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sábado, 5 de setembro de 2009

Frei Antônio de Lisboa, o Santo Franciscano

Frei Adilson Corrêa da Silva, ofm
Santo Antônio de Lisboa, de Pádua, do mundo.... O simples fato de ouvir este nome nos remete a uma figura ímpar do catolicismo. Sua presença é marcante na Igreja, sendo reconhecido e admirado por todos os grupos de fiéis. Sua popularidade, muito fecunda, fez dele um grande ‘Taumaturgo’, sendo, entre os teólogos, reconhecido como doutor no domínio da ciência divina. De origem medieval, vem nestes últimos oito séculos arrastando multidões ao seguimento de Jesus Cristo.

Antônio viveu trinta e seis anos, teve uma breve existência. Nasceu em Lisboa por volta do ano de 1195, sendo batizado com o nome de Fernando de Bulhões. Seus pais, Dom Martim de Bulhões e Dona Teresa Taveira, ambos de origem nobre e, portanto, pessoas de posses. Nascido e criado em ‘berço de ouro ’ adquiriu uma sólida formação acadêmica.

Com apenas 15 anos de idade entrou no Mosteiro de São Vicente de Fora dos Cônegos de Santo Agostinho, em sua terra natal. Seu ingresso na Vida Religiosa foi uma tentativa de corresponder ao chamado de Deus. Mas ali não viveu muito tempo. Depois de dois anos solicitou ao seu superior sua transferência para o Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra; pois em São Vicente, não encontrou a paz desejada.

Naquele tempo, o Mosteiro vivia em terríveis conflitos políticos e eclesiásticos. Além do mais, era sempre visitado por parentes e amigos, o que lhe tomava um precioso tempo. Depois da aprovação necessária, o Cônego Fernando foi residir em Coimbra, onde encontrou, por algum tempo, a tranqüilidade necessária e desejada para bem se preparar para o sacerdócio, que se concretizou por volta do ano de 1219. Este ambiente, em Coimbra, muito favoreceu a sua formação intelectual pelo fato de ali haver muitas obras literárias e bons mestres formados nas principais faculdades.
Neste momento da história, a Vida Religiosa estava se reestruturando e a formação clerical ainda se encontrava precariamente organizada. Basicamente, a expressão da Vida Consagrada feminina e masculina situava-se nos Mosteiros, onde a organização interna era uma repetição do modelo social: pobres e ricos, servos e senhores, alto clero e baixo clero, letrados e iletrados. Estamos, portanto, em plena Idade Média, período marcante da história: guerras, conquistas, cruzadas, surgimento das faculdades, da moeda da burguesia, primazia da igreja, teocentrismo, declínio do feudalismo, divisão de classes.

Em tal contexto, aparece numa pequena cidade, chamada Assis, situada na região da Úmbria, Itália, o grupo dos Irmãos Menores. A inspiração primeira deste grupo vem de Francisco de Bernadoni (1182-1226), um jovem de origem burguesa, que, deixando toda a herança paterna, se consagrando, foi morar fora dos muros de Assis, constituindo uma das primeiras expressões das Ordens Mendicantes da história, ou seja, uma ‘nova maneira’ de viver a Vida Religiosa, plenamente inserida na realidade do mundo, em pequenas comunidades, nos lugares onde ninguém quer estar, nem mesmo a Igreja. Sua base está numa vida de oração, no serviço, na itinerância e na fraternidade.

Com Francisco de Assis, surge o Movimento de Assis, que é constituído pela Ordem dos Frades Menores, das Damas Pobres (Clarissas) e pelo grupo dos Irmãos e Irmãs da Penitência, hoje conhecidos como Ordem Franciscana Secular. A Regra comum daqueles que queriam fazer parte deste novo movimento é a radicalidade Evangélica. Em pouco tempo, esta nova Ordem cresceu numerosamente e se espalhou por toda Europa. Muitos se sentiam atraídos por esta maneira ‘simples’ de viver o Evangelho. E a condição primeira para fazer parte deste Movimento era doar todos os bens aos pobres, ou seja, era tornar-se pobre, para, como tal, seguir o Cristo pobre, humilde e crucificado. Assim, esta Ordem foi atraindo homens e mulheres de todas as classes sociais, de diversas culturas e nacionalidades.

