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quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Franciscano Secular qual o teu lugar no mundo de hoje?

Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-o
Frei Almir Ribeiro Guimarães,OFM (*)
1. De 20 a 23 de agosto deste ano de 2009 em que comemoramos os 800 anos do carisma franciscano, os franciscanos seculares se reúnem em Manaus para a realização da XXXII Assembléia Nacional ou Capítulo Eletivo da OFS no Brasil. Todos nos sentimos unidos aos irmãos e irmãs da OFS que, com a presença de delegados do Conselho Internacional, escolherão seus dirigentes para um novo período de governo e determinarão algumas prioridades de ação.

2. Nos, franciscanos da Ordem I, nos sentimos profundamente vinculados a esses irmãos e irmãs que, de norte a sul, se constituem em Fraternidades desejosas de buscar a santidade. Os irmãos e irmãs terceiros fazem parte da Família Franciscana. A Regra da OFS, assim descreve, de maneira lapidar, o espírito que anima o grupo: “No seio da dita família (Família Franciscana) ocupa posição específica a Ordem Franciscana Secular que se configura como uma união orgânica de todas as fraternidades católicas espalhadas pelo mundo e abertas a todos os grupos e fiéis. Nelas, os irmãos e as irmãs, impulsionados pelo Espírito a atingir a perfeição da caridade no próprio estado secular, são empenhados pela profissão a viver o Evangelho à maneira de São Francisco e mediante esta Regra confirmada pela Igreja” (n.2).

3. Estes irmãos, reunidos em Manaus, escolherão seu novo governo e terão como pano de fundo a pergunta-tema: “Franciscano secular, qual o teu lugar no mundo de hoje?” O lema, por sua vez, é um convite a rejeitar os esquemas desse mundo que Francisco deixou depois de beijar o leproso: mundo do ego, da mentira, do consumismo, da idolatria do poder, do pecado: “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-o”. E ainda mais um sub-tema que tem todo sentido quando um Capítulo se realiza às margens do Amazonas: “Água, fonte de vida e de paz!”.

4. A OFS reúne leigos e leigas. Trata-se de um movimento secular. Todos os documentos, conferências e temas de Capítulos em todos os níveis, livros de formação insistem na secularidade da espiritualidade franciscana dos terceiros. Fala-se que esta é a hora dos leigos. Os franciscanos seculares não são um movimento de piedosos e piedosas, mas se constitui de pessoas que querem vivenciar sua fé cristã no mundo. Fazem mesmo uma promessa-compromisso de viverem o espírito do evangelho à maneira franciscana por todos os dias de sua vida. O lugar dos franciscanos seculares é o mundo, o grande mundo, o mundo das imensas transformações sociais, religiosas e culturais.

5. Nem sempre os leigos conseguem atingir uma maturidade humana e cristã em sua qualidade de leigos cristãos. As instâncias formativas cuidam que os leigos não sejam clérigos e religiosos disfarçados, mas leigos verdadeiramente leigos. Um leigo maduro é aquele que assume seu papel transformador na família, na sociedade e na Igreja. Desafio grande é este de fazer com que os terceiros cheguem a uma maturidade de cristãos leigos. Uma conferência em Capítulo não basta. Urgente que todas as Fraternidades conheçam os grandes documentos da Igreja, de modo especial, o Texto de Aparecida. Os Assistentes espirituais haverão de se encarregar de chamar atenção para o lugar secular dos franciscanos. Insistimos: família, trabalho, política, preservação e cuidado pelo criado. Não se deveria negligenciar o estudo e a prática do método do ver, julgar e agir.

6. Os franciscanos seculares são discípulos do seráfico e místico Francisco. Desta forma levam intensa vida de oração. Não podem viver longe das grutas, do silêncio, do retiro. Sentem saudades do Senhor. Essa intimidade com o Senhor não pode faltar em suas vidas. Mas, ao mesmo tempo, vão pelo mundo. O ir pelo mundo faz parte de suas vidas. Não podem deixar de dizer que o Amor precisa ser amado. Não se empenham apenas nas tarefas internas da Igreja, mas querem transformar a realidade, como sal da terra, luz do mundo e fermento na massa. Essas imagens do Novo Testamento estão sempre de novo presentes no dia a dia do franciscano secular.

