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quarta-feira, 25 de julho de 2007

Pedreiros na construção da memória de Dom Helder

http://www.adital.com.br/site/noticia.asp?lang=PT&cod=28678 acesso em 25 jul. 2007.
Eduardo
Hoonaert *

Adital - O grupo ‘Igreja Nova’, de Recife, já está se preparando para iniciar o ano preparativo ao centenário de nascimento de Dom Helder Camara que ocorrerá no dia 9 de fevereiro de 2009. No próximo mês de agosto será lançada, em Recife, por ocasião da Semana Teológica que Igreja Nova organiza cada ano, a idéia de se intensificar a memória do grande bispo por meio das mais variadas iniciativas.

Penso que esse apelo vem em boa hora. O conhecimento que se tem da figura de Dom Helder, mesmo nos meios católicos, nem de longe corresponde à importância de sua figura episcopal para o Brasil e a América Latina de hoje.

Isso se deve, principalmente, ao silêncio da grande mídia acerca dele. A cada dia que passa, percebemos melhor que ela pode ser considerada o poder público número um no mundo em que vivemos. Um poder que não pára de crescer. Somos diariamente bombardeados(as) por palavras, imagens, sinais e símbolos produzidos por um punhado de gente, mas que fazem a cabeça de milhões de pessoas, sempre sob aparências atrativas e, ao mesmo tempo, enganosas. O que aparece na TV acontece, o que não aparece na telinha não acontece. O público não toma conhecimento e ninguém fala do assunto. Perde-se aos poucos uma memória não cultivada. Diante desse quadro fica claro que não será fácil conseguir com que se propague a figura de Dom Helder por meio da grande mídia. Pois a mensagem do Dom não combina com a dos grandes meios de comunicação. Mesmo assim, figuras como Gandhi, Mandela e Madre Teresa conseguiram romper essa barreira, o que não deixa de ser um dado que merece reflexão.

Existe, é verdade, uma mídia alternativa, que se comunica com segmentos mais esclarecidos da sociedade. Revistas como Carta Capital e Caros Amigos, por exemplo, constituem uma alternativa às grandes revistas como Veja, Isto É e Época. Carta Capital consegue uma tiragem de 65.000 exemplares semanais, o que não é pouco. Essa mídia é alimentada por bons jornalistas e, por conseguinte, é capaz de colaborar com bons textos e boas imagens sobre Dom Helder, o que constitui uma possibilidade de propaganda que não pode ser desprezada.

Há também a ‘mini-mídia’ dos boletins das igrejas e dos movimentos sociais, assim como os ‘sites’ correspondentes na Internet. Essa mídia alcança um público restrito, mas dinâmico, capaz de influenciar um amplo círculo de pessoas. Penso que se faz um bom trabalho nesse nível e que surgirão na ‘mini-mídia’ interessantes iniciativas em torno do centenário de Dom Helder.

A igreja católica, de seu lado, dispõe do dispositivo da canonização, capaz de divulgar amplamente a memória de figuras que ela julga capazes de dinamizar a memória do povo católico. Embora o poder memorial da canonização tenha diminuído nos últimos tempos, mesmo assim se trata de um dispositivo não desprezível. Nos últimos quarenta anos, o cristianismo latino-americano foi beneficiado pela ação de uma geração excepcional de bispos-profetas, como Oscar Romero, Leônidas Proaño, Méndez Arceo, Luciano Mendes, Antônio Fragoso, Enrique Angelelli, Helder Camara, Manuel Larraín e outros. Mas, as atuais autoridades romanas não se mostram dispostas a celebrar a memória desses bispos.

O papa canonizou recentemente Frei Galvão, uma figura desconhecida entre nós, enquanto um mártir como Dom Romero não é contemplado. Outro bispo-mártir, Dom Angelelli (da Argentina), continua desconhecido. O processo de beatificação do padre Ibiapina, a maior figura sacerdotal da igreja brasileira, parece não avançar. Muitos católicos nem sabem quem foi Ibiapina. O mesmo acontece com o padre Cícero e o beato Antônio Conselheiro, ainda considerados - em muitos ambientes - figuras erráticas. É verdade que, no tocante a processos de beatificação e canonização, o clero diocesano está em desvantagem em relação ao clero religioso que mantém uma estrutura mais estável de ativação da memória. Nesse ponto, Dom Helder perde, em comparação com Madre Teresa ou Irmã Dulce.

Essa situação concreta constitui um apelo para nós. A memória é uma construção. Sem pedreiros, nenhuma construção se eleva do chão. Penso que somos, todos e todas, pedreiros e pedreiras (sem equívoco) da construção da memória de Dom Helder e que cada tijolo que conseguimos colocar - ou simplesmente trazer - pode ser um aporte importante.

* Historiador

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