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quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

Blog Jufra Brasil Regional Nordeste A3 (PB, RN)

TUGÚRIO













TUGÚRIO

Para nós o que é a pobreza?
Não sabemos o que ela é...
Basta olharmos pra São Francisco
e aprendermos o que Deus quer...

Pobreza em São Francisco é amar o Crucificado...
Morrer para o pecado e dizer sim a Deus...
É o perdão recebido...
É itinerário pra o céu.

Pobreza em São Francisco não é romantismo
É vencer-se a si mesmo a cada dia...
É também alegria da permanência em Deus...

Pobreza em São Francisco
é liberdade que espera...
Persiste e persevera no bem prometido...
É lutar contra o inimigo que não se dá por vencido...

Pobreza em São Francisco é experiência mística...
É riqueza escondida...
É sentido de vida...
Para quem a encontra,
é glória de Deus...

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


segunda-feira, 27 de dezembro de 2010

Blog Jufra Brasil Regional Norte 3 (PA Oeste)

Não haverá paz no mundo sem teologia do pluralismo religioso

Entrevista especial com José María Vigil

Em 2011, no dia 8 de fevereiro, o Fórum Mundial de Teologia e Libertação (FMTL) irá celebrar, dentro do Fórum Social Mundial (FSM), em Dakar, no Senegal, uma oficina sobre "Religiões e Paz: A visão/teologia necessária para tornar possível uma Aliança de Civilizações e de Religiões para o bem comum da humanidade e a vida no planeta".
A oficina está sendo organizada pela Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo (ASETT/EATWOT), por meio de sua Comissão Teológica.

Para compreender a importância desse debate na atual conjuntura mundial e eclesial, a IHU On-Line entrevistou por e-mail o responsável pela Comissão Teológica da ASETT na América Latina, o teólogo espanhol José María Vigil.

A constatação do teólogo é clara: "As religiões não dialogam; coexistem simplesmente". Por isso, a oficina será um espaço para abordar "o próprio coração das religiões", a "mudança interna que elas têm que realizar na sua 'visão' (ou teologia, no vocabulário cristão) para poder superar o bloqueio que atualmente as paralisa", explica Vigil. Segundo ele, "isso se chama 'teologia do pluralismo religioso'", ou seja, "teologizar" sobre o significado da pluralidade de religiões.

Para facilitar a participação e o debate, a ASETT disponibilizou as conferências resumidas de vários especialistas que serão apresentadas sobre a temática proposta na oficina do ano que vem. O sítio do IHU, em suas Notícias do Dia, está disponibilizando as principais conferências a respeito da temática.

José María Vigil é teólogo espanhol claretiano, naturalizado nicaraguense e que vive atualmente no Panamá. É o responsável pela Comissão Teológica na América Latina da Associação Ecumênica de Teólogos/as do Terceiro Mundo (ASETT/EATWOT) e colabora com o sítio Servicios Koinonía, além de coordenar todos os anos a edição da "Agenda Latino-Americana Mundial". Estudou teologia em Salamanca e em Roma, e psicologia em Salamanca, Madri e Manágua, e é doutor em educação em novos paradigmas pela Universidade La Salle de San José, Costa Rica. Dentre seus livros, destacamos Teologia do pluralismo religioso. Para uma releitura pluralista do cristianismo (Paulus, 2006, 469 páginas).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Em 2011, será realizada a oficina "Religiões e Paz: A visão/teologia necessária para tornar possível uma Aliança de Civilizações e de Religiões para o bem comum da humanidade e a vida no planeta", dentro da programação do FSM. Qual o objetivo de fundo para propor este debate hoje?

José María Vigil – Em Dakar, o FSM terá duas frentes de atividades. Uma será pública e aberta, organizando e realizando "atividades autogestionadas" como as que farão outras muitas entidades e movimentos. E outra frente será um "seminário de elaboração teológica", uma atividade própria e interna, com a participação de teólogos e teólogas vindos de todo o mundo, representando entidades, movimentos, universidades, associações, para dar uma contribuição de produção teológica mesmo, que versará desta vez sobre o futuro da teologia.

A oficina "Religiões e Paz" pertence à primeira frente de atividades do FMTL no FSM, e é uma das mais de dez oficinas semelhantes, sobre temáticas diferentes, devidas à iniciativa do FMTL. A realização concreta dessa oficina foi encomendada à ASETT ou EATWOT e já começou na sua fase que podemos chamar de “telemática”.

"O grande problema para as religiões não é externo, mas sim interno. É ideológico, teológico, epistemológico"

O objetivo de fundo é fazer avançar o aprofundamento da consciência que todos nós temos cada vez mais clara da urgência de pôr as religiões a trabalhar juntas pela paz do mundo e pelo bem-estar da vida no planeta. É um tema que já se tornou lugar-comum nas últimas décadas: as religiões não dialogam; coexistem simplesmente, não conseguem apagar os muitos focos de conflitos inter-religiosos que ainda ardem no mundo atual e não se dão conta de que a emergência ecológica na qual estamos é provocada por um sistema social, por ideologias e por concepções sobre a nossa relação com a natureza, elementos que, em boa parte, têm sido criados pelas religiões. Essa oficina programada pelo FMTL quer questionar, em um foro tão amplo como o FMS, a necessidade de conscientizar sobre essa problemática, de elaborar a "visão ou teologia necessárias", e não de nos acostumar à falta atual de diálogo.

IHU On-Line – E qual seria a conjuntura concreta ou o aspeto concreto ao qual ela se dirige?

José María Vigil – Dentro desse grande objetivo, a oficina "Religiões e Paz" quer se concentrar no aspeto profundo e interno, diríamos teológico. Não quer ser uma conversa sobre as condições sociopolíticas conjunturais atuais das possibilidades do diálogo e da paz, mas das condições internas que permitem ou bloqueiam o diálogo das religiões, além ou antes de as condições sociopolíticas permitirem. Quer dizer: o grande problema ou obstáculo para as religiões se falarem, dialogarem, se unirem... não é externo, mas sim interno. É ideológico, teológico, epistemológico até.
Mesmo que duas religiões estejam em boa vizinhança, com frequência não dialogam, nem podem dialogar. Podem se levar bem e, no máximo, como se viu claramente em Assis, podem se convocar para rezar juntas em uma mesma cidade, mas em separado, e fazer depois uma fotografia todas juntas, mas só até aí. Diálogo religioso mesmo – perguntarem-se mutuamente a respeito do que pensam de si e das outras, tentar encontrar os elementos "homeomórficos" (que têm uma função semelhante) em cada uma delas e que talvez compartilham, se estudarem mutuamente, se perguntarem sobre o que poderiam e deveriam fazer juntas para animar a humanidade a se superar e a superar o momento atual –, isso, infelizmente, não está sendo feito. Estão paralisadas. Nenhuma sabe como se poderia fazer.

E têm alguma coisa dentro que as continua paralisando: o complexo de superioridade, a convicção de ter a verdade total e não poderem apreender nada das outras, a consciência de serem cada uma "a única religião verdadeira" ou "a melhor", ou aquela à qual todas as outras devem vir a se converter... Não podem dialogar mais do que em aparência formal.

IHU On-Line – Isso se deve a algum medo?

José María Vigil – Sim, mas não só, nem principalmente. Nós achamos que o principal fator é, como dizia, interno, ideológico, epistemológico. As religiões têm vivido a sua história toda sobre a convicção de serem, cada uma, a única, a verdadeira, a universal, a perfeita, a que sabe tudo e não tem nada a aprender de ninguém... (Não todas da mesma maneira, obviamente. As religiões não são iguais nem dizem a mesma coisa, como o igualitarismo pretenderia).


"Por que existem religiões e não só a minha, que era a 'única verdadeira'?
As outras têm valor?"