Certa vez, um grupo de Frades Menores partiu em missão para o oriente, para terras d’além-mar; partiu com o ideal de anunciar a paz em tempos de guerra. Hospedou-se no mosteiro de Santa Cruz, antes de prosseguir. Os frades nem podiam imaginar que logo estariam retornando com a palma do martírio, uma vez que seus corpos foram transladados do oriente para serem sepultados.

Diante de tamanha entrega, o Cônego Fernando sentiu-se profundamente tocado e questionado sobre sua vocação. Após um período de discernimento, ele refez sua opção decidindo entrar para o grupo dos Frades Menores, com firme desejo de ir para a Missão, como aqueles que, sem medo, ofereceram suas vidas para a construção de um Novo Reino. Fernando foi acolhido entre os Frades recebendo o hábito marrom e nome de Frei Antônio. No entanto, o sonho de ser missionário não se concretizou, pois Deus havia reservado a ele uma grande missão na própria Europa. Agora como pertencente ao grupo de Francisco, Antônio assumiu com todo empenho a forma de vida deste grupo. Por alguns anos viveu de maneira quase anônima, realizando trabalhos domésticos e pouco expressivos, a despeito de seu preparo e de sua formação. Até que, depois de realizar uma pregação diante do bispo, numa solene celebração Eucarística, se revelou um exímio pregador. Em face disso, Frei Antônio iniciou uma caminhada de inúmeras pregações.

Enquanto Frade Menor, Frei Antônio encontrou-se raras vezes com São Francisco. Segundo os historiadores apenas uma ou duas vezes. No entanto, comungavam profundamente da mesma vocação. Por exemplo, em suas pregações ambos respeitavam a doutrinação, enfatizavam as orações dirigidas a Cristo com louvores, súplicas e ação de graças. O que é peculiar em Antônio, neste aspecto, é a profundidade teológica, sua fundamentação, pois, em toda sua caminhada como frade franciscano, elaborou toda uma obra em torno da pregação, utilizando-se dos tempos litúrgicos da Igreja para elaborá-la. Sendo Antônio um homem urbano sempre pregou na perspectiva de enfatizar a prática dos mandamentos: a caridade, a virtude, a mansidão e a moderação em oposição à avareza, aos vícios, à ira e à gula. Ao contrário de Francisco, Antônio não fazia muita alusão à pobreza.

Se o Movimento de Assis se caracterizava pela penitência, pela conversão, a proposta antoniana de conversão se fundava mais na prática da observância dos mandamentos e na catequese da Igreja, bem como na prática das virtudes. Sua pregação foi fruto de uma vida pautada pela conversão diária, ou seja, a conversão como mudança de direção. Antônio interpelava, com sua vida e pregação, a todos a mudarem de vida e caminharem no caminho do Senhor que somente fez o bem. Portanto, a pedagogia deste grande Santo se reflete na maneira fundamentada e cortês com que dirige sua pregação, isto como um reflexo de sua profunda intimidade com Deus e com os irmãos. Com coragem, nunca se silenciou diante das injustiças, pois praticar a injustiça significa ir contra o projeto de Deus, que nos foi apresentado por Jesus Cristo. Eis o grande desafio percebido por Antônio, assimilar os valores apresentados pelo Evangelho no cotidiano da vida.

Hoje, também nós devemos nos sentir impelidos pelo Evangelho como Santo Antônio e com veemência procurar a transformação pessoal, pois tendo uma vida mais próxima de Deus e de seus mandamentos estaremos mais próximos uns dos outros. Esta proximidade do outro nos torna capazes de lutar por um mundo mais justo, mais humano e profundamente comprometido com a paz.
Frei Adilson Corrêa da Silva é Licenciado em Filosofia.
Extraído de http://www.franciscanossantacruz.org.br/informaximo/artigos/artigo.asp?id=7 acesso em 01 set. 2009.
Ilustração: Santo António pregando aos peixes / foto de Acscosta. 2007. Extraído de http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Santo_Antonio_01b.jpg acesso em 01 set. 2009.

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