7. A Ordem Franciscana Secular, como todos os grupos no seio da Igreja, conhece os desafios da modernidade ou pós-modernidade. Por isso, as instâncias de governo da OFS insistem na qualidade da formação. Caberá, de modo particular, aos Assistentes mostrar como viver o Evangelho franciscano numa sociedade de consumo, sociedade do provisório e cultuadora do prazer. Vivemos em Fraternidades e assim matamos pela raiz o individualismo.

8. Num contexto diferente, ou seja, em documento para os OFM, o Ministro Geral José Rodriguez Carballo escrevia: “A tentação do individualismo esteve presente em todos os tempos, mas parece que em nosso tempo a tendência a tendência ao isolamento e ao egoísmo nas relações tenha se manifestado com renovado vigor, também na vida franciscana. Por vezes, tenho a impressão de que não temos tempo para pensar nos outros, porque nossos problemas nos ocupam demais ou que em nós reine a lei do “salve-se quem puder”. Constatei muitas vezes que nos falta o tempo para estar com os outros; para rezar, comer, fazer recreio juntos. Com tristeza vejo que o individualismo de muitos Frades está destruindo, como maligno câncer, sua identidade franciscana (...). Diante da cultura do subjetivismo que nos arrasta para o individualismo, a passar sem o outro, devemos optar pela cultura da fraternidade, que leva à consciência de que o próprio “eu” não pode existir sem o “tu” e de que nossa realização como consagrados e como Frades menores passa pela vida fraterna. Devemos continuar a crescer no sentido de pertença recíproca: os outros me pertencem e eu pertenço a eles. E esse é um aspecto de nossa vida que devemos ter muito presente na formação inicial e permanente” (Texto do Ministro Geral para o Cap.Geral Extr. De 2006). Insisto. O texto se dirige aos frades menores. Vale muito bem também para os terceiros. Viver em Fraternidade é antídoto do individualismo.

9. Nos últimos tempos há um empenho na linha da busca da identidade franciscana. Quem somos nós? A quem pertencemos? O que faz com que sejamos franciscanos e, no caso, franciscanos seculares? Muitos franciscanos seculares correm o risco de perder sua identidade, vagando de fonte em fonte, buscando emoções religiosas aqui e ali, sem o cuidado de alimentar a planta da vocação. Ou será que não têm vocação?

10. Temos observado, nos últimos tempos, uma tomada de consciência de que se faz necessário renovar as Fraternidades. Não se trata apenas de aumentar o número dos irmãos e irmãs. Antes de tudo é questão de revigorar os que estão. Para tanto, os franciscanos seculares se empenharão em viver passo a passo as determinações de sua Regra, tão bela, tão atual, tão pouco conhecida.

11. A renovação passa pelo fervor readquirido: oração pessoal e comunitária, retiros, revisões de vida, busca sincera do sacramento da reconciliação. Os franciscanos não podem ser superficiais, medíocres, “festivos” O estudo meditado dos escritos de Francisco e da leitura espiritual são de importância capital para o futuro da Ordem. Não se cria amanhã para a OFS na superficialidade e no jogo das aparências. Não são o eventos grandiloqüentes que fazem a espiritualidade avançar mas o compromisso pessoal, amoroso com o Senhor e os irmãos. Se nossas reuniões e nossas atividades não se renovarem não será possível levar adiante a alegria desse carisma de 800 anos...

12. Ao lado da animação interna se faz urgente a promoção vocacional: encontros vocacionais, trabalhos em comum com a a Família Franciscana, mas cuidado, não apenas agitação, barulho. O mistério da vocação requer respeito e honestidade na hora da proposta. Nunca esquecer que a melhor propaganda vocacional é o bom exemplo e o testemunho dos franciscanos.