Sendo essa tradição histórica, milenar até, as religiões não podem mudar de uma hora para a outra. (Há algumas poucas décadas o mundo virou mundializado e irreversivelmente multicultural e multirreligioso.) Precisam digerir, processar em uma outra forma aquela autocompreensão tradicional, que já não é sustentável no mundo atual. Mas o que fazer com aquela herança que as religiões receberam como intocável, por ser revelada e imutável? Eis aí o problema, que é interno, independentemente da boa ou má relação com a religião vizinha, independentemente das boas ou más propostas da ONU para uma Aliança de Civilizações e religiões... É outro nível.

IHU On-Line – Para esse debate, parte-se das propostas da teologia pluralista ou da teologia do pluralismo religioso – TdPR. Em que consiste, em linhas gerais, essa teologia?

José María Vigil – Sim, esse é o foco, a perspectiva formal da oficina: não vamos falar de conjuntura internacional, de condições sociopolíticas nem interculturais (mesmo sendo tudo isso muito importante). Mas falaremos do próprio coração das religiões, da mudança interna que elas têm que realizar na sua "visão" (ou teologia, no vocabulário cristão) para poder superar o bloqueio que atualmente as paralisa.

Isso se chama "teologia do pluralismo religioso": consiste em "teologizar", ou seja refletir sobre o significado que pode ter o pluralismo religioso, a pluralidade de religiões: por que existem religiões e não só a minha religião que eu fui ensinado que era a "única verdadeira"? As outras têm valor? Têm valor por si mesmas ou o recebem da minha? Posso reconhecê-las como válidas, ou tenho que procurar convertê-las? E se posso reconhecê-las, como ficam então a unicidade e "absoluticidade" que a minha religião sempre proclamou? Nessa reflexão toda consiste a teologia do pluralismo religioso.

Como se vê, não é a mesma coisa que o "diálogo inter-religioso". Uma coisa é refletir sobre a pluralidade religiosa ("teologia do pluralismo religioso"), e outra, dialogar mesmo com outra religião. Sem a transformação de mentalidade que essa reflexão vai provocar, não será possível "dialogar" verdadeiramente com outra religião, porque será um diálogo de surdos, aparente diálogo daqueles que pensam – cada um – que só eles têm a verdade e que o outro não é interlocutor religioso válido. Por isso nós dizemos que a teologia do diálogo inter-religioso é um "intradiálogo", um diálogo que uma religião deve fazer consigo mesma antes de dialogar com outra, para que o diálogo possa ser viável e frutífero.

IHU On-Line – De que forma a TdPR se relaciona com a Teologia da Libertação – TdL?

José María Vigil – Não é que se relacionam, senão que têm que ser relacionadas. Em princípio, são teologias independentes, estão em paradigmas diferentes, diríamos que não têm nada a ver. Pode-se ter uma teologia muito libertadora e nada pluralista... De fato, a TdL clássica, a que conhecemos, está no paradigma inclusivista, que era comum na época; não é teologia pluralista.

"Uma coisa é refletir sobre a pluralidade religiosa, e outra, dialogar mesmo com outra religião"
Eis aqui a tarefa a ser desenvolvida: cruzar, confrontar a TdL clássica – que é inclusivista – com a TdPR, quer dizer, repensar, refazer a TdL além do pressuposto inclusivista. Ou seja, elaborar uma TdL pluralista, não mais inclusivista. E isso não é fácil, nem fica garantido pelo fato de sermos teólogos/as da TdL. É como no caso do paradigma feminista: um teólogo/a pode ser muito libertador/a no âmbito socioeconômico... e ter mentalidade patriarcalista. Uma visão não implica a outra, estão em paradigmas ou níveis diferentes. Deve-se dar um salto de consciência e assumir o novo paradigma, uma nova forma de ver – a pluralista –, o que irá causar uma verdadeira comoção...

A ASETT assumiu no ano 2001, na sua Assembleia Geral ocorrida em Quito, o desafio de provocar esse cruzamento entre a TdL e a TdPR, e decidiu aquele projeto de pesquisa e elaboração teológica que deu como fruto a coletânea de cinco volumes chamada Pelos muitos caminhos de Deus, felizmente completada neste mesmo ano de 2010.

IHU On-Line – Em sua opinião, o que as religiões precisam abandonar, retomar ou construir juntas para chegar à paz?

José María Vigil – Devem deixar muitas coisas, algumas delas muito queridas e que sempre fizeram parte do seu patrimônio simbólico. Devem abandonar o complexo de superioridade que as fazia considerar que extra me nulla salus, que só elas eram "a religião verdadeira". Devem deixar as pretensões de "unicidade", tanto a respeito da sua natureza como da sua revelação. Devem retirar o "mapa teológico geocêntrico", que as punha no centro do mundo religioso, e devem aceitar um novo mapa teológico "heliocêntrico", com só Deus no centro, e elas, todas as religiões, girando sororalmente companheiras ao serviço da humanidade para aquilo que tem a ver com a relação com o Mistério Divino. Devem atualizar sua epistemologia: muitas estão ainda em uma epistemologia mítica, que interpreta como literalmente históricas as crenças tradicionais, sem aceitar a visão hermenêutica crítica ou suas consequências todas... e superar aquele "modelo de verdade" objetivista, metafísico, fixista, de verdades eternas "claras e distintas" (Aristóteles e Descartes), por um modelo mais concorde com o que a humanidade sabe e pensa hoje. E aí, reconstruir a "outra religião possível".

IHU On-Line – É uma meta factível?

José María Vigil – A curto prazo não, obviamente. As dificuldades são profundas. A mudança que está sendo exigida é epocal. O que está em jogo é uma verdadeira releitura, uma reelaboração, um novo nascimento. E estamos apenas abrindo a porta. Não só as religiões (instituições), mas também a teologia, e os teólogos e as teólogas.

"Se a teologia da libertação não chegar a ser teologia pluralista da libertação, não vai estar à altura da libertação necessária"
É por isso que o tema é urgente: não haverá paz entre as religiões, e no mundo, enquanto não tivermos uma visão pluralista. (No contexto inter-religioso, falamos de "visão" como sinônimo de fato de "teologia", palavra com a qual algumas religiões têm dificuldades; para nós, de nominibus non est quaestio.)

Nesse sentido, é uma tarefa a ser realizada por todos, e em toda parte, e por toda a teologia. Quer dizer: se a teologia da libertação não chegar a ser teologia pluralista da libertação, não vai estar à altura histórica atual da libertação hoje necessária. A libertação que não é pluralista e que não liberta os povos dos ancestrais preconceitos exclusivistas (existem regiões inteiras do mundo com religiosidade exclusivista) é uma libertação opressora. E a libertação que ainda fica presa do inclusivismo ainda está em conivência com visões que não liberam integralmente ao ser humano.

A tarefa não é só dos teólogos e das teólogas do pluralismo: toda a teologia tem que se confrontar com o paradigma pluralista, tem que se transformar em teologia pluralista e tem que fazer passar com que as pessoas que atende passem da velha visão inclusivista para a visão pluralista, a visão que permitirá o outro mundo possível.

IHU On-Line – Que limites e possibilidades podem ser encontrados em meio à pluralidade de visões a respeito da Divindade?

José María Vigil – Esse é um problema concreto; não é o grande problema ou o problema estruturalmente central. Tem teólogos que estão refletindo a superação do teísmo, tido até agora como indubitável no cristianismo. Sim, assim tem sido nossa tradição – teísta –, ao menos grosso modo. Mas, hoje, quando conhecemos melhor os limites do conceito de theos (fundamentalmente grego), conhecendo outras religiões não teístas e escutando suas críticas e seu testemunho, fica cada dia mais claro que não podemos fazer do teísmo um "modelo" insuperável, essencial, imprescindível...

Mas esse é um dos problemas concretos, ou setoriais, eu diria. A TdPR quer se confrontar sobretudo ou em primeiro termo com a problemática estrutural, de base, epistemológica.

