Como povo de Deus, que vive no mundo, exposto à tentação do poder, normal no ser humano, a Igreja sempre precisa ser evangelizada para poder anunciar o Evangelho de maneira fidedigna. Precisa sempre Aquele que anunciou o que é importante. Lucas, em primeiro lugar, mas também os outros Evangelistas mostram Jesus como um homem que não tinha onde reclinar a cabeça, e que viveu uma solidariedade conseqüente com os pobres. Quem quiser seguí-LO tem que deixar para trás todo pensamento de posse e domínio e procurar com Ele a irmandade com os pobres (cf Mc 10). Pois os pobres, os aflitos, os fracos, os perseguidos e os explorados devem saber e experimentar que “deles é o Reino de Deus”, a consolação, a vida, a justiça, a terra, todo o mundo (cf Mt 5).
Se os responsáveis no Vaticano tivessem considerado isto realmente, teriam evitado as irritações e os protestos que aconteceram em todo o mundo, durante as semanas passadas, acerca da atitude da Fraternidade São Pio X. Em todos os comunicados publicados em revistas, páginas Web e entrevistas, esta fraternidade explica sempre que não aceita as declarações essenciais do Concílio. A declaração sobre a possibilidade de salvação nas religiões não cristãs, a declaração acerca da liberdade religiosa, a admoestação ao diálogo, a declaração sobre as relações com os judeus são qualificadas por altos representantes da Fraternidade São Pio X como um caos teológico. Qual é a imagem de Deus, qual a percepção da missão da Igreja que isto revela? Um Deus amante do ser humano e misericordioso, que quer a salvação de todos, com uma opção preferencial pelos pobres, e que não oferece de maneira alguma uma oportunidade privilegiada aos cristãos dos países ricos do Norte, aparentemente constitui um problema para eles. E a missão no sentido da compreensão de Reino de Deus como o reino da paz, da justiça e do amor para todos, como o compreendeu Jesus de Nazaré, parece ser para eles uma traição ao privilégio da salvação da Igreja.
Quem ama a Igreja deve preocupar-se com tais ânsias pre-conciliares. A sua credibilidade está em causa. O que hoje está realmente em falta é a redescoberta da visão do Concílio Vaticano II. Este definiu a Igreja como uma comunidade de muitas igrejas locais, com suas características culturais próprias e que caminham juntas, em comunhão. A Igreja como o povo de Deus peregrino a cuja totalidade, Deus ofereceu uma aliança, na qual desperta os muitos carismas e serviços necessários à libertação do povo da servidão de culpa e perdição. Quer dizer, uma Igreja na qual todos somos co-responsáveis pelo serviço da salvação da humanidade, uma Igreja que não quer ser servida, mas servir. Uma Igreja que pode ser magnânima, misericordiosa, livre e generosa porque acredita e confia que o Espírito de Deus está atuando.
Esta seria a Igreja fraternal fundada por Jesus de Nazaré e com a qual Francisco sonhava. Nossa missão é testemunhá-la através da vivência de novas relações de irmandade e igualdade. Só resta o desejo que isto não continue sendo apenas sonho. As pessoas precisam de tal testemunho – hoje mais do que nunca.
Andreas Müller OFM
Extraído de CCFMC-Boletín, fev. 2009. Diaponível em http://www.ccfmc.net/wPortugues/cbcmf/cbcmf-news/2009/2009_02_News.shtml acesso em 1º mar. 2009.
Foto: Papa Paulo VI depositando a tiara papal ao final do Concílio Vaticano II.
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