de seu reino e que por isso escutaram a mensagem de Jesus. Por isso, ontem como hoje, havia, e há, pessoas que voltaram as costas à mensagem pascal de Cristo e pessoas que a ela aderiram e entraram no movimento de seu amor redentor que transforma a História humana.
CP - No período da Páscoa, o martírio de Maria é próprio e especial. De forma bastante resumida podemos dizer que é uma mãe que perde seu filho para um mundo injusto. Situação que, infelizmente, se repete hoje em muitas famílias. Qual foi a reação de Maria e como esta reação pode servir de exemplo para a nossa sociedade?
Maria Clara Bingemer - Eu não diria martírio de Maria e sim sofrimento de Maria. Martírio é uma palavra teológica técnica e significa aqueles que morreram de morte violenta, derramando seu sangue para dar testemunho de sua fé cristã. Maria padeceu uma dor indizível com a paixão e morte de seu filho, e sua situação e dor se repetem sem dúvida hoje com muitas mulheres que perdem seus filhos de maneira violenta ou veem seus filhos condenados a uma subvida por falta de recursos e condições de dar-lhes algo melhor. Maria não fraquejou nem perdeu a esperança um só minuto. Ela não entendia nada do que acontecia, mas conhecia profundamente o seu Deus. Por isso ela esperava no Senhor seu Deus. Acompanhou seu filho até o fim e pôde viver plenamente a alegria de sua ressurreição. Ficou junto com os discípulos de seu filho após sua morte e pôde viver com eles plenamente a alegria da ressurreição, assumindo junto com toda a comunidade de seguidores de seu filho a missão a ela confiada.
CP – Jesus, Maria e Judas são personas de bastante força alegórica, assim como histórica. Um salvador, uma mulher forte e um traidor. Além da literatura sacra, este enredo influenciou inclusive a literatura geral. Como a senhora vê esta influência? Como a história de Cristo está presente na literatura?
Maria Clara Bingemer - Na literatura universal há muitas vidas de Cristo célebres: a de René Bazin é uma. Há filmes também. Mas há versões mais atuais na literatura e no cinema que contam a vida de Jesus de uma maneira mais adaptada aos tempos modernos que permite às pessoas de hoje identificarem-se com Jesus como se fosse um contemporâneo seu. Por exemplo, Frei Betto tem uma vida de Jesus intitulada “Entre todos os homens”. Muito boa. Ele pôs o nome de seus amigos nos personagens. Até eu sou personagem desse romance.
No cinema temos o filme canadense de Denys Arcand, “Jesus de Montreal”, que mostra Jesus entre um grupo de jovens no submundo de Montreal, Quebec (Canadá). Ou “Godspell”, que conta a história de Jesus como se fosse um hippie em meio a um grupo hippie dos anos 60 em Nova York. Tudo isso só demonstra como 2 mil anos depois esse Galileu que marcou para sempre a História da Humanidade continua atraindo as atenções para si mesmo. Mesmo quem não crê é obrigado a admitir: o mundo era um antes de Jesus Cristo e é outro depois dele.
CP - Durante sua vida, Cristo optou por parábolas para passar sua mensagem. Podemos entender que já naquela época ele também revolucionou processos educativos?
Maria Clara Bingemer - Sem dúvida. Falar em parábolas era um recurso pedagógico importantíssimo, para que o povo pudesse compreender o alcance de sua mensagem, revestida de elementos que faziam parte do seu cotidiano.
Assim, para um povo do campo, numa sociedade agrária, ele falava de semente, grão de mostarda etc. Se fosse hoje, falaria de internet, TV digital, globalização. Certamente encontraria métodos e processos para poder transmitir aos seus ouvintes o conteúdo fundamental que trazia: a boa nova do Evangelho, que afirmava que Deus é Pai e que ama incondicionalmente todos os homens e mulheres que vêm a este mundo. E lhes oferece como dom uma vida que não termina nunca e que é baseada apenas no amor.