IHU On-Line – Muito se tem falado a respeito de uma "aliança de civilizações", termo tão caro à ONU, defendido também por Bento XVI e às vezes utilizado como contraponto ao "choque de civilizações" de Samuel Huntington [1]. Qual a concepção da EATWOT a respeito desse conceito? Quais são seus fundamentos centrais?

José María Vigil – Nós não somos políticos, nem temos influência nesses âmbitos, mas estamos convencidos de que a teologia do pluralismo religioso tem muito a dizer ao mundo atual, às religiões e aos políticos, sobretudo neste momento de mundialização e de interculturalidade e inter-religiosidade conflitiva. Se as instituições mundiais e as forças sociais não contarem com a teologia, explicitamente com a TdPR, terão que fazer teologia leiga, ou civil, ou com outro nome, mas "não haverá paz no mundo sem teologia do pluralismo religioso", sem uma teologia pluralista mesmo, atrevo-me a dizer.

"A paz não é só a ausência de guerra. É o resumo de todos os bens salvíficos"
Cada dia vemos mais clara a pertinência dessa teologia. Assim como o mundo necessitava da TdL para lutar melhor pela justiça e defender os pobres, o mundo precisava e ainda precisa da teologia feminista, que está transformando aos poucos mas sem pausa o mundo patriarcal que herdamos. E temos que acrescentar: o mundo precisa, necessita da TdPR. Sem ela não serão removidos os preconceitos que arrastamos ancestralmente, que foram elaborados em um mundo totalmente diferente do mundo mundializado e plural em que hoje vivemos. Sem ela, vivida no interior de cada religião, não será possível que as religiões sejam parceiras sinceras em uma Aliança pelo Bem Comum da vida e da humanidade. A ONU deveria estar muito interessada na TdPR.

IHU On-Line – Por outro lado, muito se fala de paz hoje, muitas vezes apenas como a não existência de conflitos. Nesse sentido, como o senhor definiria essa "paz" possível por meio das religiões?

José María Vigil – É claro, sabemos todos que a paz não é só a ausência de guerra... A paz não é um conceito negativo, mas extremamente positivo. Poderíamos dizer que a paz seria o shalom (judeu), ou o shalam (árabe), que não são conceitos negativos. Pelo contrário, são conceitos de plenitude: a paz é o resumo de todos os bens salvíficos.

Isso também se reflete na teologia do pluralismo religioso, que teria como funções ou tarefas: uma primeira, negativa, de desconstrução, de desmonte dos obstáculos, dos preconceitos geradores de conflitos, dos axiomas superados que hoje viraram daninhos inclusive no mundo mundializado atual; e uma segunda tarefa, positiva, a de reconstrução, o encontro prazeroso das convergências religiosas, da muita riqueza comum, das inesgotáveis peculiaridades que cada religião tem como lampejos únicos da luz única e eterna do Mistério, a função mesma de "religação" por cima da imensa "hierodiversidade" ou "diversidade do sagrado".

IHU On-Line – Em sua opinião, quais são os pressupostos básicos para que seja possível estabelecer um verdadeiro e rico diálogo entre as religiões? Existem âmbitos acadêmicos, políticos, culturais ou sociais necessários para isso?

José María Vigil – As "palestras e falas" da oficina em Dakar, antecipadas no livreto que elaboramos e colocamos antecipadamente na internet, respondem a essa mesma pergunta: quais são os pressupostos básicos, os mínimos, os mais comuns, que poderíamos elaborar e consensualizar, a fim de que sirvam de base comum para o diálogo inter-religioso e para a colaboração entre as civilizações e entre as religiões?

"Se 'a caridade começa pela própria pessoa', hoje a caridade realista deveria começar pelo planeta"
Nessas palestras – textos muito breves –, os autores fazem as suas propostas. Mediante o livreto, a ASETT quer abrir a todo o mundo interessado a possibilidade de acompanhar e inclusive de participar nessa reflexão. A pessoa interessada, a comunidade que sintoniza, pode fazer essa reflexão por sua conta, talvez se ajudando com essas "palestras", expressadas em um estilo que visa precisamente a provocar um debate. E podem, se quiserem, partilhar a sua reflexão enviando-a para ser levada em conta na oficina de Dakar. Podem responder a essa mesma pergunta que você me faz. É a própria pergunta da oficina.

Mas, veja, não vamos nos perguntar pelos âmbitos acadêmicos, políticos, culturais ou sociais necessários para isso. É a temática costumeira nos diálogos e nas falas sobre diálogo inter-religioso. Mas nós, como dizíamos, queremos nos concentrar no aspeto propriamente teológico, só, que é o aspecto normalmente esquecido nas falas desses níveis dos fóruns internacionais. Somos teólogos e teólogas, e mesmo sabendo que a teologia não é tudo, somos conscientes de que ela é muito necessária, imprescindível até, e queremos levar essa fala a esse fórum. E estendemos a mão para que muitas das inumeráveis pessoas que não poderão viajar a Dakar nos acompanhem. A época das comunicações permite isso. Queremos tentar um jeito novo de realizar uma oficina em um fórum internacional, aberta para todos os que não podem viajar.

IHU On-Line – Em um período de crise ambiental em que "a natureza geme em dores de parto", como propõe a Campanha da Fraternidade 2011 no Brasil, como as religiões podem contribuir para a defesa e a proteção da Criação?

José María Vigil – No objetivo da oficina diz-se: "para o bem comum da humanidade e da Vida no planeta". Já não podemos ter só o objetivo da humanidade, como o antropocentrismo religioso nos educou. O bem comum da humanidade ficaria absolutamente curto e mal-entendido se deixasse de buscar o bem comum da vida no planeta (além dele é pretensioso dizer que podemos fazer alguma coisa, hoje ao menos).

Mas nesta última década (a consciência da emergência da ameaça climática não tem dez anos), a situação mudou tanto que as prioridades se deslocaram todas. Todos os serviços tradicionalmente feitos à humanidade ficaram curtos diante da urgência planetária. Se "a caridade começa pela própria pessoa", hoje a caridade realista deveria começar pelo planeta: todos os nossos objetivos estão ameaçados de morte, ante o que está vindo. Em rigor, estamos caminhando para a extinção da nossa espécie. Se não mudarmos – e já tem quem duvide que seja possível mudar a tempo – o sistema atual de vida (economia, produção, consumo, contaminação ambiental, destruição da ecologia...), estamos nos aproximando a cada dia do nosso fim. Não é exagero, é literalmente real, e mais provável do que o contrário.

"Como é possível que as religiões ainda não tenham pedido perdão por terem permanecido cegas ao ecológico?"
Nessa conjuntura, como é possível que as religiões ainda não tenham pedido perdão por terem permanecido cegas ao ecológico? Como não levantaram a sua voz profética contra os que se opõem egoistamente às medidas urgentes para o salvamento do planeta e da humanidade? E como ainda não convocaram um concílio verdadeiramente “ecumênico” (de todas as religiões que habitam a ecumene, a "casa habitada") para se unirem e se concentrarem na única prioridade verdadeiramente prioritária?

Sabe por que isso é ainda possível? Porque algumas religiões ainda têm visões espiritualistas, sobrenaturalistas, que pretendem salvar o mundo "das almas", fazendo prosélitos para si mesmas, esquecendo que a missão é outra. A TdPR também tem muito a ver com isso.

IHU On-Line – Um dos teólogos que vem propondo debate sobre as religiões e a paz é Hans Küng, a partir do seu Projeto de Ética Mundial, para quem "não há paz entre as nações sem paz entre as religiões" e "não há paz entre as religiões sem diálogo entre as religiões". Como o senhor analisa as contribuições de Hans Küng nesse sentido?

