Frei Almir Ribeiro Guimarães,OFM (*)Os franciscanos gostam sempre de evocar o começo de tudo na história de Francisco. Francisco, nos inícios de sua aventura espiritual,deixou as coisas do mundo depois de encontrar-se com o farrapo humano chamado leproso.

Perguntaram-lhe: “Em que estás pensando? Por que não nos segues? Por acaso pensar em casar-te?” E Francisco respondeu-lhes: “Dissestes a verdade, eu estava pensando em escolher uma esposa, a mais nobre, a mais rica, a mais bela que jamais vistes”. Os seus amigos não fizeram conta do que falava. “Francisco disse isso não por si mesmo, mas inspirado por Deus; pois essa esposa era a verdadeira religião que abraçou, mais nobre, mais rica e mais bela que as outras por causa da pobreza” (n.8).
2. Assim, as coisas iam mudando no fundo do coração desse jovem da Úmbria que, mais tarde, viria a se tornar cópia viva de Cristo, o Cristo redivivo. Foi sendo atraído pela figura do Mestre, que seduzia por seu despojamento, que encantava pela singeleza pobre de seu nascimento e de sua morte, figura gloriosa e doloridamente chagada. Cristo Jesus, o Filho do Altíssimo e o Filho da Virgem pobrezinha, da paupercula iria aos poucos se manifestando a Francisco e ocupar todo o espaço de seu interior..
3. Como, de fato, tudo começou? Francisco responderá a esta pergunta mais tarde, nas primeiras linhas de seu Testamento. Foi assim: “Como estivesse em pecado, parecia-me deveras insuportável olhar para leprosos. E o Senhor mesmo me conduziu entre eles. Enquanto me retirava deles o que antes me parecia amargo, se me converteu em doçura da alma e do corpo. E depois disto demorei só bem pouco tempo e abandonei o mundo” (Testamento 1-3).
4. Dentro do coração do jovem Francisco uma dupla experiência: experiência de um vazio interior experiência da indigência e da pobreza manifestada na carne e no semblante do leproso. Francisco fala em deixar o mundo da vaidade, da posse, da busca do poder, do fascínio pelos bens e pelo dinheiro, da vontade de aparecer e dominar. Francisco experimenta uma doçura diferente quando Cristo aparece em sua intimidade e brada e berra na vida e na história do leproso. Depois dessa experiência começava para Francisco uma nova vida que ele chamaria de vida de penitência, caminho de júbilo e de felicidade. Mais tarde, bem mais tarde, quando a irmã [morte] já não estava tão distante, haveria ainda de exprimir a saudade daqueles tempos: “Queria voltar a servir os leprosos e a ser desprezado como nos primeiros tempos. Queria fugir do convívio das pessoas e ir para lugares mais afastados, para se livrar de todos os cuidados e preocupações com outras coisas” (1Celano 103).
5.Tudo começou com o encontro e a acolhida do leproso, do que é doído, pequeno, insignificante e desprezado. Esse leproso que antes causava repugnância a Francisco passou a ser o símbolo do começo de uma vida esplendorosa e luminosa. O doce se transformou em amargo e o amargo, em doce. Em nossos dias, em nossa sociedade de consumo, de aparências, de vazio há homens e mulheres, rapazes e moças fazendo a experiência de viver e conviver com os mais excluídos da face da terra. Há esse rapaz, esse estagiário de medicina que acompanha os idosos de um miserável asilo de trapos humanos envelhecidos e abandonados. Há essa moça que visita presídios femininos e dá cursos para as encarceradas. Há pessoas fazendo hoje a experiência do amargor que se torna doçura.
Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM, é Assistente Nacional da OFS pela OFM e Assistente Regional da OFM na Região Sudeste II
Extraído de http://www.franciscanos.org.br/noticias/noticias_especiais/2008/almir_070808/artigos_02.php acesso em 7 set. 2008.
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