13. Uma das belezas e nobrezas da vida franciscana, também secular, é a dimensão da Fraternidade. Os franciscanos seculares se estimam e se amam. Tornam visível a fraternidade na reunião geral e na vida de bem querer ad intra e ad extra. A Regra de 1978, belo texto programático aprovado por Paulo VI, entre outros destaques insiste no fraternismo. As reuniões mensais, os encontros e o carinho que os irmãos manifestam aos irmãos são alguns lugares da vivência da fraternidade. Precisamos reuniões mensais fraternas de verdade, fraternidades que se entreajudam, que batalhem para serem dignas do “vede como eles se amam”. As reuniões não podem se apressadas, sem conteúdo, sem presença de vida a vida, realizadas em lugares inóspitos, feios e tristes.

14. “Para fomentar a comunhão entre os membros, o Conselho organize reuniões periódicas e encontros freqüentes, inclusive com outros grupos franciscanos, especialmente de jovens, adotando os meios mais apropriados para um crescimento da vida franciscana e eclesial, estimulando cada um à vida de fraternidade” (Regra n.25).

15. Os franciscanos seculares não se conformam com o mundo. São irmãos e irmãs da penitência, da transformação da vida. Por isso, levam a serio o caminho da conversão. A Regra contem elementos para tal transformação que precisam ser evidenciados.

16. O lugar do franciscano é o mundo todo. Há terceiros nas cátedras das universidades, nas escolas de filosofia, no ateliê de costureiras, nos partidos políticos. Tudo é bom para aquele que ama a Deus seraficamente como Francisco. Duas características acompanharão a ação no mundo: humildade-minoridade e espírito de fraternidade. Estas posturas tornam bela a vida franciscana secular.

17. Permitam-me, neste contexto, transcrever outra palavra do Ministro Carballo, em outro documento: “ O modelo da minoridade é Cristo, que não se apegou à sua igualdade com Deus, mas esvaziou-se a si mesmo, assumindo a condição de escravo...” (Fl 2,6-11). Essa identidade de menores em relação a cada criatura nos coloca diante de uma permanente exigência moral que raízes muito antigas “devem os irmãos reverenciar-se espiritual e diligentemente e honrar-se mutuamente sem murmuração” (RNB 7,15). E Francisco não tem em insistir: “ E sejam modestos, mostrando toda mansidão para com todos os homens; não julguem, não condenem; e como diz o Senhor, não considerem os mínimos pecados dos outros, meditem muito mais sobre os próprios na amargura de sua alma” (RNB 11,9-12). Nossa tradição é firme e abundante em proteger a dignidade do outro a partir de uma minoridade pessoalmente assumida, como caminho de salvação comunitária” ( O Senhor nos fala na caminhada, n.29)

CONCLUINDO

Sonhamos de olhos abertos
  • com Fraternidades seculares de pessoas que se sentem fascinadas pelo Cristo de Francisco, Cristo da simplicidade, do presépio, das chagas e da cruz.
  • com terceiros unidos em suas Fraternidades, bons, amigos, corajosos, efetivamente irmãos dos homens, pontuais, serviçais, prestativos, doces e firmes.
  • com familias franciscanas nas quais se vive um carinho mútuo na simplicidade do comer e do vestir, no trato afável e na capacidade de tornar nossas casas e nossos corações hospedaria dos leprosos de nossos tempos.
  • com irmãs e irmãos franciscanos capazes de associar belamente uma vida de ação no mundo com intensa contemplação.
  • com Fraternidades que seja espaços de crescimento na santidade e lugares onde as pessoas se formam para irem pelo mundo dizendo que o amor precisa ser amado.
  • com pessoas simples, sem vida dupla, sem máscaras, pessoas humildes que cativem os indiferentes, consumistas e perdidos nesses albores do século XXI.
  • com Fraternidades que restaurem a Igreja com seu testemunho de fraternismo e minorismo.
(*) Frei Almir Ribeiro Guimarães, OFM Assistente Nacional da OFS pela OFM e Assistente Regional do Sudeste III
Extraído de http://www.franciscanos.org.br/v3/almir/artigos/ofs/08.php acesso em 19 ago. 2009.
Imagem: Logomarca do XXXII Capítulo Eletivo Nacional da Ordem Franciscana Secular. Manaus (AM), 20 a 23 ago. 2009.

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