José María Vigil – Entendo que essa frase é de Gandhi, sendo Küng quem a tornou conhecida, sim. Mas acho que, a partir dessa perspectiva sobre a qual estamos falando, ela fica curta em todo caso. Deveria ser completada assim: "e não haverá diálogo entre as religiões, sem uma visão pluralista", ou seja sem TdPR. De fato, Küng coloca esse debate, como você bem diz, "a partir da ética mundial", de uma ética que acharíamos comum a toda a humanidade, a todas as religiões... mas não a partir de uma visão teológica comum (não digo de uma teologia única).

Com a ética mundial, Küng não entra no campo propriamente teológico, não entra na TdPR, e de fato penso que ele não entrou ainda em uma visão "pluralista" (estou dizendo isso como termo técnico, equivalente a "superadora do inclusivismo"). O professor confessa-se inclusivista, até onde eu conheço – gostaria de ser corrigido se estiver errado. Têm teólogos, como Paul Knitter [2], que dizem que Küng ainda não cruzou o Rubicão...

Bom, não quero dizer que o Projeto de Ética Mundial não seja muito bom, importantíssimo. Digo que ele não chega a entrar no nível teológico mesmo. E não tem por que fazê-lo. É um projeto no nível da ética. É legítimo. E é legítimo também tentar ir além da ética, entrando no nível propriamente teológico. Como teólogos, nós estamos nisso, mesmo admirando e agradecendo o Projeto de Ética Mundial. Tudo o que contribui para o diálogo e a convivência entre as religiões é bom, necessário e urgente mesmo.

Notas:
1. Samuel Phillips Huntington (1927): cientista político, conhecido pela análise do relacionamento entre os militares e o governo civil, além da tese de que os atores políticos centrais do século XXI serão as civilizações, ao invés dos estados-nação. Mais recentemente, recebeu grande atenção por sua análise sobre as ameaças colocadas aos Estados Unidos pela imigração atual. Leciona na Harvard University. Tornou-se um acadêmico famoso nos anos 1960 com a publicação de Political Order in Changing Societies, trabalho que mudou os pontos de vista convencionais das teorias modernizantes de que o progresso social e econômico traria democracias estáveis nas nações descolonizadas recentemente. (Nota do IHU On-Line)

2. Paul F. Knitter: professor da cátedra Paul Tillich de Teologia, Religiões do Mundo e Cultura no Union Theological Seminary, da cidade de Nova Iorque. É ex-professor emérito de Teologia da Xavier University, em Cincinnati, Ohio. Desde a publicação do seu aclamado livro No Other Name? A Critical Survey of Christian Attitudes toward World Religions (1985), Knitter ficou conhecido pelo seu pluralismo religioso. (Nota do IHU On-Line)

(Por Moisés Sbardelotto)

Extraído de http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=39485 acesso em 23 dez. 2010. 
Ilustração: Various religious symbols. 2007. Disponível em http://commons.wikimedia.org/wiki/File:ReligijneSymbole.svg acesso em 23 dez. 2010.

Para ler mais:

MENSAGEM PARA O ANO NOVO














MENSAGEM PARA O ANO NOVO

A vida é sempre nova porque o Senhor que renova todas as coisas não nos deixa parados é por isso que estamos a caminho da eternidade, isto é, do Reino dos Céus, onde a verdade e a justiça prevalecerão para sempre.

Caríssimos, estamos começando um novo ano, espero que a palavra “novo” tenha pleno significado em nossa trajetória existencial durante esse novo ano de 2011 a ser percorrido por todos nós que aqui estamos, naturalmente, desejosos de que aconteça somente o bem. O novo na vida diz respeito ao sentido que se dá à vida; quem a vive por viver, não sente o verdadeiro prazer que ela proporciona quando vivida por amor a Deus, Fonte Eterna de toda vida. Porque a nossa vida humana, vai em direção à Fonte Divina que a criou e a sustenta, como o rio que corre em direção ao mar. Sei que essa analogia natural é simples, porém, carregada de um profundo significa teológico, pois, existimos porque somos obras das mãos de Deus e é para Deus estamos indo a cada instante do nosso viver.

Normalmente, com a proximidade da mudança de ano, aumentamos as nossas expectativas sobre os acontecimentos que poderão ocorrer - e aqui, chamo a atenção para não acreditarmos nas falsas previsões que os charlatões, juntamente com a mídia, tentam nos fazer crer. E ainda, traçamos, quem sabe, novos projetos de vida, de trabalho ou outro anseio benéfico que desejamos; prometemos mudanças de atitudes e criamos também toda uma atmosfera de melhoria existencial, dado ao otimismo que nos acompanha por a felicidade ser um desejo inato que carregamos nas entranhas de nossas almas.

De fato, quem planta o bem, isso mesmo colherá; porém, como do mal praticado nenhum bem podemos colher, evitemos toda espécie de mal. É como nos ensinou São Paulo: “Não vos enganeis: de Deus não se zomba. O que o homem semeia, isso mesmo colherá. Quem semeia na carne, da carne colherá a corrupção; quem semeia no Espírito, do Espírito colherá a vida eterna. Não nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo colheremos, se não relaxarmos. Por isso, enquanto temos tempo, façamos o bem a todos os homens, mas particularmente aos irmãos na fé”. (Gal 6,710).

Então, façamos acontecer o novo em nossa vida nesse novo ano que se aproxima ou se já estivermos nele, isto é, pratiquemos o viver de Jesus com nosso viver, porque não existe o novo sem aquele que renova todas as coisas (Cf. Ap 21,5), exatamente como escreveu São João: “Aquele que diz que Nele (Jesus) crê, deve viver como Ele viveu” (1Jo 2,6); ou seja, fazendo em tudo a Vontade de Deus Pai, porque é para isto que estamos aqui neste mundo.

Feliz Ano Novo!

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

E Francisco inventa o Presépio para estar mais próximo de Jesus


I CELANO CAPÍTULO 30 - PREPARA UM PRESÉPIO NO DIA DE NATAL

84. Sua maior intenção, seu desejo principal e plano supremo era observar o Evangelho em tudo e por tudo, imitando com perfeição, atenção, esforço, dedicação e fervor os “passos de Nosso Senhor Jesus Cristo no seguimento de sua doutrina”. Estava sempre meditando em suas palavras e recordava seus atos com muita inteligência. Gostava tanto de lembrar a humildade de sua encarnação e o amor de sua paixão, que nem queria pensar em outras coisas.
Precisamos recordar com todo respeito e admiração o que fez no dia de Natal, no povoado de Greccio, três anos antes de sua gloriosa morte. Havia nesse lugar um homem chamado João, de boa fama e vida ainda melhor, a quem São Francisco tinha especial amizade porque, sendo muito nobre e honrado em sua terra, desprezava a nobreza humana para seguir a nobreza de espírito. Uns quinze dias antes do Natal, São Francisco mandou chamá-lo, como costumava, e disse: “Se você quiser que nós celebremos o Natal de Greccio, é bom começar a preparar diligentemente e desde já o que eu vou dizer. Quero lembrar o menino que nasceu em Belém, os apertos que passou, como foi posto num presépio, e ver com os próprios olhos como ficou em cima da palha, entre o boi e o burro”. Ouvindo isso, o homem bom e fiel correu imediatamente e preparou o que o santo tinha dito, no lugar indicado.

85. Aproximou-se o dia da alegria e chegou o tempo da exultação. De muitos lugares foram chamados os irmãos: homens e mulheres do lugar, de acordo com suas posses, prepararam cheios de alegria tochas e archotes para iluminar a noite que tinha iluminado todos os dias e anos com sua brilhante estrela. Por fim, chegou o santo e, vendo tudo preparado, ficou satisfeito. Fizeram um presépio, trouxeram palha, um boi e um burro. Greccio tornou-se uma nova Belém, honrando a simplicidade, louvando a pobreza e recomendando a humildade. A noite ficou iluminada como o dia e estava deliciosa para os homens e para os animais. O povo foi chegando e se alegrou com o mistério renovado em uma alegria toda nova. O bosque ressoava com as vozes que ecoavam nos morros. Os frades cantavam, dando os devidos louvores ao Senhor e a Noite inteira se rejubilava. O santo parou diante do presépio e suspirou, cheio de piedade e de alegria. A missa foi celebrada ali mesmo no presépio, e o sacerdote que a celebrou sentiu uma piedade que jamais experimentara até então.