Extraído de http://www.conexaoprofessor.rj.gov.br/educacao-entrevista-15.asp acesso em 08 abr. 2009.
quinta-feira, 2 de abril de 2009
Liturgia pascal, hoje. A matéria como lugar do divino
Deu no Instituto Humanitas-Unisinos:
Para melhor agir, pensar e sentir a liturgia da Vigília Pascal, a Profª. Drª. Ione Buyst, irmã religiosa e doutora em teologia dogmática com concentração em liturgia pela Pontifícia Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo, está presente no IHU para ministrar dois minicursos, como parte da programação da Páscoa IHU 2009.
![]() Profª. Drª. Ione Buyst |
Ir. Ione, que é membro e co-fundadora da Associação dos Liturgistas do Brasil e assessora de cursos de formação litúrgica em todo o país, destacou que a importância da liturgia nas celebrações é justamente unir estas três ações: o agir-fazer, o pensar-saber e o sentir-viver. Dessa forma, explicou, é que o mistério de cada celebração pode ser celebrado com a inteireza do ser – consciência, vontade e sentimento.
A importância que a liturgia tem, nesse sentido, é aquilo que os liturgistas chamam de mistagogia, ou seja, conduzir para dentro do mistério. Porém, muitas vezes, a formação litúrgica, especialmente nos seminários, promove uma separação entre teoria e prática, o que é justamente a morte da liturgia, destacou Ir. Ione, que também é professora da pós-graduação em pedagogia catequética na Universidade Católica de Goiás e autora do livro "Música ritual e mistagogia" (Paulus), em parceria com Joaquim Fonseca.
Um dos exemplos destacados pela liturgista é o próprio sinal da cruz, tão importante para os cristãos. Esse sinal, afirmou Ir. Ione, resume uma profunda teologia da cruz: quem o faz está se crucificando junto com Cristo. O cristão que se expressa dessa forma demonstra claramente o seu desejo de seguir Jesus, inclusive, se necessário, até a morte. Mas quantos cristãos se dão conta disso ao fazer o gesto?
Essa expressão corporal tem grande importância para a liturgia, não apenas a cristã. Segundo Ir. Ione, a liturgia alimenta a dimensão sagrada do corpo, que, na teologia cristã, é "templo do Espírito", afirmou. Corpo e liturgia são duas dimensões relacionadas e necessárias.
Torna-se necessário, assim, compreender a liturgia como um ato de fé, ou seja, a liturgia forma o fiel. Mas para isso, destacou Ir. Ione, é necessário dialogar com os ritos, ou, em suas palavras, "subjetivar a objetividade do rito".
Aqui entra uma nova compreensão da liturgia, chamada de teologia sacramentaria ecológica. Segundo Ir. Ione, nessa interpretação teológica o cosmos é um sacramento primordial, em uma busca mais profunda por um diálogo com as demais religiões, com uma preocupação central com a ecologia – em suma, com todo o cosmos. Isso estaria, inclusive, em sintonia com o que os estudos da teoria quântica vêm revelando, explicou a liturgista. Ir. Ione comentou que os estudos mais avançados da física revelam que não há uma divisão sensível entre matéria e espírito. O desafio, para a liturgia, é também ver a matéria como o lugar da divindade, como o lugar da revelação de Deus, como defendeu e vivenciou Teilhard de Chardin.
Porém, tudo isso foi apenas uma introdução. A vivência litúrgica, destacou Ir. Ione, é vivida na prática, com criatividade, com o silêncio, os gestos, a palavra. Com técnicas de relaxamento e aquecimento, motivações verbais, cantos, mas principalmente a vivência experimental, prática, de um determinado rito. A ação de cada participante, por isso, foi muito necessária ao longo do dia, não apenas como atitude interior, mas também colocando "a mão na massa". Citando o conceito de "homo ludens", de Johan Huizinga, apresentado ainda na década de 30, Ir. Ione defendeu que a liturgia também é uma forma de expressão do caráter lúdico do ser humano. Como em uma brincadeira – teologicamente embasada e revivida a partir da tradição.
O minicurso e a vivência litúrgica continua nesta quinta-feira, das 8h30 às 16h30, na sala 1G119, na Unisinos. Confira aqui outros eventos que compõem a Páscoa IHU 2009, que segue até o dia 26 de abril.
(Reportagem de Moisés Sbardelotto)
Extraído de http://www.unisinos.br/ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=21079 acesso em 02 abr. 2009.