86. O santo vestiu dalmática, porque era diácono, e cantou com voz sonora o santo Evangelho. De fato, era “uma voz forte, doce, clara e sonora”, convidando a todos às alegrias eternas. Depois pregou ao povo presente, dizendo coisas maravilhosas sobre o nascimento do Rei pobre e sobre a pequena cidade de Belém. Multas vezes, quando queria chamar o Cristo de Jesus, chamava-o também com muito amor de “menino de Belém”, e pronunciava a palavra “Belém” como o balido de uma ovelha, enchendo a boca com a voz e mais ainda com a doce afeição. Também estalava a língua quando falava “menino de Belém” ou “Jesus”, saboreando a doçura dessas palavras. Multiplicaram-se nesse lugar os favores do todo-poderoso, e um homem de virtude teve uma visão admirável. Pareceu-lhe ver deitado no presépio um bebê dormindo, que acordou quando o santo chegou perto. E essa visão veio muito a propósito, porque o menino Jesus estava de fato dormindo no esquecimento de muitos corações, nos quais, por sua graça e por intermédio de São Francisco, ele ressuscitou e deixou a marca de sua lembrança. Quando terminou a vigília solene, todos voltaram contentes para casa.

87. Guardaram a palha usada no presépio para que o Senhor curasse os animais, da mesma maneira que tinha multiplicado sua santa misericórdia. De fato, muitos animais que, padeciam das mais diversas doenças naquela região comeram daquela palha e tiveram um resultado feliz. Da mesma sorte, homens e mulheres conseguiram a cura das mais variadas doenças. O lugar do presépio foi consagrado a um templo do Senhor e no próprio lugar da manjedoura construíram um altar em honra de nosso pai Francisco e dedicaram uma igreja, para que, onde os animais já tinham comido o feno, passassem os homens a se alimentar, para salvação do corpo e da alma, com a carne do cordeiro imaculado e incontaminado, Jesus Cristo nosso Senhor, que se ofereceu por nós com todo o seu inefável amor e vive com o Pai e o Espírito Santo eternamente glorioso por todos os séculos dos séculos. Amém. Aleluia, Aleluia. 

A Vós todos meus irmãos em Cristo, um Santo Natal e um 2011 repleto das bençãos de Nosso Senhor Jesus Cristo, é o que desejamos todos nós da fraternidade Nossa Senhora Aparecida - Nilópolis/RJ e da Casa Perfeita Alegria.

O VERDADEIRO SENTIDO DO NATAL


















O VERDADEIRO SENTIDO DO NATAL

O Natal é uma festa linda e única mesmo que se repita por anos a fios; mesmo que o comercio em seu desvario, invente um monte de baboseiras, falsos personagens e lendas pagãs, tentando tirar a atenção do verdadeiro sentido do Natal do Senhor, para poder vender e lucrar mais; nem assim consegue desviar ou denegrir o verdadeiro sentido do Natal.

O Natal é o aniversário da entrada física de Deus neste mundo, pois, até então a humanidade só O conhecia pela fé nas profecias, dando-nos a esperança de que um dia viria até nós. O Natal do Senhor é esse grande dia do cumprimento de todas essas profecias a respeito do Filho do Homem, o Emmanuel, que significa Deus conosco.

Desde então, a cada Natal, a humanidade se rejubila e comemora com grandíssima alegria esse dia em que conheceu a Deus fisicamente; seu nascimento, sua história e o significado de sua vinda, que é a nossa libertação para a Sua Maior Glória. Pois, todo aquele que se sente unido ao menino Deus que nasceu em Belém, experimenta como ninguém a libertação dos pecados, a ressurreição dos mortos, a felicidade dos justos e a vida do mundo novo que há de vir.

Feliz Natal Jesus! Agora podemos dizer que conhecemos a Deus, porque o Senhor No-Lo deu a conhecer, nascendo como um de nós.

Um Santo e Feliz Natal para todos!

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

Celebrar o Natal nas ruas

fotos: Felipe Miranda/Pastoral da Comunicação PF
Fraternidade São Maximiliano Maria Kolbe com Frei José Carlos,OFMcap.

A cada ano o jeito de os franciscanos em Porto Feliz /SP de celebrar o Natal vem criando tradições inexistentes na cidade, primeiro foi a Folia de Reis que se tornou anual e a cada ano ganha adeptos, depois veio a ideia de fazer Ceia de Natal nas ruas, ano passado foi na rua Tristão Pires, no centro da cidade e esta ano ela aconteceu próximo dali, porém na praça Duque de Caxia, conhecida como largo da Penha, mas com uma novidade: a exposição de presépios nas casas.


No sábado e domingo, 18 e 19, os presépios ficaram expostos para a visitação popular nas casas, cada presépio foi apresentado sob o contexto de Pastorais Católica existentes na Paróquia Mãe dos Homens. Na segunda-feira foi a vez de acontecer a Ceia de Natal na praça, onde todos partilharam panetones, sorvetes, refrigerantes, salgados e muita conversa e fotos. No final cantaram músicas natalinas e uma mensagem e benção de Natal do Frei José Carlos Pedroso, OFMcap. acompanhado de um casal, eles vieram de Piracicaba.

Frei José Carlos, OFMcap. autografou livros, transmitiu a mensagem do Natal e deu a Benção de São Francisco, autografou livros e depois foi visitar uma exposição de presépios que a prefeitura da cidade, que também pela primeira vez promoveu na cidade, com presépios de duas colecionadoras de Itu. 

Na Ceia de Natal, mais de 70 pessoas participaram.

Os moradores cederam suas casas, onde salas, garagens, consultório, imobiliaria cederam espaços para a montagem dos presépios.

Campana sobre campana



Campana sobre campana,
y sobre campana una,
Asómate a la ventana,
verás al Niño en la cuna.

Refrão:
Belén, campanas de Belén,
que los ángeles tocan
¿qué nuevas me traéis?

Recogido tu rebaño
¿a dónde vas pastorcillo?
Voy a llevar al portal
requesón, manteca y vino.

Refrão:
Belén, campanas de Belén,
que los ángeles tocan
¿qué nuevas me traéis?

Campana sobre campana,
y sobre campana dos,
asómate a la ventana,
veras al niñito Dios.

Refrão:
Belén, campanas de Belén,
que los ángeles tocan
¿qué nuevas me traéis?

Recogido tu rebaño
¿a dónde vas pastorcillo?
Voy a llevar al portal
requesón, manteca y vino.

Refrão:
Belén, campanas de Belén,
que los ángeles tocan
¿qué nuevas me traéis?

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A PRESENÇA DE MARIA NO TEMPO APOSTÓLICO













A PRESENÇA DE MARIA NO TEMPO APOSTÓLICO

Ser mãe de Deus é a maior vocação e missão que uma criatura humana pôde receber de Deus; e coube a Maria, Mãe do Salvador da humanidade, esse privilégio único. Por isso, Maria é a primeira por excelência a participar de todos os mistérios da fé cristã diretamente, pois nela se fez Carne o Filho de Deus; depois que o Anjo do Senhor revelou a ela o Plano de Deus para a nossa salvação, e tendo o seu sim comprovado, o Espírito Santo fez nela morada permanente, gerando Jesus e permanecendo com ela, orientando-a em todos os sentidos para que acolhesse, numa entrega total, todos os propósitos divinos a respeito do Seu povo Eleito, de toda a humanidade e de toda a criação (Cf. Ef 1,3-14).

Desse modo, Maria, a Virgem sem pecado, profetizada por Isaías (Cf. Is 7,14), viveu em tudo a vontade de Deus por ser sempre conduzida pelo Espírito Santo e por isso mesmo, deu a maior de todas as contribuições que um ser humano pode dar a Deus para a realização de seu plano de amor na criação, cedeu seu vente, sua carne e sangue ao Redentor de nossas almas para que nos redimisse por seu Sacrifício de Cruz, porque Deus não quis salvar o homem sem a participação direta do homem e coube a Maria ser a genitora da Nova Humanidade, agora redimida, isto é, purificada de todo pecado.

Por isso, a Virgem Santíssima participou desde a primeira comunidade dos apóstolos de Jesus até a formação da Igreja primitiva, após a ressurreição do Senhor e sua partida para o céu; educadora que era das almas discípulas de Seu Filho amado, se fez presente com Ele em vários momentos de sua vida e da vida dos seus seguidores, lembro alguns desses momentos: o milagre da água transformada em vinho por sua interseção nas bodas de Canã da Galileia, onde, como escreveu São João, “seus discípulos creram nele” (Jo 2,1-12). Esteve presente também quando do início da vida pública de Jesus (Cf. Mc 3,31-35); acompanhou-o de igual modo no caminho do calvário e quando de sua morte de cruz, lá estava ela com o discípulo amado que a recebeu em sua casa como mãe, como recomendou o Salvador no patíbulo da cruz (Jo 19,26-27).

Já no cenáculo, ali estava como Mãe e Mestra da Igreja nascente, gerada soberanamente pelo Espírito Santo em Pentecostes, Ele que sempre a conduziu pelos desígnios do Pai Eterno e Todo Poderoso, fruto da promessa do seu Filho que havia dito: “E eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Paráclito, para que fique eternamente convosco. É o Espírito da Verdade, que o mundo não pode receber, porque não o vê nem o conhece, mas vós o conhecereis, porque permanecerá convosco e estará em vós.” (Jo 14,16-17). E ainda: “Entretanto, digo-vos a verdade: convém a vós que eu vá! Porque, se eu não for, o Paráclito não virá a vós; mas se eu for, vo-lo enviarei. Muitas coisas ainda tenho a dizer-vos, mas não as podeis suportar agora. Quando vier o Paráclito, o Espírito da Verdade, ensinar-vos-á toda a verdade, porque não falará por si mesmo, mas dirá o que ouvir, e anunciar-vos-á as coisas que virão. Ele me glorificará, porque receberá do que é meu, e vo-lo anunciará.” (Jo 16,7.12-140).

Por fim, vemos Maria presente no Apocalipse de São João como imagem perfeita da Igreja, Corpo Místico do Senhor da qual Ele é a Cabeça e nós somos os seus membros. Maria é, de fato, a nova Eva, a Mãe de Deus e da Nova Criação livre do pecado, da morte e do inferno; por ela, a cabeça da serpente é esmagada (Cf. Gn 3,15), pois, Cristo Jesus, Filho Unigênito do Pai que nasceu do seu ventre, vence o dragão, a antiga serpente também chamada de diabo e satanás. E assim, na plenitude dos tempos, o Coração Imaculado da Filha de Sião triunfa sobre as forças do mal, porque o que Deus prometeu se cumpriu integralmente: “Eis que conceberás e darás à luz um filho, e lhe porás o nome de Jesus. Ele será grande e chamar-se-á Filho do Altíssimo, e o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai Davi; e reinará eternamente na casa de Jacó, e o seu reino não terá fim.” (Lc 1,31-33).

“Ó abismo de riqueza, de sabedoria e de ciência em Deus! Quão impenetráveis são os seus juízos e inexploráveis os seus caminhos! Quem pode compreender o pensamento do Senhor? Quem jamais foi o seu conselheiro? ‘Por que quem conheceu o pensamento do Senhor, se abalançará a instruí-lo (Is 40,13)?’ Quem lhe deu primeiro, para que lhe seja retribuído? Dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele a glória por toda a eternidade! Amém”. (Rom 11,33-36; 1Cor 2,16a).

Paz e Bem!

Frei Fernando,OFMConv.


Zamba de la Navidad / J. Biagosch ; Coro Voces de la Vieja Metrópoli



Navidad, Navidad,
mañana será Navidad.
/Esta noche es la nochebuena,
mañana será la Navidad./ (bis)

Niño Dios, niño Dios,
niño Dios de los changuitos
/que como ellos muy pobrecitos
en un ranchito quiso nacer./ (bis)

Navidad por el salitral
que alegre llegó, que alegre se Irá,
/dejando a los pobres changos
mucha esperanza en el corazón./ (bis)

Abajo, sonando

las campanas de la iglesia
/y los changos mirando el cielo
esperan al niño que va a nacer./ (bis)

Llega ya, llega ya,
montado en una estrellita;
/llega ya el niñito bueno,
a los pobres changos a consolar./ (bis)

A Igreja costuma se distanciar de Jesus para que ele não incomode

Entrevista com Jon Sobrino

Santo e senha da Teologia da Libertação, o jesuíta salvadorenho de origem basca Jon Sobrino continua sendo uma referência mundial aos que, na Igreja, buscam um Deus encarnado que opta pelos seus preferidos, os pobres. De passagem por Bilbao, ele diz que, "em conjunto, a Igreja costuma se distanciar de Jesus para não incomodar". E também assegura que o "enoja e envergonha" a situação do mundo atual, porque "o primeiro mundo continua colocando o sentido da história na acumulação e no desfrute que a acumulação permite".


A reportagem é de Asteko Elkarrizketa, publicada no jornal Gara, 19-12-2010. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis a entrevista.

Contam-me – de brincadeira – que o senhor está cansado do mundo e também lhe ouvi dizer mais de uma vez que o senhor quer poder viver sem sentir vergonha do ser humano. Qual é a razão?

Às vezes, eu sinto vergonha. Por exemplo, interessamo-nos de verdade pelo Haiti? Obviamente, ele levantou interesse no começo e teve algumas respostas sérias. Mas passa um tempo e já não importa... Outro exemplo que contei outras vezes: em um jogo de futebol de equipes de elite jogando a Champions [League], calculei que, no campo, entre 22 jogadores, havia duas vezes o orçamento do Chade... Isso me enoja e me envergonha. Algo muito profundo tem que mudar neste mundo...

Para onde o neoliberalismo e a globalização nos levam?

É tal o desastre que, em boa parte, provocou que alguns respondam humanamente: voluntários, ONGs, muitas Igrejas – católicas ou protestantes –, outras religiões. Mas acredito que o chamado Primeiro Mundo – uma quarta parte da humanidade – continua pondo o sentido da história na acumulação e no desfrute que a acumulação permite. A diversão, por exemplo, é uma megaindústria multinacional: o esporte de elite, o turismo...
Ignacio Ellacuría chamou isso de "civilização do capital", que produz uma sociedade gravemente enferma, em transe fatídico e fatal. E costumava dizer que a solução é inverter a situação. Por isso, forjou a expressão de que precisamos de uma "civilização da pobreza". Ellacuría era cabeça-dura nisto: é preciso inverter a situação: o motor da história não pode ser acumular, mas sim solucionar as necessidades básicas de 6,5 bilhões de seres humanos, e o sentido da história é a solidariedade com espírito.

Em nossa sociedade, é comum que grandes companhias realizem "campanhas de solidariedade" muito midiáticas, com jantares beneficentes, apadrinhamentos, envio de ajudas etc. O conceito de solidariedade está sendo desvirtuado?

Entendo a pergunta, mas acredito que ocorrem as duas coisas. Por um lado, certo bem-estar e certa afluência de recursos fazem com que dar ajuda seja mais fácil e que, se não tivermos o coração de pedra – como dizia o profeta Ezequiel –, que ele se converta um pouco em coração de carne e ajude. Acredito que parte dessas solidariedades são autênticas.

Pois bem, essas solidariedades também costumam ser usadas para ocultar a ignominia da falta de uma solidariedade maior e mais fundamental, e não só isso, mas também a opressão das grandes potências aos países pequenos.

Talvez sirvam para mascarar as raízes dos problemas?

Podem ser usadas assim, embora, ironicamente, boa parte das ONGs existem precisamente para dizer a verdade – embora não façam muito caso disso –, não só para ajudar economicamente, mas também para defender os direitos humanos. Acho isso complexo, e é preciso analisar cada situação. É claro que o poder submete todo mundo, mas cada um deve empurrar o carro da história como puder. Certamente, o que nos oferecem como soluções me causa indignação e me dá tristeza.

Ao cidadão médio do mundo desenvolvido corresponde alguma responsabilidade da pobreza, da opressão ou das guerras que assolam o planeta?

Objetivamente, sim. Quem declara as grandes guerras? Os governos, movidos por oligarquias, mas eleitos pelos cidadãos. Quando os governos oferecem guerra diretamente, alguns os elegem e outros não. Mas eu não ouço que um governante ofereça que se viva pior, que se desça para que outros muitos possam subir um pouco. Nesse sentido, objetivamente somos corresponsáveis. O mundo se divide entre oprimidos e opressores. Não é preciso enrolar muito...

A Congregação para a Doutrina da Fé emitiu em 2006 uma "Notificatio" na qual afirma que o senhor falsifica a figura do Jesus histórico ao destacar muito a sua humanidade em detrimento da sua divindade. É o argumento da velha heresia...

O que eu digo é que, na realidade humana de Jesus de Nazaré, Deus se fez presente. Mas me dizem que não chego a dizer de verdade quem é Deus e que eu falo de Jesus de Nazaré muito concretamente e até que o converto em político, e isso, em geral, não costuma agradar às autoridades das cúrias romanas e também diocesanas. Ocorreu com vários teólogos. No meu caso, começou em 1976.

Na "Notificatio", disseram que dois livros meus continham afirmações errôneas e perigosas. Antes, eu os havia dado para que sete teólogos sérios os lessem, e nenhum me disse que havia algum problema de possibilidade de heresia... Penso que Jesus de Nazaré sempre incomoda. Deus incomoda menos, porque é tão intocável, tão impalpável... Penso que, na Igreja, temos uma tendência a nos distanciarmos de Jesus de Nazaré. Não quer dizer que não falemos de Cristo, mas Cristo é "o ungido", um adjetivo.

Creio que o mais perigoso é ignorar que Jesus não simplesmente morreu, mas que o executaram. E o mataram porque enfrentou o poder dos sumos sacerdotes e, indiretamente, o poder romano. Evidentemente, Jesus não fez só isso. Pregou coisas belíssimas e dificilíssimas: as bem-aventuranças, a misericórdia com as pessoas, a oração ao Pai. Dá gosto de ver Jesus, mas também é coisa séria, e, se alguém quer seguir o caminho de Jesus, vai lhe custar. Por isso, penso que, em conjunto, a Igreja também costuma se distanciar dele para que não incomode. Mas, graças a Deus, há pessoas e grupos aos quais Jesus lhes atrai. Vi isso no El Salvador, principalmente entre os pobres e aqueles que os defendem.

Depois da "Notificatio", o senhor enviou uma carta ao superior-geral jesuíta, Peter Hans Kolvenbach, na qual indicava que diversos teólogos não encontravam incompatibilidade com a doutrina da Igreja, que a campanha contra o senhor e a Teologia da Libertação vinha há 30 anos e que Ratzinger, em sua época de cardeal, já havia tirado de contexto reflexões e expressões suas. Deduzo que há um ataque premeditado contra o senhor...

Não chamaria de ataque, mas sim de predisposição contra mim e vários outros. O então cardeal Ratzinger [hoje Papa Bento XVI], em um artigo no ano 1984-85, me criticava em cinco pontos, mas também criticava Gustavo Gutiérrez, Ignacio Ellacuría e Hugo Assmann. Nós quatro estávamos nessa corrente que se chamava Teologia da Libertação. Ratzinger já era contra essa corrente. Se algum dia me encontrar com ele, espero que falemos como amigos...

Certamente, já não se ouve falar tanto da Teologia da Libertação. Mudou alguma coisa, por acaso?

A Teologia da Libertação nasceu há cerca de 50 anos, na América Latina, um continente de grande pobreza e de fé cristã. Algo irrompeu aí. Algo explodiu. O que irrompeu? A verdade dos pobres, que era realidade durante séculos. A Igreja os havia visto e lhes havia ajudado de várias formas, mas, quando algo é tão real e explode, isso lhe afeta, lhe sacode e lhe anima a fazer alguma coisa.

Assim começou a chamada Teologia da Libertação, que pretendia que os pobres tivessem vida, justiça e dignidade. Para as Igrejas cristãs, essa era a vontade central de Deus. E, nesse sentido, Deus também "explodiu". E, em seguida, houve duas reações. Uma, fora das Igrejas. O vice-presidente dos EUA, [Nelson] Rockefeller, estava viajando pela América Latina nos anos 1970 e disse, entre outras coisas: "Se aquilo que os bispos estão dizendo em Medellín [na Conferência Episcopal de 1968, onde a Teologia da Libertação ganhou corpo eclesial] se tornar realidade, nossos interesses correm perigo". Dentro da Igreja institucional também houve uma reação contrária por parte de alguns bispos e cardeais. Ou seja, a Teologia da Libertação nasceu, e, em seguida, chegaram os enfrentamentos. Tudo isso levou a algo único na história da América Latina. Quiseram freá-la de diversas formas. Uma foi matar. Assassinaram dezenas de sacerdotes, religiosos e religiosas, e quatro bispos. Outros dois se salvaram por erro. E o que é menos conhecido: milhares de leigos, a maioria pobres.

A Teologia da Libertação desencadeou um modo de viver baseado na compaixão, concretizado depois em formas de justiça, baseada no amor aos mais pobres. Isso hoje desceu ao nível eclesial e de bispos que defendem essa linha.

Dom Romero [arcebispo de San Salvador], semanas antes de ser morto em 1980, dizia que "um cristão que se solidariza com a parte opressora não é um verdadeiro cristão".

Evidentemente. Identificar-se con a parte opressora quer dizer fazer parte desse grupo de seres humanos que está oprimindo e tirando a vida de outros, lentamente, por meio da pobreza ou da repressão. Essa pessoa não é cristã. Em que ela se parece a Jesus se é todo o contrário? E além disso não é humana. Dom Romero tinha razão.

Recentemente, em um congresso de pensadores cristãos, o senhor disse – parafraseando o teólogo José María Díez Alegría – que "a Igreja traiu Jesus; essa Igreja não é a que Jesus quis". Para onde a hierarquia está levando a Igreja Católica?

Não parafraseei, mas citei Díez Alegría literalmente. Ele disse que, "em conjunto, a Igreja Católica traiu Jesus", e me parece uma reflexão importante. Obviamente, nem toda a Igreja. Eu acredito que ele está dizendo que Jesus de Nazaré incomoda, e por isso a Igreja o trai. José Antonio Pagola diz: o mais necessário hoje é "mobilizar-nos e somar forças urgentemente para centrar a Igreja com mais verdade e celeridade na pessoa de Jesus e em seu projeto do reino de Deus". Segundo a fé cristã, o reino de Deus é a vontade de Deus sobre este mundo, para que haja vida para todos, começando pelos pobres. E Pagola termina com estas palavras: "A Igreja Católica terá que fazer muitas coisas, mas nenhuma é mais decisiva do que essa conversão".

Eu gosto que se use a palavra conversão: é uma mudança radical. Não vejo nada mais importante do que voltar para esse Jesus, porque tendemos a nos separar dele. Nem sempre, nem todos, nem de todas as maneiras, mas...

Dito com toda simplicidade: quando alguém ouve cristãos, cristãs, sacerdotes, bispos e não bispos falando, como é raro quando se escuta que falem de Jesus de Nazaré, que contem o que ele disse e o que fez... Está se perdendo o que é de Jesus. Foi isso que eu quis dizer no congresso. Na América Latina, ele se fez muito presente em Dom Hélder Câmara, em Dom Pédro Casaldáliga, em muitos outros... Mas também existe a tentação de dizer-lhe, como o grande inquisidor do romance "Os Irmãos Karamazov": "Vá e não volte".

Inclusive de forma drástica... Lembro o slogan da extrema direita e do Exército na época da repressão e da guerra no El Salvador: "Seja patriota, mate um padre". Por que lhes perseguiam de forma tão cruel?

Não perseguiam só nós, sacerdotes ou grupos cristãos, mas principalmente todos os agricultores. Com a Conferência dos Bispos de Medellín de 1968 houve uma grande mudança, uma irrupção, e Jesus de Nazaré se fez presente. Ser cristão era seguir a vida desse Jesus, estar com as vítimas, com os pobres. E, para defendê-los, enfrentar os poderosos. A oligarquia não tolerava isso, e muito menos que viesse de pessoas reconhecidas da Igreja.

Os sacerdotes eram melhores ou piores, mas éramos um símbolo importante no país. Essa Igreja que queriam ter do seu lado foi embora. Então, assassinaram o primeiro sacerdote, Rutilio Grande, jesuíta, grande amigo, no dia 12 de março de 1977. Armou-se uma grande confusão, e Dom Romero tomou uma decisão muito importante: denunciou o fato, disse que não voltaria a estar presente em atos civis públicos até que o crime não fosse esclarecido. E no domingo do enterro ordenou que só houvesse uma missa única.

As pessoas de dinheiro, a oligarquia, foi se encorajando: "Matamos um padre e eles continuam...". Continuaram matando sacerdotes e distribuíam panfletos com aquela frase: "Seja patriota, mate um padre". Em junho, deram aos jesuítas um mês para sair do país ou matariam todos. Não fomos embora. Continuaram matando sacerdotes e freiras e principalmente agricultores.

Nesse contexto, chegou o massacre dos seis sacerdotes jesuítas e das duas mulheres, no dia 16 de novembro de 1989, na Universidade Centro-Americana - UCA. O senhor também era um dos objetivos dos militares, mas se salvou por encontrar-se na Tailândia participando de um congresso. Como o senhor recorda esses fatos?

Um amigo me telefonou de Londres, me perguntou se eu estava sentado e se eu tinha um lápis para escrever. E começou: "Mataram Ellacuría e...". Eu sentia como se arrancassem a pele aos pedaços, mas quando eu mais fiquei com raiva foi quando me disse que haviam matado a cozinheira e sua filha. Que matem Ellacuría, "merecido" – como Jesus de Nazaré. Mas matar uma cozinheira e sua filha de 15 anos...!

Lembro também que um tailandês convertido à religião católica me perguntou se no El Salvador havia católicos que matavam sacerdotes. Ele entendeu bem o horror que entranhava aquilo. No El Salvador, matar sacerdotes significava romper não apenas as regras do bem, mas sim as do mal. Tudo podia acontecer. E aconteceu...

O senhor temeu muitas vezes pela sua vida?

Sim e não. Várias vezes explodiram bombas na UCA e em nossa casa. Estávamos nas litas. Ellacuría em primeiro lugar e os demais também. Às vezes, nos jornais, também me destacavam. Mas pensar que podia acontecer o que aconteceu com Rutilio Grande, com o padre Alfonso Navarro, com Dom Romero não nos provocava temor. Costumavam nos perguntar por que não íamos embora do país, e respondíamos que nos daria vergonha ir embora, nos daria vergonha dizer que é preciso estar com as pessoas e depois ir embora. Eu, além disso, dava aula de cristologia e tinha que contar a vida de Jesus. Com que cara eu ia falar de Jesus se fosse embora? E não fomos, principalmente porque nos sentíamos parte de algo maior, todo um povo ao qual queríamos e que nos queria... Para mim, foi um dom ter ido ao El Salvador. Sou agradecido por toda a vida.

O senhor vive lá há mais de meio século. Mudaram muitas coisas no El Salvador, mas a pobreza continua. A situação até se agravou com a delinquência e a violência das gangues juvenis.

O El Salvador, assim como está acontecendo com o Haiti, desapareceu das notícias. Firmaram-se os tratados de paz, e algo importante aconteceu: dois exércitos concordaram em não continua lutando militarmente. E isso é muito bom. Além disso, nos acordos de paz, decidiu-se investigar as violações dos direitos humanos graves de ambas as partes. As Nações Unidas fizeram um estudo bastante sério sobre isso. Mas o que aconteceu? Antes de que saísse o relatório das Nações Unidas, o presidente Cristiani concedeu anistia aos que apareciam nele. Uma anistia assim não é um ato de reconciliação, de humanização. Serviu principalmente para que não tocasse na parte governamental. Ninguém foi ainda julgado pelo assassinato de Dom Romero – e o Vaticano também não o canonizou...

Pela pressão do tempo, os acordos também não trataram suficientemente da economia, e isso continua sendo notado. Não digo que com bons acordos sobre os modos de produção, a legislação trabalhista etc. se mudaria muita coisa. Não sou muito otimista, mas, ao não fazer nada, a injusta situação econômica continua sem aspectos de solução.

E ocorreram outras duas coisas negativas importantes: muitos salvadorenhos – de dois a três milhões – vão aos Estados Unidos para buscar trabalho, o que traz uma infinidade de problemas humanos, divisões de famílias etc. O outro problema é a violência das gangues, que geraram um tipo de vida em que os jovens encontram um sentido de identidade, estando dispostos a matar e a serem mortos. E é preciso incluir as máfias, o narcotráfico, os sequestros...

Às vezes me pergunto, tragicamente, por que, no El Salvador e em países semelhantes, não se decidiram por um suicídio coletivo. Para muitíssimas pessoas, isso não é viver. Mas, no povo, existe uma força maior para seguir em frente e enfrentar os problemas mais difíceis. Essa força se expressa no empenho para sobreviver, nas tentativas de organização. E é alimentava por muita gente boa, os mártires, com Dom Romero à frente. Aqui, acredito que isso é difícil de compreender.

Surpreende-me o pouco sotaque salvadorenho que o senhor tem. No El Salvador, continuam lhe conhecendo como basco?

É verdade, não mudei o sotaque. Enquanto a ser basco, acho que não perdi minhas origens. Mas também não é um absoluto. Também não é que eu me sinta salvadorenho, embora é o que eu mais me sinto. Acredito que o que me ocorreu no El Salvador é uma maior abertura a tudo o que é humano, para além dos lugares.

O senhor pensa em voltar para Euskal Herria para ficar?

O normal é que eu não volte para ficar. Se eu voltar, terei que pensar o que fazer para poder ajudar aqui [na Europa]. Eu gostaria muito de cooperar, fazer o bem, mas não tenho nenhuma receita. A mudança seria muito grande. No El Salvador, estão os pobres que não dão a vida por óbvia e têm quase todos os poderes do mundo jogando contra. Aqui, na Europa, a vida se dá por óbvia e com muito poder a seu favor. Se me permite dizer isso metafisicamente: os pobres são "os que não são reais". Aqui pensamos que o real somos nós. Estar no El Salvador significa cooperar para que todos vivamos e a utopia de fazer isso como irmãos e irmãs. Aqui, eu teria que repensar, embora veja pessoas e coisas boas às quais poderia me dedicar.

Disponível em http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=39462 acesso em 21 dez. 2010.

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